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O grande negócio da Corsan para região onde jorra o dinheiro

Estação de tratamento da Corsan em Alvorada que será compartilhada com concessionária na PPP

A conta da Corsan é astronômica para levar água e esgoto para os 316 municípios onde opera. Seriam necessários mais de R$ 10 bilhões, ou 25 vezes o que o Rio Grande do Sul investiu em todo ano de 2016. O Seguinte: teve acesso a uma minuta do plano de expansão da estatal, que prevê uma parceria público-privada (PPP) de 35 anos para atender prioritariamente a Região Metropolitana, enquanto projeta para o amanhã a captação de recursos junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para os municípios de menor porte.

A PPP inclui Gravataí, Cachoeirinha e Viamão, ao lado de Canoas, Alvorada, Esteio, Sapucaia do Sul, Guaíba e Eldorado. E não só por formarem o maior bolsão populacional do Rio Grande do Sul, mas porque garantiram um lucro espetacular de R$ 208,9 milhões à companhia no ano passado – quase o dobro de 2015. Como a cada 10 reais, nove dos R$ 2,3 bilhões de receita vieram da venda da água, é nos nove municípios onde verte o dinheiro para atrair investidores num mercado cada vez mais cobiçado mundo afora.

No PowerPoint, entre os tecnocratas ou na plutocracia, o plano é tão ambicioso, necessário e viável quanto a promessa do governo Marco Alba de bancar um ‘tchau Corsan’ em Gravataí, com a licitação de uma concessão para levar água para todos em cinco anos, esgoto tratado em 10 e recuperar o Rio Gravataí em 15.

 

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Para se ter uma idéia do tamanho do negócio, a companhia projeta com a PPP ampliar os serviços das atuais 363 mil economias para 1,5 milhão de casas, prédios e empresas até 2053, o que significa atender 87,30% da população projetada em 1.869.429 seres. Em Gravataí e Cachoeirinha, como em Viamão e Alvorada, considerados pela Corsan como sistemas gêmeos, essa meta de gente pagando a conta todo mês já seria atingida em 2026.

Os investimentos previstos são de R$ 1,8 bilhão pela empresa vencedora de uma licitação que será internacional e prevista para o ano que vem, onde poderão participar desde as hoje malcheirosas nacionais Odebrecht e Andrade Gutierrez, até tubarões de águas estrangeiras como Aqualogy (Espanha), GS Inima (Coreia do Sul) e Veolia (França). 

Olhando para o umbigo, no sistema Gravataí-Cachoeirinha pingariam de dinheiro privado R$ 274,5 milhões. Nos também siameses Viamão-Alvorada, R$ 567,5 milhões.

Como parece regra em qualquer privatização ou concessão feita no Brasil, o risco do negócio parece quase zero: até 2021, enquanto tocará obras de expansão e ligações de rede, a concessionária já poderá faturar em cima do sistema que hoje recebe R$ 1,4 bilhões em investimentos públicos do PAC 1, de 2007, e do PAC 2, de 2010.

Além de ganhar com o aumento no número de contribuintes (não só pela expansão do sistema, mas também pelas decisões judiciais autorizando a ligação compulsória e a cobrança da conta nos bairros onde há rede de água e esgoto), a concessionária fará a troca de todos os hidrômetros com mais de cinco anos e explorará comercialmente ativos da Corsan, como as estações de tratamento (ETEs). Por exemplo: poderá cobrar pela destinação de efluentes de aterros sanitários como aqueles projetados pelas gigantes Solvi (Viamão) e Estre (Glorinha) na ‘ I Guerra do Lixo’ vivida na região.

 

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Ideologias ou espíritos de corpo à parte, conceitualmente o modelo de PPP segue a enxurrada de terceirizações feitas nas últimas décadas pela estatal – mesmo sem reduzir em quase nada sua estrutura paquidérmica. Diferente da ‘concessão patrocinada’, onde a empresa privada cobra a tarifa diretamente do consumidor, a Corsan lançará no mercado a ‘concessão administrativa’, onde ela ‘pagará’ o investidor.

O preço das tarifas será regulado pela Agergs. Já os pagamentos pelas obras e serviços prestados pela empresa serão autorizados por um conselho gestor da PPP, formado por prefeituras, Ministério Público e comitês como o da Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí, todos subsidiados com dados levantados por uma auditoria independente.

Como, para defender a PPP, um dos principais argumentos do estudo encomendado pela Corsan junto à gringa PwC é a redução de cargas não tratadas, com o objetivo de recuperar aos longo dos anos o Gravataí e o Sinos (ao lado do Tietê, em São Paulo, os rios mais poluídos do Brasil), também é prevista a partir da assinatura do contrato a medição e análise pela Ufrgs de 15 pontos diferentes dos mananciais, para avaliar os resultados da parceria.

Os levantamentos da PricewaterhouseCoopers, consultoria de extenso currículo que, para o bem e para o mal, você encontra no Google, também apontam na defesa da parceria público-privada a oferta de 32,5 mil empregos e a circulação de R$ 3 bilhões em renda.

Bom ou mau negócio, num ambiente onde até o boy terceirizado sabe que a Corsan não tem dinheiro para resolver o problema da água e esgoto no Rio Grande do Sul, um fator que escapa dos bytes das tabelas de receita e despesa pode levar a PPP para o ralo: a política. É que Gravataí, o terceiro maior PIB do RS, e segunda maior economia entre as cidades contabilizadas no meganegócio, não abre mão de lançar sua própria concessão.

 

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Na última sexta, emissários da Corsan procuraram Marco Alba e, sem fotos ou registros no site oficial da Prefeitura, apelaram para que o prefeito recue do plano de romper o contrato com a companhia e licitar os serviços. Há 15 dias, antes de embarcar para a Alemanha, o governador já tinha aprovado o modelo de parceria e dado um ultimato ao ‘grupo dos nove’: ou sim, ou não. Marco, apesar de colega de PMDB, e primeiro a lançar a reeleição de José Ivo Sartori, está irredutível, ainda.

 

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Uma semana atrás, em reunião do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí onde a PPP foi apresentada em Santo Antônio da Patrulha, a reportagem do Seguinte: indagou ao superintendente de Gerenciamento da Expansão da Corsan se investidores se interessariam pelo negócio sem contar com os 275.146 habitantes de Gravataí, uma das ‘jóias da coroa’.

– Com alguns ajustes dá para fazer – arriscou o engenheiro José Homero Finamor, veterano na companhia.

Só que não parece ser preciso entender muito de negócios para suspeitar que os ajustes não serão poucos. Ou, sem Gravataí, a Corsan vai oferecer ao mercado um carro e entregar só as rodas.

 

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