Qualquer pessoa que conhece outros países já deve ter notado que algumas coisas são muito mais caras no Brasil do que no exterior, especialmente eletrônicos, roupa, carros, gasolina, etc. Por outro lado, outras coisas costumam ser bem mais baratas por aqui – comida e aluguéis, especialmente. Brasileiros que vivem ou visitam os EUA não cansam de postar vídeos nas redes sociais estupefatos com o preço da gasolina. Um litro de gasolina lá sai, mais ou menos, por R$ 1,72, contra os mais de R$ 4,00 por aqui. Dizem, também, que é possível comprar um bom carro usado por 2 mil dólares, pouco mais de 6 mil reais. Celulares, notebooks, televisores costumam sair por cerca da metade do preço que encontramos aqui. Você já perguntou porque isso ocorre?
A explicação comum é a do imposto. A carga tributária dos EUA é de cerca de 27% da riqueza produzida, enquanto a nossa é de cerca de 34%. Ocorre que outros países desenvolvidos possuem cargas tributárias bem mais altas do que a brasileira, especialmente na Europa (chegando a cerca de 50% da riqueza em alguns casos, como na Dinamarca), e os preços desses itens são semelhantes aos americanos. Não parece ser o tamanho da carga tributária exatamente o problema, mas como ela é cobrada. Enquanto nos EUA e nos demais países ricos, os impostos costumam se concentrar sobre a renda, herança, propriedade, etc., aqui nos focamos em taxar diretamente o consumo. É só pensar na quantidade de impostos embutidos que qualquer produto por aqui possui (ICMS, PIS, IPI, etc.), que, normalmente, chegam a metade do valor do produto, enquanto vários países utilizam apenas um imposto sobre mercadorias, o IVA (imposto sobre valor agregado), que, normalmente, não passa de 20% do valor do produto, além de facilitar a burocracia. Por outro lado, o imposto de renda aqui é bem camarada. Um bilionário paga os mesmos 27% que um trabalhador qualificado, que ganha mais de R$ 5 mil, paga. Em alguns países, o imposto de renda dos ricos chega a cerca de 50%. Enquanto aqui o imposto sobre heranças é de cerca de 2%, nos EUA, passa de 40% às vezes.
O imposto ajuda, mas existem outros dois fatores muito importantes. Desde 1930, com a chegada de Getúlio Vargas ao poder, o Brasil iniciou uma política de tentar produzir aqui mesmo tudo que o país precisasse – o que fez com que o país se industrializasse. Ocorre que, muitas vezes, seria mais barato comprar o produto lá fora do que produzi-lo aqui – afinal, os gringos costumam ter mais experiência, tecnologia, mão-de-obra mais qualificada, etc. Assim, para evitar que as coisas do exterior suplantem os produtos nacionais, o governo brasileiro coloca tarifas altíssimas sobre importações. Se você encomendar alguma coisa do exterior pela internet, é provável que você pague mais de 100% de impostos sobre o valor do produto, o que torna os nossos produtos nacionais – em princípio mais caros – competitivos aqui dentro. Quando Collor iniciou a abertura econômica – mantida, em linhas gerais, até a crise de 2009 – ele dizia que o carro produzido no Brasil era uma carroça, caro e ruim. Não deixava de ser verdade. Economistas mais liberais, críticos a essa política de substituição de importações, falam nas “vantagens comparativas”. Segundo eles, cada país tem se especializado em produzir bem e barato algumas coisas, nas quais ele deveria se focar, comprando do exterior aquilo que não produzisse bem. Assim, a França se especializou em vinhos, o Japão em tecnologia de ponta, a Suíça em relógios e equipamentos de precisão, o Uruguai em laticínios e o Brasil em café, soja, mas, também, em aeronaves (as da Embraer estão entre as mais vendidas do mundo). Tentar se fechar ao mundo e produzir tudo aqui dentro seria, assim, a receita para a pobreza.
Bem, também existe o fato de que as margens de lucro no Brasil são muito elevadas. No caso da indústria automotiva, três vezes mais elevadas do que nos EUA. Em Paris, uma das cidades mais caras do mundo, um Big Mac sai mais barato do que nos shoppings brasileiros. Os empresários brasileiros costumam colocar os preços lá em cima, dentre outros motivos, porque o brasileiro aceita pagar mais caro. É a teoria psicológica do preço, também conhecida por “teoria da utilidade marginal”. Você já deve ter reparado que uma pizza doce custa a mesma coisa que uma pizza salgada, embora chocolate e morango sejam muito mais baratos do que camarão ou picanha. Por que o dono da pizzaria não cobra mais barato pela pizza doce, se ela é muito mais barata de produzir? Ora, por que ele faria isso se o consumidor aceita pagar tanto pela pizza doce? Esperto é ele, burro é o consumidor. É assim que funciona o mercado. Os preços costumam partir de um ponto que é o mais alto que o consumidor esteja disposto a pagar.
Mas não dá para só reclamar da tentativa brasileira de se industrializar. O incentivo à indústria, especialmente entre os anos 1930 e 1980, fez com que o Brasil tivesse uma economia extremamente diversificada e complexa, com cadeias produtivas semelhantes às de países de primeiro mundo. O Brasil ter uma economia tão complexa e diversificada faz com que o país se saia relativamente bem das crises pelas quais passa. É só olhar para vizinhos nossos, que dependem de poucos produtos. Quando o preço da carne ou do trigo despenca, a Argentina entra em colapso, o que também ocorre com a Venezuela, quando o petróleo passa a valer menos. Mesmo com a crise terrível da qual ainda estamos saindo, os setores que mais sofreram foram aqueles que dependiam mais dos incentivos do governo (indústria de petróleo, indústria automotiva, construção civil, etc.), enquanto setores como o agronegócio ou serviços não sofreram tanto. Essa é a vantagem de ter uma economia diversificada. Se um setor está mal, outro estará bem. Aliás, para uma cidade como Gravataí, que vive em torno da indústria metalomecânica e automotiva, a proteção à indústria nacional fez muito bem.