3º Neurônio | opinião

Porque o massacre em Suzano tem a ver comigo, com você

O Seguinte: reproduz o artigo da jornalista Livia Meimes publicado no Medium

 

Um dia antes da tragédia de Suzano, na semana passada, eu pedi para os pais dos colegas de colégio do meu filho conversarem com os seus. Eu não entrei em detalhes, não “fulanizei” ninguém, só pedi para eles darem uma checada se os filhos deles não estavam meio sem travas, muito soltos, sem aquele mecanismozinho tão ultrapassado chamado limites, que os pais tanto detestam dar nos dias de hoje (eu me incluo nessa conta, é difícil pacas dar limites). Eu sei, foi meio ousado, eu “meio que me expus” (frase que sempre ouvi ao longo da vida, num sentido pejorativo). Eu me expus, sim, fiz isso porque estava sentindo que as relações poderiam ser mais harmoniosas na sala de aula e dei esse chute na porta. Deu polêmica, negação, fofoca, mas o resultado foi positivo: eles conversaram, os filhos responderam bem, e isso se refletiu até numa rodinha de conversa na sala de aula, na mesma semana, com direito a lágrimas e colo da professora. Eu nem esperava tanto feedback (eu odeio muito feedback), eu só queria que os filhos deles parassem de incomodar o meu, simples assim.

Mas aí sem querer eu mexi num vespeiro. Num vespeiro regado a uma tragédia. No dia seguinte do meu apelo aos pais dos colegas do meu filho, diversos inocentes morreram vítimas de um massacre em uma escola pública em Suzano, município de São Paulo, num evento ao estilo Columbine, no Colorado (Estados Unidos), ocorrido em 1999 e que virou uma espécie de marco para os vários ataques a escolas do tipo, até então. Mas o que o motivou dois psicopatas juvenis a sair atirando contra uma comunidade escolar na quarta-feira passada? O que levou a dupla encapuzada, Guilherme Taucci Monteiro, de 17 anos, e Luiz Henrique de Castro, de 25 anos, a invadir a escola que haviam estudado, efetuando diversos disparos de arma de fogo durante o horário do intervalo e atingindo dezenas de pessoas? O que levaria os adolescentes a cometer crimes tão graves? Bullying? Videogames e cultura midiática violentos? Um presidente perverso? Cultura escolar fracassada? Famílias desestruturadas? Psicopatia? Drogas lícitas e ilícitas? Os fóruns anônimos da Dark Web? Crise da masculinidade? Cultura do ódio? Estímulo ao uso de armas de fogo?

Se você respondeu todas as alternativas anteriores está no caminho certo. De fato, não existe uma só resposta para justificar a fúrias dos jovens de Suzano, são muitas respostas, ou melhor, perguntas. E vai demorar pra gente entender melhor o que aconteceu. É impossível ser fácil explicar a motivação para um crime tão chocante em que jovens saindo da adolescência resolvem cometer quando se sentem atingidos, de alguma forma, e em função disso saem atirando em colegas e professores e depois se matam. Ainda que seja duro chegar a esta conclusão, não podemos responsabilizar apenas as famílias dos jovens pelo ocorrido. Muito menos fazer o que esse repórter fez na confusa cobertura que parte da imprensa deu para o caso, sem querer glorificando os donos das mentes doentias que praticaram o crime.

Mas então a culpa é de quem? É sua, é nossa. Dos sistemas que estamos vivendo. Do Estado, do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. De quem votou num governo que apoia violência explícita e a cultura armamentista que seduz tanto o homem-branco-hétero-ocidental-cristão. De todos os pais que têm medo de dizer não aos seus filhos e terceirizam sua educação porque é mais fácil. Dos que negam que seus filhos tenham problemas. Da epidemia de doença mental que vivemos e que não nos tratamos. De todos os homens que acham que o machismo estrutural é “mimimi”. Dos educadores que fazem vistas grossas ao bullying que não magoa o filho do fulano, mas sim o do sicrano. De quem acha que a solução está na Bíblia.

E como estancar essa sangria? Como criar meninos e meninas numa sociedade tão problemática como a nossa? Sem dúvida começar falando com seu filho já é um bom começo.

Participe de nossos canais e assine nossa NewsLetter

Facebook
WhatsApp
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Conteúdo relacionado

Receba nossa News

Publicidade