O PT terá candidatura própria à Prefeitura nas eleições de 12 de março. O Seguinte: conta os bastidores onde se ouviram os nomes de Rosane e Anabel, mas levarão ao 'Vai Ter Valter'
A palavra golpe foi repetida 33 vezes desde a hora em que, uma dezena de citações depois, uma fonte presente começou a contar, até o fim das duas horas de reunião do diretório do PT de Gravataí, na noite desta terça-feira.
Golpe em Dilma.
Golpe em Rita.
Golpe das urnas.
Cinco anos e cinco meses depois, o impeachment da prefeita Rita Sanco ainda fere a memória dos sobreviventes e segue cassando qualquer possibilidade de aproximação do partido com os ‘golpistas’ – que as urnas também têm maltratado, um a um, eleição após eleição.
O partido que chegou ao palacinho rosa da José Loureiro há 20 anos e, além de dois mandatos de Daniel Bordignon e um de Sérgio Stasinski, viu Rita ascender ao poder com 68.553 votos, a maior votação da história de Gravataí, e perdeu em média 34 votos por dia nos mais de 1900 dias de 2008 até os constrangedores 2.578 votos feitos por Valter Amaral nas eleições de 2 de outubro, decidiu encarar o ‘veraneio das urnas’.
O PT terá, pela nona vez e como em todas as eleições desde sua fundação no início dos anos 80, candidatura própria.
O 'bem maior'
A impossibilidade de Bordignon tirar da chapa de Rosane Bordignon o mentor do impeachment e algoz de Rita desfez a esperança de muitos que – sob a alegação de que em 2018 PT e PDT estarão, com Jairo Jorge candidato a governador, juntos pelo ‘bem maior’ de tentar ganhar o governo de Sartori – queriam voltar à influência do mais petista de todos os petistas da aldeia.
Cláudio Ávila foi o vilão de sempre.
– Houve conversa, esperamos, Bordignon até tentou, mas não deu – revela fonte que acompanhou os bastidores das conversas que chegaram a ser, em suas palavras, “estadualizadas”.
Inclusive os grupos de Rita, onde está o sempre influente ex-secretário da Fazenda Alex Borba e de Paulo Bairros, que concorreu a vereador, seriam simpáticos à reaproximação.
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O sogro tentou
Pelos dias que levaram ao diretório desta terça, até Anabel Lorenzi (PSB) já foi pauta, trazida por Maza Godoy, que tem como genro Paulo Silveira, vereador mais votado dos socialistas e hoje uma das pessoas com, dentro dos intrincados limites que a candidata permite, ascendência sobre ela.
– Golpista não! – ouviu de uma incomodada Rita, que não perdoa a ex-petista por votar a favor do impeachment e ajudar a eleger os peemedebistas Nadir Rocha e Acimar da Silva prefeito interino e tampão, entre 15 de outubro e 15 de novembro de 2011.
Prevaleceu a tese de que se houve golpe em Brasília, também o foi na aldeia. Aí, como explicar um game over na inimizade com Cláudio Ávila?
Temers e Sartoris da aldeia
As vozes favoráveis à candidatura própria tinham sua tese:
– Não podemos estar com aqueles que aprovaram a PEC da Morte do Temer e o pacotaço do Sartori!
Vai ter Valter
E, provavelmente, 'Vai ter Valter', como enunciava uma das peças criadas pelo marqueteiro Carlos Athanazio no 'primeiro turno'.
O candidato a prefeito deve ser novamente Valter Amaral, que admite apenas que colocou o nome à disposição. O que a presidenta Adelaide Klein, que foi vice mas por decisão pessoal não será candidata na nova eleição de 12 de março, praticamente confirma:
– É o natural, mas por enquanto definimos apenas a candidatura própria. Nomes decidiremos daqui para frente.
DB, o candidato de sempre
Longe do anonimato e para além da derrocada nacional do PT, Valter e Adelaide tem uma mesma leitura para o ‘golpe das urnas’ sofrido pelo partido também na aldeia no 2 de outubro.
– Tivemos que construir uma candidatura em cima da hora. Eu nunca tinha sido nem cogitado como candidato a prefeito – lembra o representante do partido que já teve cinco vereadores em uma única legislatura e nesta eleição não chegou nem perto de eleger um parlamentar sequer.
– Há quatro anos tínhamos o candidato, que saiu no último dia, e levando boa parte da nominata à Câmara – concorda a comandante petista, se referindo a Daniel Bordignon e sua filiação ao PDT no último dia da janela de maio para trocas partidárias.
– Enquanto os outros já faziam campanha, estávamos correndo atrás de candidatos a vereador – lamenta, apontando ainda para a falta de recursos, também uma novidade após os milhões de reais gastos em campanhas nos últimos 20 anos.
– Vimos mais uma vez campanhas muito ricas. A nossa só foi abundante em criatividade e alegria.
Compa Vinícius, o divã e a esperança
Adelaide e Valter antecipam que o PT, ainda o maior partido de esquerda do país, se apresentará como a única alternativa ao triunvirato de governos do PMDB: Marco Alba, Sartori e Temer.
– As pessoas estão comparando. Já ouvi de muitos que as políticas da Rita, do Tarso e da Dilma não estavam tão erradas – argumenta Adelaide, falando apenas em Rita, não nas administrações de Bordignon e Stasinski.
– As eleições de outubro ocorreram no auge da criminalização do PT pela mídia. Hoje estamos vendo que outros partidos estão nas listas da Lava Jato – compara Valter, alertando para as impopularidades recordes de Sartori e Temer.
– Partidos com candidaturas em Gravataí, como o PMDB, o PDT e o PSB, com o voto majoritário de suas bancadas tem aprovado a retirada de direitos dos trabalhadores, o fechamento de estatais e a venda de patrimônio público.
– O PT, com a autocrítica necessária, ainda é o partido com os programas sociais que mais deram certo, aquele que governa para os trabalhadores, o mais sensível às necessidades dos que mais precisam da mão do estado – discursa, usando como um dos exemplos o novo salário mínimo, “após anos, achatado e sem ganho real”.
E, de autocrítica, Valter entende. Psicanalista, analisa que não só o partido, mas a sociedade precisa do divã.
– A barbárie assusta. Vemos aplausos aos que pedem volta da ditadura, pena de morte, excessos da polícia, chacinas. Não estamos sabendo conviver com as diferenças. Precisamos todos nos colocar na situação de necessitados de ajuda – diagnostica, com sua fala mansa e de palavras estudadas, o freudiano que, aos 58 anos, sabe que o sintoma que mais preocupa não é o tamanho do PT hoje, talvez menor do que no final dos anos 70, quando surgia ainda clandestino, e lhe reservou aos 18 anos, como conta um amigo, o codinome de ‘companheiro Vinícius’.
É a falta de esperança.
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