Fraga – Oi, 2021. Como vai você? Quer dizer, comparado a outros lugares da Terra, como está se sentindo aqui no Brasil?
2021 – Desatualizado. Não, ultrapassado. Ou pior, er, envelhecido.
Fraga – Ué, mas no dia 31 de dezembro de 2020 você parecia bem. O que houve?
2021 – Acho que desanimei com a falta dos fogos à meia-noite. Aquilo é adrenalina nos olhos e ouvidos. Foi a recepção mais triste que já tive.
Fraga – E depois que amanheceu, como você reagiu?
2021 – Reuni a família (os filhos Meses, as filhas Semanas, os netos Dias) e expliquei: turma, vamos ter de dar o melhor da gente.
Fraga – E por que esse pé atrás com o país?
2021 – Porque vi o estado a que chegou o meu primo 2020, completamente exausto e desesperançado com o que viveu no Brasil. Não sei se você sabe, 2020 está numa clínica. Depressão profunda. Recebe transfusões de ânimo de séculos de outrora.
Fraga – Mas você é um ano mais jovem que ele, é um ano de outra cepa…
2021 – Não me fale essa palavra! Você sabe, sou disciplinado, sigo rigorosamente minha agenda. Mas aqui, agora, desmoralizaram o Calendário. Passado e presente se confundem. Ontem é uma hipótese remota e amanhã é uma incerteza perene. Assim não dá, a gente se desorienta.
Fraga – Mas a população tá esperançosa com você, pense na sua responsabilidade, 2021!
2021 – Ah, não me faça rir. O problema dos brasileiros é que parecem viver cada dia como se fosse o último. E para centenas de milhares de mortos acabou sendo.
Fraga – Bom, a vacina ainda não tinha chegado.
2021 – E já chegou pra todos? Alguém tem que avisar as multidões nas praias lotadas, nos parques, nos shoppings, esses excessos todos por aí. Morro de medo de me contaminar, como o 2020, coitado.
Fraga – Reaja, 2021! Lembre-se do feriado do Carnaval, aproveite pra relaxar.
2021 – De que jeito, se nem vai ter blocos e desfiles? Só 2022 é que talvez possa curtir a Sapucaí.
Fraga – Ah, 2021, que pena esse seu desânimo. Ficou chato o nosso papo. Melhor interromper e voltar à entrevista após a Páscoa ok?
2021 – Se eu ainda estiver aqui. Ai, ai, ai.