Não é de todo correto os prefeitos Marco Alba e Miki Breier usarem a expressão “totalmente recuperados” ao informar aos moradores de Gravataí e Cachoeirinha sobre as cada vez mais mortais estatísticas do novo coronavírus. Sequelas em infectados já são uma certeza para especialistas e, nesta sexta, o G1 divulgou aquela que pode ser uma das piores notícias da pandemia: uma brasileira pode ter sido reinfectada.
Dados da manhã deste sábado mostram que, em Gravataí, dos 1.747 casos, 938 (53.69%) estão recuperados. Já foram perdidas 72 vidas – 12 somente nos primeiros 7 dias de agosto. Em Cachoerinha, são 1.470 casos, com 1.025 (69,73%) recuperados e 29 óbitos – 10 na primeira semana deste mês.
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), são considerados recuperados aqueles que tiveram dois resultados negativos para Sars-CoV-2 com pelo menos um dia de intervalo. No Brasil, e em Gravataí e Cachoeirinha também, o grupo inclui pessoas hospitalizadas que receberam alta e também os casos leves em que não houve internação ou óbito nos últimos 14 dias.
O alerta das sequelas foi feito ainda em abril, em estudo publicado no Journal of the American Medical Association. Como reporta o HuffPost, “um relatório com 217 pacientes hospitalizados em Wuhan, na China, origem da pandemia, encontrou manifestações neurológicas em quase metade dos pacientes com infecção grave (40 de 88), incluindo complicações cerebrovasculares, como AVCs (acidente vascular cerebral), encefalopatias e lesões musculares.
De acordo com pesquisa publicada na revista especializada Neurology, fenômeno semelhante foi observado na Espanha, um dos países europeus mais atingidos pela covid-19. De 841 pacientes internados em dois hospitais na cidade de Albacete, 57,4% desenvolveram um ou vários sintomas neurológicos.
No Brasil, um levantamento feito pela Unicamp com 504 pacientes mostra que “aproximadamente 70% persistem com queixas mesmo após terem se ‘curado’ da infecção por COVID”, de acordo com a neurologista Clarissa Lin Yasuda, responsável pelo estudo. Desse grupo, 90% teve quadro leve e não chegou a ser internado”.
À reportagem, o presidente do Conselho Diretor do Instituto de Medicina Física e Reabilitação Lucy Montoro, a fisiatra Linamara Battistella, que tem trabalhado diretamente com pacientes na reabilitação pós-covid, estima que entre 50% e 60% tenham sintomas como “confusão mental, perda da concentração, da memória, e depressão”.
De acordo com ela, que alerta para os riscos de uma “síndrome pós-covid”, como ocorreu com a SARS, em 2003, e a MERS, em 2012, ambas causadas pelo SARS-Cov-1, esses tipos de distúrbios têm sido transitórios até o momento, apesar de frequentes.
Um quadro mais grave do pós-covid é aquele que desenvolve um tipo de fadiga que impede a pessoa de realizar as tarefas que antes eram parte da rotina. Ainda há dúvidas sobre o que causa esse quadro, semelhante ao da chamada síndrome da fadiga crônica, mas esse é o perfil de paciente que tem sido atendido pelos serviços de reabilitação”.
Reputo que a informação mais assustadora vem de Ribeirão Preto, onde técnica de enfermagem Gabriela Carla da Silva, de 24 anos, voltou a testar positivo para a doença 50 dias depois de primeira confirmação.
Conforme o G1, “com o segundo diagnóstico em 50 dias, entre maio e julho, a jovem que atua na rede pública de saúde de Ribeirão Preto (SP) conta que não acreditava na possibilidade de voltar a ter o novo coronavírus até fazer o teste por recomendação de colegas de trabalho.
– Eu estava com bastante dor de garganta, o nariz bem congestionado, bastante coriza, muita dor de cabeça, até mais do que a primeira vez e aí falei: 'mas não pode ser Covid, porque eu já tive Covid'. Continuei trabalhando porque eu já tinha tido, não pensava que poderia ser – diz.
A reincidência do vírus na jovem, considerada rara pelos médicos, será investigada pela USP de Ribeirão Preto (SP) e será levada à comunidade científica internacional. Segundo os pesquisadores, há registro de apenas outro caso semelhante ao de Gabriela, em Boston, nos Estados Unidos”.
Ao fim, é compreensível prefeitos venderem esperança em meio à tragédia. Mas, atrás das câmeras da lives, para além de comemorar que mais da metade dos pacientes estejam “totalmente curados”, Marco Alba e Miki Breier tem a responsabilidade de investigar os casos e se preparar para o pior: a reabilitação de sequelas e, caso comprovada a reinfecção, novas ondas da COVID-19 até a descoberta de uma vacina eficaz.
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