Panela no armário, fakenews compartilhada no Facebook, vídeo repassado pelo WhatsApp, carro desabastecido na garagem, prateleiras vazias no super, plantão da Globo e uma noite com a cabeça no travesseiro talvez já tenham sido suficientes para perceber que a ‘greve dos caminhoneiros’ era um locaute – uma greve de patrões, que souberam como nunca usar a insatisfação geral da nação para faturar em um momento onde a recessão faz com que seus caminhões circulem vazios.
Encontre no acordo firmado entre o governo e representantes dos caminhoneiros, para uns, prepostos de gigantes transportadoras, para outros, algum item que estava na ‘sua’ pauta de reivindicações, para além do ‘contra tudo o que está aí’, e ganhe um vale-combustível.
O desconto de 10% no diesel, a compensação que será paga a Petrobrás para manter a política de preços alinhada ao mercado internacional, a zerada na Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico (Cide) – só Gravataí perde R$ 350 mil em receita – e a manutenção da desoneração da folha de pagamento para as empresas de carga somarão um assalto de quase 10 bilhões nas contas públicas.
E tem ainda o acerto para a atualização trimestral da tabela de fretes regulada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres, que avançará sem intermediários no seu bolso.
Em resumo, a gasolina não vai baixar e os preços vão subir a cada aumento no frete.
A conta bilionária com que o governo Temer cedeu – da mesma forma que Dilma fez ao vender o combustível mais barato do que custa – quem pagará somos todos nós.
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OPINIÃO | Você, a vítima da greve dos caminhoneiros
Ao publicar ontem o artigo “Você, a vítima da greve dos caminhoneiros” fui atropelado por críticas de todos os lados nas redes sociais, metralhadas nos teclados por leitores tão simpáticos à greve como se mostraram nossos políticos, da esquerda à direita, passando pelo centro, que por desinformação ou instinto de sobrevivência nas urnas pareciam unidos por curtidas em uma sociedade facebuquiada e com sintomas da Síndrome de Estocolmo.
Goste-se ou não, é um dever jornalístico lembrar que a ‘greve dos caminhoneiros’, onde havia mais caminhões parados nas transportadoras do que fazendo piquetes nas estradas, não é uma paralisação comum, um democrático "direito de greve". Tanto que a Lei de Segurança Nacional trata o abastecimento de combustíveis como de “utilidade pública”, em seu artigo primeiro – e decisões judiciais já estão se baseando nisso.
Não é como parar a produção de um bem, como um carro da GM, por exemplo. Ou como professores suspenderem aulas que podem ser recuperadas. Ou mesmo bloqueios temporários de acesso a algum latifúndio. Ou então meia dúzia protestando na esquina, sob o risco de ser atropelados por alguém atrasado para o serviço.
Num país dependente do transporte rodoviário, já se previa a distopia da falta de água, comida, oxigênio nos hospitais e policiais nas ruas. Sem falar que, no mesmo momento em que alguns colocavam uma roupinha em seus pets para protegê-los do frio, cargas vivas morriam de fome nas estradas.
Como mágica é truque, o momento exige racionalidade, não mais intolerância, badernas difusas ou soluções demagógicas que afundam ainda mais a economia de um país que teve empresas nacionais quebradas pelo lavajatismo e de onde investidores estrangeiros correm, enquanto os abutres do rentismo sorriem.
Não basta postar ‘In Moro We Trust’, ou ‘Caminhoneiros, Guerreiros do Povo Brasileiro’ e Jesus vai voltar. Governo se derruba nas eleições, confirmas nas urnas demitem políticos – e não sangue ou falta de oxigênio em hospitais.
Mas parece que não se aprendeu nada com o golpeachment de 2016.
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