entrevista

Um indignado no comando da OAB

Deivt Dimitrios presidirá a OAB Gravataí entre 2019 e 2021

Deivti Dimitrios foi eleito presidente da subseção Gravataí da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para o triênio 2019-2021. Aos 43 anos, 19 deles de advocacia principalmente nas áreas civil e trabalhista, ligado ao escritório Porto & Severgnini Advogados, recebeu 195 votos. Márcio Rodrigues, 180 e Elso Pires, 127. Presidente entre 2013 e 2015, tinha perdido a eleição para Marco Coimbra em uma união de última hora entre forças que no pleito de sexta concorreram separadas. Na entrevista ao Seguinte:, saiba mais sobre o que pretende fazer – e o que pensa sobre polêmicas do direito atual – o advogado formado pela Ulbra e com especialização e mestrado em argumentação jurídica como pupilo do professor Manuel Atienza Rodríguez, na Universidade de Alicante, na Espanha.

– Costumo dizer que sou formado é na vida forense. No ventre da mãe já estava no Fórum de Gravataí – brinca, pelo fato de ser filho de Odete Terezinha Porto, que secretariou magistrados como Marco Caminha e Ivortiz Marques Fernandes, e do escrivão Vilson Diogo dos Santos.

– Com 14 anos atendia no balcão e com 16 batia audiência numa máquina Olivetti, secretariando a pretora Maria de Lourdes Souza Pereira – recorda o advogado, de verve destemida, que apela por unidade após uma disputa sempre polêmica, como são todas envolvendo a classe.

– É momento de união pelo exercício digno da advocacia, que é a voz da cidadania. Um bom exercício do direito influencia desde a pessoa esperando por alimentos, até o recebimento dos honorários advocatícios.

Após a foto de Deivti com apoiadores, após a eleição, siga trechos da entrevista.

 

 

Seguinte Em sua primeira gestão articulaste o ‘abraço ao Fórum’, que culminou na criação de uma quarta vara, após representações no Tribunal de Justiça e no Conselho Nacional de Justiça pelo judiciário de Gravataí ser apontado à época como a comarca com maior dificuldade no RS, com um número de processos três vezes acima da média. É hora de um novo pedido de socorro?

Dimitrios – Sim. Precisamos trilhar novamente o caminho da mobilização da sociedade. Além da OAB, agregar outras entidades de classe, a Acigra, o Sindilojas, a Prefeitura, a Câmara e todos aqueles que precisam de melhores resultados de nosso judiciário. Após a posse em 1 de janeiro vamos conversar com a direção do Fórum, colher dados sobre a situação atual e conhecer o planejamento administrativo, para ir até o TJ com algo sugerido, com medidas a serem adotadas. Precisamos restabelecer a comissão mista que tínhamos, com OAB, Ministério Público, Defensoria, os magistrados, oficiais de justiça e escrivães, cada um com suas reivindicações e sugestões.

 

Seguinte Advogados reclamam de uma relação difícil com o judiciário no dia a dia, desde os estagiários até os juízes.

Dimitrios – Os profissionais precisam ter respaldo de sua entidade de classe. A OAB precisa voltar a ser atuante. Isso tem como conseqüência o respeito às prerrogativas da advocacia. Vou dar um exemplo: para entrar na Justiça do Trabalho advogados precisam abrir maletas e advogadas têm que mostrar o conteúdo das bolsas. Nunca vi isso em lugar nenhum. Já vi portas e detectores de metais. Se juízes e promotores não se submetem, por que os advogados devem fazê-lo? Parece uma coisa pequena, mas é no detalhe que se restabelece a dignidade. Outro exemplo: para marcar pauta na Vara de Família é preciso passar por escrivão, enviar email para o gabinete. Mas o estatuto prevê que juízes devem atender os advogados sem hora marcada. Isso se trata com diálogo e bom senso. Mas se não houver sensibilidade, cabe à Ordem tomar medidas. Há casos de advogados destratados por estagiários ao chegar ao balcão. É preciso entender que há um cliente esperando solução. É a vida das pessoas, não apenas um processo. E se não resolvermos aqui, vamos ao TJ, ao CNJ. Os advogados são partícipes do processo. Não são poucos os processos anulados nos tribunais superiores, mesmo com o alerta de advogados aos magistrados sobre a desconsideração de provas. É preciso respeitar as sentenças, mas não há como não questionar quando já existem normas, outras dezenas de decisões apontando o contrário do que decide o juízo de primeiro grau. Não basta dizer: “não me pauto pelo tribunal”. O novo CPC (código de processo civil) tem jurisprudências ainda mais fortes que antes. Ao fim, quem paga um cliente que após dois anos tem um processo anulado no tribunal? Já tive casos em que a pessoa perdeu carro, casa.

