a paeja do pt

Onde sempre estivemos

Bastou abrir a portinha da associação comunitária do Bonsucesso para Paulo Bairros, com um sorriso, intimar a reportagem:

– Não vai me fazer querer cortar os pulsos de novo, né?

O tesoureiro e pré-candidato a vereador se referia à cobertura feita pelo Seguinte: do lançamento da candidatura de Valter Amaral a prefeito, onde as dificuldades políticas e financeiras do partido em Gratavaí foram desveladas.

 

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Na noite congelante de sexta, os petistas promoviam a segunda atividade coletiva de campanha, a paeja campeira da resistência.

– Durante a semana paramos de vender convites. Lotou! – comemorava Alex Borba, apontando para as duzentas e poucas pessoas que se acomodavam nas compridas mesas de madeira e eram abraçadas uma a uma por Valter e a esposa Lu.

Ex-secretário da Fazenda da primeira administração do PT na aldeia e homem forte do governo de Rita Sanco, era Alex que, em frente a uma mesinha, recolhia os convites e cobrava os companheiros que deixaram para acertar na hora os ingressos que iam de R$ 20 a R$ 50.

– Nos subestimaram, acharam que a gente estava morto. Vamos para a peleia! – alguém batia forte no ombro do economista.

 

: Lu, companheira de Valter Amaral, e Alex Borba dos Santos

 

Ao fundo, ao som de músicas que embalaram campanhas nacionais do PT, era promovido um leilão de peças doadas por simpatizantes, como almofadas, livros e canecas, para arrecadar fundos para a campanha.

– Ouvi 100? 130 reais ali do deputado – era batido o martelo, com um lance do deputado estadual Tarcísio Zimmermann, que já tinha participado do primeiro ato político, no mês passado, e era uma das estrelas do salão ao lado do colega de Assembleia Nelsinho Metalúrgico e do ex-ministro Miguel Rossetto.

 

: Ex-prefeita Rita Sanco no leilão com Paulo Bairros

 

– Tá bonita a decoração hoje? Ou os balões estão muito vazios e as bandeiras surradas? – brincou com a reportagem Caroline Duarte, também se referindo à matéria anterior sobre a festa no CTG Aldeia dos Anjos.

Correndo há mais de quatro hora para preparar o evento ao lado de Rita Sanco, Vera Quintana anunciava que iria enfrentar um cigarrinho no frio:

– Vou nebulizar – ria.

 

: Vera Quintana e Tiago Silveira, autor das fotos que ilustram a reportagem

 

Lá fora estava Tiago Silveira, com a máquina fotográfica no pescoço, arrumando trapos numa caixa de papelão para acomodar um cãozinho que tremia ao minuano.

 

: Cãozinho foi aconchegado do frio na noite congelante de sexta

 

– Pessoal das primeiras quatro mesas, da copa para o salão, podem levantar e servir – era o anúncio de que a janta seria servida.

Em frente ao panelão, devidamente indumentado, Frank Volcano, 63 anos e chef desde os 20, desenhava a paeja campeira que adaptou da dieta original valenciana, apresentada por amigos espanhóis lá no primeiro Fórum Social Mundial.

– Minha paeja é um carreteiro balaqueiro – divertia-se.

Como um xamã, revirando ingredientes na mandala, evocava energias em sabores, cores e palavras:

– A comida é só o meio para reunir aqueles que sonham a mesma utopia. Num tempo sofrido e dolorido para os que estão aqui, criamos um sentimento de pertencimento, de que não estamos nós.

– E não confraternizamos em grandes hotéis, mas numa associação de bairro, saboreando um prato coletivo. Uma pajelança, sob o fogo purificador – fazia poesia, inspirado no momento de estresse vivido por petistas de quaisquer costados.

 

 

Ao fim dos discursos, que apresentaremos a seguir e onde ninguém escondia a mágoa com a saída do ex-prefeito Daniel Bordignon do partido, um diálogo resumia o espírito do PT de Gravataí, hoje:

– Isso parece aquelas reuniões que fazíamos nos anos 80 – comentava Célia Caregnato, companheira do sociólogo Roberto Garcia, responsável pelas pesquisas eleitorais feitas pelo partido há mais de 20 anos.

– No aniversário do Olívio Dutra sentimos a mesma coisa – concordava Gerson Ataíde, o Jacaré, assessor do deputado federal Elvino Bohn Gass, que acompanhava Miguel Rossetto.

– É aquela sensação de acampamento que vivíamos na época – resumiu Mana, companheira do publicitário Carlos Athanázio, que será o marqueteiro da campanha, e degustava um vinho ao lado do empresário e jornalista Roberto Gomes de Gomes, do Seguinte:

 

: Célia e Jacaré lembraram semelhanças com as atividades do PT logo após a fundação, nos anos 80

 

Discursos, diretas & indiretas

 

1.

