Voltava para casa, a pé e, no caminho, vinha em minha direção uma moradora de rua que me chamou a atenção por suas vestes. Era um desses dias quentes que enfrentamos. A moça, aparentando uns trinta anos, usava uma calça de sarja, compondo com uma camiseta no mesmo tom acinzentado. Usava sandálias. Seus cabelos estavam escondidos em um lenço. Assoviava e gesticulava para o alto, como a conversar com alguém imaginário.
Suas roupas não eram novas e nem tão limpas, mas o estilo adotado por ela era de evidente cuidado. Cada peça, usada individualmente no corpo franzino, não faria sentido. Olhei de novo e me impressionou a harmonia do conjunto obtida pelo jeito com que fez a amarra no lenço e na forma como customizou a camiseta.
Logo adiante, porém, no outro lado da rua, vi um conhecido com roupas surradas pelo uso. Vestia camisa de mangas curtas aberta até a metade da protuberante barriga e calça social com a bainha dobrada que deixava à mostra a velha sandália de tiras de couro. Seu andar apressado, suponho, impediu que me visse. Cruzamos sem um cumprimento, sem um oi sequer, cada um de nós seguiu o seu rumo.
Ao chegar ao prédio onde moro, três homens, vestindo calças jeans e camisetas de propaganda estavam lá parados. De imediato, um deles me disse: “Não se preocupe, não somos assaltantes. Só estamos esperando o síndico para acertar um serviço de pintura”.
Outro dos três relatou que as pessoas estavam olhando torto para eles e que um motorista nem quis estacionar seu carro na vaga livre junto ao trio. Fiquei sem saber o que dizer. Dei boa tarde e entrei em casa.
Com as imagens das pessoas nas situações que presenciei só me veio à mente o antigo ditado popular “o hábito não faz monge”. Simplificando, recomenda não julgar as pessoas pela aparência.
A mulher da rua falava sozinha. Os homens na porta do prédio eram operários que haviam saído de uma obra para fazer orçamento de outra. Não haviam trocado as roupas de trabalho. E isto incomodava a quem por ali passava. O conhecido era um profissional da velha guarda do jornalismo, agora aposentado. Nada mais sei sobre sua vida.
Descrevi estes pequenos flagrantes de cenas urbanas das quais participei. Creio que as roupas podem revelar ou ocultar quem realmente a gente é. Também podem indicar, talvez, nossas predileções por determinadas peças, estilos, cores e por aí vai. Só não tenho dúvidas é que são instrumentos poderosos para provocar nossos mais variados preconceitos sobre as pessoas. Tento sempre escapar dos pré-conceitos. Nem sempre consigo.