 

Seguinte Do que diferem essas decisões ‘cabeça-de-juiz’ no primeiro grau, das decisões conflitantes em tribunais superiores, como o prende-e-solta-de Lula no TRF4, ou a falta de julgamento e as mudanças de voto no STF em relação à prisão em segunda instância?

Dimitrios – Acredito que decisões de primeiro grau sem fundamentação adequada causam insegurança jurídica. Quando tribunais consolidam jurisprudência e juízes singulares se abstraem disso e julgam conforme seus entendimentos é uma coisa. É prerrogativa, mas às vezes sem fundamentação adequada. Não vejo como problema o debate sobre decisões antagônicas. A evolução do direito se dá conforme as questões sociais. Não pode é insegurança jurídica, o julgador decidir conforme sua vontade, sem fundamento.

 

Seguinte A Constituição tem sido respeitada ou dá para escrever em cima do livrinho: “é verdade esse bilhete”?

Dimitrios – A Constituição é nosso instrumento mais belo, mas é desconhecida, não só pelos advogados, mas também por magistrados. Em outros países se parte do direito constitucional. É como a gente vê nos filmes, os norte-americanos evocando a Constituição, seus nove artigos e 27 emendas. Aqui são mais de 200. Mas, se a Constituição é a base fundante do direito, vivemos também uma revolução dos princípios do direito. O ministro (Roberto) Barroso usou isso ao limitar o indulto natalino, por exemplo. Citou Ronald Dworkin.

 

Seguinte É o ‘direito criativo’, ou ‘direito interpretativo’?

Dimitrios – Muitos criticam o chamado ativismo judicial, mas o direito é criativo por si só. O “dura lex, sed sex” ( “a lei é dura, mas é lei”, conceito da Roma Antiga, sobre a necessidade de se respeitar as leis, por mais duras que elas fossem) evoluiu muito. Considero necessária a interpretação, a ponderação dos princípios. O ministro Gilmar Mendes usa muito isso também, cita o alemão Robert Alexy. A letra fria da lei pode não exercer o direito de forma completa. A moral também precisa ser aplicada ao direito. Mas já deveríamos ter ultrapassado a aplicação do “decido assim porque quero”.

 

Seguinte O STF parece cada vez mais desmoralizado perante a opinião pública.

Dimitrios – Considero o STF um belo tribunal quando quer ser. Nunca quando vincula uma ilegalidade que é o auxílio-moradia à entrada de um aumento salarial no contracheque. Deveria julgar se é legal ou não e ponto. Não pode vincular um julgamento a um acordo político com o presidente da vez. A OAB precisa estar alerta, vigilante, se posicionar. Ninguém sabe a posição da OAB sobre o auxílio-moradia. Opinião técnica, não política.

 

Seguinte A Lava Jato e seus métodos pouco ortodoxos, como longas prisões preventivas que invariavelmente desembocam em delações, dividem juristas. Qual sua avaliação sobre a operação?

Dimitrios – A Lava Jato é polêmica e divide bastante o meio jurídico. Vem-me a mente o juiz espanhol Baltasar Garzón, que condenou o general Augusto Pinochet por crimes contra a humanidade e, porque havia determinado gravação de advogados e clientes em um parlatório de presídio, foi expulso da magistratura. Transporte esse rigor para o Brasil…

 

Seguinte … onde o juiz Sérgio Moro liberou áudio de gravações da então presidente Dilma Rousseff…

Dimitrios – … que o próprio juiz considerou ilegal. E foi divulgado na mídia. A Lava Jato no contexto geral é aplaudida e toda sociedade espera resultados na apuração de crimes de colarinho branco. Como remédio, faz bem à sociedade, mas é preciso acertar a dose, ter cautela, não generalizar ou minimizar direitos fundamentais da ampla defesa.

