O desafio era acompanhar a estreia da Seleção Brasileira na Copa do Mundo sem estar contaminado pelos 7 a 1 de 2014. Nos últimos anos, tirar essa zica foi a grande missão do técnico Tite, e ele chegou à Rússia festejado justamente por demonstrar claros sinais de que aquele fiasco já é coisa do passado. O Miguel Rolim Torres, de três anos, ainda estava na barriga enquanto os alemães empilhavam gols. Só nasceu em dezembro de 2014 e, aos três anos, neste domingo fez a sua estreia na torcida pela Seleção.
Mas o que começou com uma certa empolgação, misturada com estranhamento, porque o Miguel não está acostumado a futebol pela televisão, terminou em soninho. Na metade do segundo tempo, quando um Neymar, sem brilho algum, e uma equipe com pouquíssima mobilidade, se entregavam facilmente à marcação da Suíça, o Miguel largou de mão. Preferiu ver desenho no celular. A estreia dele, e da Seleção de Tite, acabou no empate em 1 a 1.
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Antes de contar essa história, é preciso apresentar o nosso espectador. Miguel, desde bem cedo, é acostumado à arquibancada. No mais tradicional conceito do futebol raiz, como chamam hoje em dia. É torcedor do São José, como o pai, e, literalmente, agita na arquibancada de pedra — ainda não contaminada pela higienização do futebol moderno — e assiste aos jogos grudado no alambrado. No domingo, à medida em que o momento da estreia do Brasil na Copa se aproximava, ele aproveitava para tirar algmas dúvidas fundamentais:
— Mas eu sou Zeca, pai. Quem é Zeca é do Brasil também?
Só depois da resposta positiva, ele topou fardar-se com direito a bandeira e corneta. Da cozinha, saíam rapaduras, pipoca, chimarrão. E a bola rolou.
A equipe comandada por Tite parecia entregar o que havia encomendado. Foram pelo menos 20 minutos de puro futebol, movimentação e qualidade diante de uma Suíça que não passava do meio campo. O Miguel, atento ao jogo, vez por outra dava uma soprada na corneta. O apoio funcionou. Aos 19, Philippe Coutinho marcou um golaço para abrir o placar brasileiro na estreia do Miguel.
A pressão continuou. Aos 32, por pouco Gabriel Jesus não ampliou. Já nos acréscimos, foi a vez de Thiago Silva cabecear com perigo. O problema viria depois do intervalo. O que era organização, em apenas quatro minutos, se tornou nervosismo, e logo deu lugar à ausência completa de iniciativa dentro de campo. Tinha uma explicação.
Foi aos quatro minutos que, na cobrança de escanteio, um suíço subiu sozinho em meio à pequena área brasileira para cabecear sem dificuldades: 1 a 1. Na transmissão, muita reclamação contra o suposto erro do árbitro ao não marcar falta no zagueiro Miranda. O Miguel não se importou. Viu o Brasil levar o primeiro gol na Copa com a mesma tranquilidade com que recebe os gols dos rivais do São José no Passo d'Areia.
Ele está acostumado, na sua experiência de três anos, a ajudar nas reações na grade. Domingo não havia alambrado, nem muito barulho. Aquele encanto infantil de outros tempos, a cada Copa do Mundo, com as ruas coloridas, ou os gritos vindos de cada janela dos edifícios não se repetiram. Não demorou muito para o Miguel perder o interesse. E, ao que tudo indica, Neymar e companhia também o perderam. O jogo arrastou-se até o fim em ritmo preguiçoso.
Ah, claro, ainda houve outro lance polêmico, de possível pênalti não marcado sobre Gabriel Jesus, que muito pouco fez em campo. Em casa, o Miguel nem reclamou. Os comentaristas da TV, sim. Na reta final do jogo, quase aconteceu aquele golzinho salvador. Primeiro, com uma cabeçada certeira de Firmino, defendida pelo goleiro, depois, com Renato Augusto chutando na sobra dentro da área, salva pela zaga da Suíça. O Miguel quase se empolgou, mas até ele, com três anos, sabia que a estreia brasileira não merecia vitória. O empate foi o tamanho do que o time de Tite mostrou em campo.
Sexta tem mais, contra a Costa Rica. Será a segunda vez do Miguel e de Tite. Tomara que, desta vez, ninguém durma.