O Ministério Público Federal alerta ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que, diplomado prefeito, Daniel Bordignon (PDT) pode perder o mandato em um prazo de dois anos.
Quem assumiria a Prefeitura de Gravataí seria o vice, Cláudio Ávila.
O parecer do vice-procurador-geral eleitoral Nicolao Dino de Castro e Costa Neto, que recomenda o desprovimento do recurso eleitoral especial em que o ex-prefeito busca a validação dos 45.374 votos que recebeu em 2 de outubro, foi anexado ao processo que está desde domingo à noite nas mãos do ministro Henrique Neves.
– Na hipótese remota de provimento do recurso especial eleitoral, mesmo que viesse a ser diplomado e a tomar posse, muito provavelmente não concluiria o mandato. Com efeito, a suspensão dos direitos políticos de mandatário, a partir do trânsito em julgado de condenação por improbidade administrativa, acarreta a extinção automática do mandato – prevê o MPF.
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Impugnação e apelação
Bordignon recorre do indeferimento de sua candidatura pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE), em razão da suspensão de seus direitos políticos até 29 de setembro de 2020.
Ele foi condenado por ato de improbidade administrativa que remonta a 2005, acusado da contração irregular de mais de mil funcionários em seus mandatos como prefeito de Gravataí.
Em sua defesa, para sustentar que não há trânsito em julgado da condenação, Bordignon se agarra à aceitação, este ano, de recurso apresentado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Mas o MPF, associado à Procuradoria Regional Eleitoral e ao TRE, entende que as apelações não têm como reformar a condenação e configuram má-fé e abuso de recorrer.
'Imunidade' das urnas
– Os autos já estão conclusos para o relator ministro Napoleão Filho. Uma vez desprovidos (ou não reconhecidos), ainda seria cabível, em tese, embargos de declaração e, ato contínuo, recurso extraordinário. Este fatalmente teria seu seguimento negado, por ausência de repercussão geral. Por fim, a parte recorrente poderia ingressar com agravo interno, direcionado à Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça. Nesse contexto imaginário, ainda que o processo tramite por mais dois anos, no máximo, até a certificação formal do trânsito em julgado, mesmo assim a parte recorrente não terá tempo suficiente para concluir o mandato – adverte o vice-procurador-geral eleitoral Nicolao Dino.
– Os votos obtidos pela parte recorrente, na eleição municipal, não lhe conferem imunidade, tampouco lhe restituem os direitos políticos. Portanto, resta reconhecer o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade administrativa e manter o indeferimento do registro da candidatura – conclui o parecer, que entre decisões de atuais ministros do TSE e do Supremo Tribunal Federal (STF), cita inclusive jurisprudência do relator do processo de Bordignon, Henrique Neves.
O PARECER DO MPF
A seguir, o Seguinte: revela trechos fortes do parecer onde o MPF, além de apontar como inevitável uma cassação, fala em má-fé e abuso do poder de recorrer.
“(…)
Apesar de interposto no prazo legal (…) o recurso especial não merece prosperar.
(…)”
“(…)
O STJ afirma que a interposição de recurso manifestadamente incabível, como na hipótese da intempestividade, autoriza o reconhecimento do trânsito em julgado (…) assim, no caso concreto, por serem intempestivos os primeiros embargos de declaração (…) era devido o reconhecimento do trânsito em julgado do aresto inadequadamente embargado, como consectário lógico do fenômeno da preclusão.
(…)”
“(…)
A respeito do trânsito em julgado da condenação, o TRE assim se manifestou por ocasião do julgamento do recurso eleitoral:
“(…)
Na realidade, o apelo ao STJ foi lançado no voto condutor de modo lateral e subsidiário, como mero reforço de argumentação (…). Por conseguinte, não há como cogitar em deficiência de motivação, mesmo porque o julgador não está obrigado a examinar, de forma pormenorizada, todas as alegações de cada uma das partes, mas apenas apresentar razões bastantes à manutenção do dispositivo.
(…)”
“(…)
No âmbito do recurso especial eleitoral, resta averiguar, em conformidade com a moldura fático-probatória delineada pelo TRE, se realmente havia condenação por ato de improbidade administrativa transitada em julgado (…) Consoante ficará demonstrado a manifesta intempestividade de embargos de declaração, afirmada em três oportunidades pelo competente órgão colegiado do Superior Tribunal de Justiça, somada à imposição de multa por abuso do direito de recorrer, permite o reconhecimento do trânsito em julgado da condenação.
(…)”
“(…)
Chama-se coisa julgada a decisão judicial de que já não caiba recurso. Em sentido análogo, denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.
(…)”
“(…)
As regras permanecem sujeitas ao filtro principiológico do ordenamento constitucional, notadamente a garantia fundamental da razoável duração do processo (…) nessa senda, o fenômeno da coisa julgada, em uma leitura moral do Direito, não pode conviver com comportamentos processuais antiéticos, a exemplo das hipóteses em que a parte abusa do direito de recorrer, por meio de sucessivas insurgências manifestadamente protelatória, como forma de retardar a execução do provimento jurisdicional.
(…)”
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A Segunda turma do STJ já havia assentado a intempestividade dos primeiros embargos de declaração (…) no julgamento dos segundo embargos, após referir que o prazo recursal tem início com a publicação do acórdão, e não com a publicação da ata de julgamento, o órgão colegiado impôs multa de 1% do valor da causa à parte recorrente, em vista do abuso do direito de recorrer (…) Na sequência, ao apreciar os terceiros embargos de declaração, o órgão colegiado majorou a multa para 10% do valor da causa, dada a reiteração da pretensão recursal de caráter procrastinatório.
