A História sentou na primeira fila, nessa festa brega do casamento real.
Plebéia, divorciada, ativista do feminismo e negra, Meghan Markle entrou para a realeza – por motivos do coração, mas não pela porta da cozinha.
Corta para o Grande Tribunal das Redes Sociais e imagina se fosse no Brasil. Já teríamos abertura de inquérito pelo Ministério Público Federal para investigar ataques racistas e/ou machistas que já estaria sofrendo a atriz que, aos 11 anos, escreveu para a então primeira-dama Hillary Clinton e conseguiu fazer com que uma famosa marca de detergentes alterasse uma propaganda onde o papel da mulher era lavar a louça.
– As mulheres devem ter um lugar ao redor da mesa (…) E, em certos casos, se este lugar lhe é negado, precisam criar sua própria mesa – reivindicou, em 2015, já aos 33 anos, falando na Organização das Nações Unidas, no Dia Internacional da Mulher.
Mesmo que pobre a princesa nunca tenha sido, talvez você já esteja refletindo em silêncio sobre nossa realidade, onde a Senzala pouco visita a Casa Grande. Dados da ONU mostram que, apesar da população negra na América Latina chegar a 150 milhões de pessoas, nem 5% ocupam cargos nos governos.
O Brasil puxa o grilhão da segregação, mesmo com mais da metade da população (54%) composta de pessoas que se autodeclaram negras.
Há três anos, a Folha de S. Paulo fez um levantamento com 1.138 profissionais em postos de destaque na política, saúde, artes, judiciário, universidade e política. Nem dois em cada 10 eram negros.
Joaquim Barbosa recém desistiu de concorrer, quando tinha todas as condições de ser eleito presidente da República – apesar de que em relação à causa está mais para Fernando Holiday do que para Malcolm X ou Martin Luther King Jr.
Em Gravataí, nas duas décadas em que faço a crônica política, de memória não recordo de negros nos primeiros escalões da Prefeitura. Na Câmara, Jairo Santerra foi vereador e hoje temos o presidente Airton Leal – se ele assim se declarar.
Pouco, muito pouco, mas sintoma inequívoco da longevidade da nossa escravidão e de uma desigualdade de seletivas panelas.
Enquanto a Fábula de Windsor ganha as mídias, mais pela futilidade e a fofoca do que pela simbologia, na Guerra do Brasil é mais fácil ver, nos próximos 23 minutos, um negro morto a tiros.
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