Mestre de cerimônias, Paulo Bairros já na apresentação lembrou Bordignon:

– O PT nunca teve unanimidade como agora, nem quando tínhamos o candidato a prefeito de sempre.

 

: Nelsinho Metalúrgico com a poetisa e pré-candidata a vereadora Isab-El Cristina

 

2.

– Gravataí tem a marca do PT, um símbolo que não pertence a ninguém. Muitos não honraram nosso partido e todo um legado de transformações. Nós somos a resistência – bradou o deputado estadual Nelsinho Metalúrgico, abrindo os aplausos.

 

: Tarcísio Zimmermann abraça o candidato a prefeito Valter Amaral

 

3.

– Só gente de muita coragem para estar aqui, com disposição para manter vivo um sonho, num momento em que a esquerda sofre os mais odiosos ataques em todos os tempos – discursou o deputado estadual Tarcísio Zimmermann, ex-prefeito de Novo Hamburgo.

 

: Miguel Rossetto com o presidente do PT de Gravataí José João de Mello

 

4.

Ex-vice governador de Olívio Dutra, ex-deputado federal e ministro de Dilma Rousseff, Miguel Rossetto, alertou para “tempos de guerra” em todo mundo, e onde forças conservadores estão ocupando os principais assentos na geopolítica.

– Vemos um golpe militar debelado na Turquia, como recém vimos o Brexit, onde os ingleses saíram da União Européia pelos piores motivos, que são a xenofobia e o ultranacionalismo, além de governos desestabilizados na América Latina por um neoliberalismo que impõe sacrifício aos povos.

– No Brasil sofremos um golpe parlamentar. O golpe contra Dilma não é pelo que deixamos de fazer, mas pelo que fizemos, que foi garantir a oportunidade da casa própria, das famílias terem um universitário.

Para Rossetto, “o golpe não for barrado”, o receituário de um governo Michel Temer será “a destruição do SUS, da Previdência Social, das leis trabalhistas e do salário mínimo”.

Rossetto também falou sobre a desfiliação de Bordignon, que foi para o PDT concorrer a prefeito e levou pré-candidatos a vereador para o partido:

– Bordignon e os outros tem que explicar o porquê que terem saído do PT, não nós.

– Nós estamos onde sempre estivemos.

 

5.

Nas conversas entre mesas, Rossetto descreveu a saída de Bordignon como a maior perda do PT no Rio Grande do Sul.

Ele disse que o apoio da direção estadual seria total para uma candidatura de Bordignon pelo PT.

– Era a eleição mais viável a uma prefeitura.

: Mesmo com citações poéticas, Valter Amaral subiu um pouco o tom do discurso

 

6.

Valter Amaral subiu para um tom médio nesta segunda atividade coletiva da campanha. Claramente também se referiu a Bordignon, a quem tratou como “essa pessoa”:

– Essa pessoa que sempre exigia ser o candidato exclusivo, que sempre se achava melhor que os outros, ao sair permitiu uma transformação na vida do partido aqui em Gravataí. A luta é difícil, mas todas as forças hoje são valorizadas. Voltamos a sorrir!

– Quem ficou não pensou só em si.

Sempre poético nos discurso, o professor descreveu “a resistência” como “uma muralha de sonhos e margaridas”.

– Só nós podemos despertar a senzala e barrar a reconstrução da casa grande.

Ele parafraseou o poema O Açúcar, de Ferreira Gullar:

– O que nos une? O que nos faz estar juntos? Quem produz esse açúcar que adoça o nosso café numa manhã linda?  Enquanto fizermos essa pergunta, estaremos preocupados em representar aqueles que têm a vida extraviada pelo capitalismo.

– Em 516 anos não fizeram pelo povo, vão fazer agora?

Valter encerrou chamando à responsabilidade os militantes para engrossarem a nominata de pré-candidatos à Câmara, para tentar a eleição de pelo menos um vereador.

– Não há mudanças que venham de cima, no país, no estado ou na cidade, e nem de cúpulas partidárias. Nós temos que ser sujeitos das mudanças.

 

: Pré-candidatos a vereador chamados à frente e militantes convocados a reforçar a nominata

 

7.

Valter reafirmou que, mesmo com a proximidade nacional entre o PT e o PDT na “denúncia do golpe”, não há chance de abrir mão da candidatura para apoiar Bordignon.

– Não coligaremos com nenhum partido da base do governo Sartori e nem com apoiadores do golpe contra a prefeita Rita Sanco.

Para quem não sabe, o PDT integra o governo Sartori e Bordignon tem como vice Cláudio Ávila, mentor do impeachment de Rita ao lado de Marco Monteiro, com seu Solidariedade também participante da coligação que apóia o ex-prefeito.

 

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