(…)”
“(…)
É fato que, em decisão monocrática, admitindo embargos de divergência opostos pelo condenado, o relator, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, recusou-se a determinar a certificação do trânsito em julgado da condenação. A despeito disso, diante do pronunciamento de preclusão temporal por parte da Segunda turma do STJ, a única solução jurídica cabível, no âmbito do TRE, era reconhecer a existência de coisa julgada, com suporte na primazia da realidade.
(…)”
"(…)
Sobre a matéria, vale extrair os seguintes excertos do acórdão regional:
“(…)
A perda da função pública e a supressão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória. E, no caso concreto, é possível aferir, com prudência e segurança, o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade administrativa.
(…)”
“(…)
O abuso de recorrer, lastreado em tese contrária a entendimento jurisprudencial consolidado, constitui hipótese expressa de litigância de má-fé aquele que interpõe recurso com o intuito manifestadamente protelatório (…) Para além dos embargos de declaração intempestivos, a parte opôs dois outros embargos de declaração e, adiante, também embargos de divergência.
(…)”
“(…)
O condenado insiste em fazer valer a pretensão contrária à jurisprudência pacífica no Superior Tribunal de Justiça, o qual tem por iniciado o prazo recursal a partir da publicação da decisão impugnada, independentemente de haver posterior publicação da ata da sessão de julgamento (…) Justamente por isso, o órgão colegiado competente aplicou-lhe multa de 10% do valor da causa.
(…)”
“(…)
Recentemente (…) interpretando a Súmula 401 o STJ firmou entendimento no sentido de que o prazo decadencial da ação rescisória tem início quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial, ainda que intempestivo, salvo na hipótese de má-fé da parte recorrente (…) Obviamente, uma vez constatada a má-fé do litigante, com a imposição de multa, deve ser reconhecido o trânsito em julgado jurisdicional.
(…)”
"(…)
A respeito do tema, assim tem se pronunciado o Tribunal Superior Eleitoral:
“(…)
Como regra, a coisa julgada somente se forma a partir do momento em que a última decisão prolatada se torna irrecorrível, ainda que a discussão remanescente seja sobre a intempestividade de determinado recurso anterior. Sob essa premissa o STJ asseverou que a discussão da intempestividade de apelação, no âmbito de recurso especial dirigido ao STJ, impedia o reconhecimento do trânsito em julgado de condenação por ato de improbidade administrativa. Excepcionalmente, contudo, na hipótese de má-fé da parte recorrente, lastreada no abuso do poder de recorrer, a coisa julgada deve ser confirmada a partir do momento em que operada a preclusão, por recursos manifestadamente incabível (preclusão consumativa) ou por recurso intempestivo (preclusão temporal).
(…)"
"(…)
Nesse sentido, alinhado à jurisprudência uníssona e iterativa do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior Eleitoral assim tem se manifestado:
“(…) Nos autos (…) diferentemente do caso em apreço, o órgão colegiado competente para o julgamento do recurso especial não havia emitido juízo de valor sobre o abuso do direito de recorrer. Logo, esses precedentes não autorizam o provimento da presente irresignação, precisamente porque o STJ impôs multa à parte recorrente, em função da oposição de sucessivos embargos de declaração manifestadamente incabíveis.
(…)”
"(…)
Nesse ponto, de igual modo, faz-se oportuno citar os seguintes trechos do acórdão regional:
“(…)
A parte recorrente, apesar de ter obtido o maior número de votos no pleito para o cargo de prefeito, não está em pleno exercício dos seus direitos políticos, faltando-lhe uma das condições de elegibilidade.
(…)”
“(…)
Na hipótese remota de provimento do recurso especial eleitoral, mesmo que viesse a ser diplomada e a tomar posse, muito provavelmente não concluiria o mandato. Com efeito, a suspensão dos direitos políticos de mandatário, a partir do trânsito em julgado de condenação por improbidade administrativa, acarreta a extinção automática do mandato.
(…)”
“(…)
Os autos já estão conclusos para o relator ministro Napoleão Filho. Uma vez desprovidos (ou não reconhecidos), ainda seria cabível, em tese, embargos de declaração e, ato contínuo, recurso extraordinário. Este fatalmente teria seu seguimento negado, por ausência de repercussão geral (…) Por fim, a parte recorrente poderia ingressar com agravo interno, direcionado à Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça. Nesse contexto imaginário, ainda que o processo tramite por mais dois anos, no máximo, até a certificação formal do trânsito em julgado, mesmo assim a parte recorrente não terá tempo suficiente para concluir o mandato.
(…)”
“(…)Os votos obtidos pela parte recorrente, na eleição municipal, não lhe conferem imunidade, tampouco lhe restituem os direitos políticos. Portanto, resta reconhecer o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade administrativa e manter o indeferimento do registro da candidatura.
(…)”
“(…)
Ademais, cabe reiterar que o acórdão regional limitou-se a proceder ao enquadramento jurídico, para fins de registro de candidatura, preclusão temporal devidamente assentada pela Segunda turma do Superior Tribunal de Justiça. Assim, não se está aqui a discutir a alegada incompetência da Justiça Eleitoral para certificar o trânsito em julgado da condenação.
(…)”
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