 

Seguinte Vivemos a República das Delações, onde há relaxamento de penas para delatores, que hoje escolhem quem vive ou morre na política e ainda ficam com dinheiro no bolso para gastar. Isso não é um risco ao processo legal?

Dimitrios – Por isso alerto para cautela e prudência. Há situações de delações que não se confirmaram. É um instituto nobre, mas que não pode ter um fim em si. Não se pode ludibriar a ferramenta para atingir A ou B.

 

Seguinte–  Moro no Ministério da Justiça não faz mal à imagem do judiciário?

Dimitrios – É preciso ver por dois prismas. A ascensão de Moro, aceitando o convite, é coerente com a história dele, com a intenção em apurar os crimes de corrupção. Do ponto de vista jurídico externo, é impossível não levantar suspeição sobre o caminho trilhado. Afinal, houve correlação entre as decisões concretas do juiz e o afastamento de um candidato das urnas, no caso, Lula, com a conseqüente eleição de outro presidenciável, Bolsonaro. Votei em Bolsonaro, mas não posso deixar de reconhecer que fica a suspeita.

 

Seguinte Acreditas que direitos civis estão garantidos no governo Bolsonaro? Qual o papel da OAB?

Dimitrios – Pessoalmente acho positiva a formação do ministério, até agora. Não me assusta a quantidade de generais, porque o Exército brasileiro é reconhecido por seus intelectuais e técnicos. Entendo que Bolsonaro acerta ao não fazer mais do mesmo, não repetir a politicagem de sempre. Já sobre a preservação dos direitos civis, não vejo com preocupação. O presidente eleito recuou em muita coisa, mostra humildade. Mas se houver qualquer ameaça aos direitos garantidos pela Constituição, a OAB não pode se calar. Bolsonaro falou que ele e os seus às vezes dão caneladas, mas se houver desrespeito aos direitos civis, a sociedade tem que chegar junto, aí nas canelas dele. E a OAB é a voz da cidadania. A Constituição tem que ser maior que atos tresloucados de qualquer político.

 

Seguinte Não apoiaste nenhum candidato à presidência da OAB gaúcha. Essa independência é boa ou ruim para negociar com o reeleito Ricardo Breier?

Dimitrios – Nossa Ordem terá administração com autonomia, como acho que deveria acontecer em todas as subseções.

 

Seguinte– Pretendes fazer alguma obra física na OAB Gravataí?

Dimitrios – É preciso ampliar a sede. Temos mais de 600 advogados atuantes na cidade. Quando tesoureiro da presidente Paula Vargas, entre 2010-2012, deixamos R$ 30 mil no caixa. Em minha gestão outros R$ 43 mil. Como a anuidade para a seccional é de cerca de mil reais por ano, queremos uma participação maior nestes R$ 600 mil. Como, ao que parece, os repasses não tem ultrapassado R$ 100 mil para Gravataí, queremos discutir onde está indo esse dinheiro. A cada colégio de presidentes é realmente preciso reunir 106 representantes, mais acompanhantes, em hotéis de luxo, com jantares caros, aviozinhos e etc?

 

Seguinte Deixe uma mensagem.

Dimitrios – Todos os envolvidos no direito têm sua parcela de responsabilidade na crise, nos 13 milhões desempregados, na violência. Tudo isso passa pela aplicação do direito. Como pode o país nessa situação e o STF ter um reajuste que provoca um efeito cascata Brasil afora? Aumentar o teto de R$ 33 mil para R$ 39 mil, quando um brasileiro acorda às 5h e volta de noite para casa para ganha R$ 950? Como se gastou R$ 200 milhões por mês em auxílio-moradia considerado ilegal já em 1984, em liminar do ministro Supúlveda Pertence? É dissonante da realidade.  Precisamos do sacrifício de cada um por um país melhor. Aqui em Gravataí, precisamos fazer com que o terceiro PIB do RS não seja tão maltratado.

 

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