coluna do leandro

A verdade sobre a vida no escritório – 6 modismos que não são novos

O texto a seguir é um grande painel do tal Mundo do Trabalho. Vou dividi-lo em três partes, nesta e nas próximas semanas. Se chama A verdade sobre a vida no escritório e é de Lucy Kellaway, publicado no Financial Times

 

Quando comecei a trabalhar em um escritório, no início da década de 1980, fumávamos em nossas mesas, martelávamos nossos textos em duras máquinas de escrever e na hora do almoço escapávamos até a cantina do escritório para comer uma torta de carne moída. Tudo o que venho escrevendo a partir de então sobre os escritórios modernos – os lugares sem fios, sem fumaça e silenciosos onde agora trabalhamos – é tingido por minhas lembranças de como eram as coisas no passado.

No entanto, agora, penso que meu senso de história era totalmente distorcido. Acabei de realizar uma série para a BBC Radio Four sobre os últimos 250 anos da vida em escritórios e descobri que metade das coisas que considerava novos modismos revelaram-se não ser, de forma alguma, novidades, ao passo que muitas coisas que considerava fatos eternos da vida em escritórios são realmente bastante recentes.

Existem, porém, algumas constantes – como a paquera e o tédio –, assim como algumas coisas que desapareceram para sempre. A “tia da copa” que trazia o chá jamais retornará.

As listas a seguir pretendem restabelecer a verdade.

 

Seis modismos que não são novos

1. Trabalhar no starbucks

Esta tendência recente tem 350 anos de existência. O primeiro café londrino foi inaugurado em 1652, e foi um sucesso instantâneo entre os homens cuja atividade era vender seguros de navios ou que negociavam com açúcar ou com cabelo humano. Após 50 anos, havia 3 mil deles – uma taxa de expansão que faz a invasão da starbucks na capital do Reino Unido parecer uma tartaruga. Há duas diferenças entre aquelas cafeterias e a versão moderna. O foco, à época, era frequentar para encontrar gente – hoje é para ficar sozinho com seu laptop. E a bebida predileta não era um frappuccino de caramelo com canela extra, mas uma bebida quente que, dizem, mais parecia um “xarope de fuligem com essência de sapatos velhos”.

 

2. Trabalhar em casa

As pessoas costumavam trabalhar em casa – não por causa da internet ou para poupar gasolina, mas porque não havia escritórios. Em 1762, quando o Barings estabeleceu sua sede na Mincing Lane, a atividade bancária acontecia no térreo, enquanto no andar de cima a senhora Baring criava 10 de seus 12 filhos. Foi um tempo de funcionários polivalentes que também moravam no local, dos quais se esperava que fossem igualmente habilidosos com os números tanto quanto em desincumbir-se de tarefas cotidianas e distribuir o pão redondo com manteiga na hora do chá.

 

3. Pagar para ser estagiário

Dos estagiários modernos espera-se não apenas que trabalhem sem remuneração, como também, por vezes, que tenham de pagar pelo privilégio. Mas 200 anos atrás esse tipo de coisa era rotina. Quando um Charles Lamb adolescente conseguiu um disputado emprego no departamento de contabilidade da Companhia das Índias Orientais, teve de pagar uma fiança de 500 libras esterlinas como garantia de bom comportamento e encontrar dois patrocinadores que fizessem o mesmo, e então trabalhou durante dois anos sem receber nenhum salário. Isso lhe custou o equivalente a 140 mil libras, fazendo com que o estágio de uma semana na “Vogue” – arrematado por 42,5 mil libras em um leilão beneficente, no ano passado – pareça bastante razoável.

 

4.  Café da manhã à mesa de trabalho

Um jovem colega gosta de começar o dia com uma tigela de Fruit’n Fibre equilibrada sobre seu teclado. John Stuart Mill fez o equivalente 170 anos antes. Todos os dias, ele caminhava de casa, em Kensington, até seu escritório na Leadenhall Street, onde consumia um ovo cozido e uma xícara de chá à sua escrivaninha. A diferença era que o café da manhã de Mill era trazido por uma criada. Meu colega tem de encher, ele próprio, sua tigela de Fruit’n Fibre. Até o século XX quase não existiam gerentes. O Reino Unido atravessou a Revolução Industrial sem quase nenhum administrador

 

5. Twitter

O site de microblogging não inventou a comunicação sucinta. Isso foi inventado em 24 de maio 1844, quando Samuel Morse digitou o primeiro telegrama: “O que Deus fez!”. O que Ele fez acabou revelando-se algo de fato bem grandioso, abrindo o caminho para a internet e levando Jack Dorsey a digitar, em 21 de março de 2006 o primeiro tweet: “Só estou compondo meu primeiro twttr”. Não é de surpreender que, como exemplo de prosa, a mensagem de Morse tenha sido enormemente superior: os primeiros telegramas custavam o equivalente a US$ 25 por mensagem; ou seja, as pessoas não escreviam qualquer coisa velha.

 

6. E-mails destruindo a paz de espírito

Nossos temores de que as mensagens de e-mail nos deixem estressados são precisamente os mesmos que tínhamos 100 anos atrás, com o surgimento do telefone. Um artigo publicado na revista “Telephony”, em 1913, informou que algumas pessoas ficavam histérica por terem de ficar permanentemente à disposição para atender chamadas telefônicas que chegavam com uma frequência inferior a uma por dia. E foram os telefones, e não o BlackBerry, que destruíram férias. Um anúncio de 1914 advertia homens de negócios para o fato de que um telefone os permitiria, enquanto pescassem trutas durante suas férias, manterem-se em contato com o que estava acontecendo no escritório.

 

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