– O Dr. Levi e a Anabel vão estar juntos. Vão ganhar a eleição! – espalhavam, aparentemente em tom de brincadeira, vereadores da oposição no cafezinho da sessão de quinta na Câmara de Gravataí.
– É sério isso? – questionavam preocupados apoiadores da reeleição do prefeito Marco Alba (PMDB) e da candidatura de Daniel Bordignon (PDT).
– No que depender de nós, não há problema – incendiava, sorrindo, Fred Pinho (PSDB), filho do vice-prefeito Francisco Pinho, que saiu do governo e abriu apoio para Anabel Lorenzi (PSB).
Na sexta-feira, a fofoca ganhou ares de verdade e varreu o mundo político da aldeia.
– A Anabel e o Levi estão reunidos agora – uma fonte ligava para contar, próximo ao meio dia.
Durante as horas seguintes, muitos diziam saber de diferentes detalhes do suposto encontro, até o que os dois estavam vestindo.
A expectativa de uma notícia bomba anoiteceu até que, na primeira fala do ato político promovido pelo PSB no CTG Aldeia dos Anjos, a presidente do PEN, Cristina Stumpf, ao saudar os políticos no palco, singelamente acabou com o suspense:
– Aqui Beto Pereira, nosso candidato a vice!
Com a paciência e experiência de seus 64 anos, e o jeitão boa praça, o empresário do ramo dos transportes e vereador do PSDB, que já tinha avisado que não concorreria à reeleição, conseguiu o que queria desde quando ainda estava na base do governo.
– Assumo com orgulho essa responsabilidade e vamos olhar para frente, que história é para livro – disse, para um salão lotado.
– É um dia marcante para mim, hoje meu pai completaria 89 anos – emocionou-se, lembrando do motorista de ônibus Normélio, enquanto era abraçado por Anabel, o deputado federal José Stédile (PSB), o deputado estadual Miki Breier (PSB), o presidente estadual e vice nacional do PSB Beto Albuquerque, o deputado federal e secretário estadual de Minas e Energia Lucas Redecker (PSDB), o presidente estadual do PEN Elias Vidal, os presidentes municipais do PSB, Luis Stumpf, do PTN, Sérgio Gonçalves, e do PEN, Cristina Stumpf, os vereadores Carlos Fonseca (PSB), Paulo Silveira (PSB), Carlito Nicolait (PSB) e Fred.
Além de Pinho, o animador da noite ao microfone, descrito por Elias Vidal como o “engenheiro político” da aliança.
– Eu poderia ter concorrido a prefeito ou a vice. Mas queremos ganhar a eleição. Tentariam me impugnar dizendo que eu era bi-vice. Não queria atrapalhar a Anabel.
– Para o Beto nunca tinha prometido nada e mesmo assim os maldosos de plantão diziam que eu iria sacaneá-lo. Aí está ele, candidato a vice.
E, empolgado como um guri, concluiu repetindo o que diz a quem encontra pela frente:
– Para mim é difícil não concorrer a nada. Há 25 anos participo de eleição após eleição, e ganhei todas. Gravem: vamos ganhar de novo!
Enquanto as falas transcorriam por mais de duas horas em metro acima, a suposta conversa entre Levi e Anabel seguia comentada na planície e nos celulares.
– O Levi não abre mão de concorrer de jeito nenhum – era a explicação que uns passavam aos outros, ao pé do ouvido.
– E a Anabel também não abre mão de ser candidata, ainda mais agora com o tamanho que pegou com a turma do Pinho – argumentavam outros.
– Bah, mas se estivessem juntos não tinha para o Marco e para o Bordignon! – concordavam todos.
Quando as bandeiras levantaram para ouvi-la, Anabel evitou polêmicas com os adversários. Mas, para bons entendedores, poupou Levi, e até Bordignon, candidaturas também de oposição. E mirou em Marco.
– Nosso movimento Melhora Gravataí, onde buscamos sugestões das pessoas para nosso plano de governo, é um sinal de que, eleitos, vamos continuar buscando a participação popular, não viraremos as costas à cidade.
– Vamos cuidar da cidade e cuidar das pessoas do primeiro ao último dia. Não vamos lembrar que o povo existe apenas a três meses da eleição, aparecendo todo dia nos jornais com soluções e promessas mirabolantes – disse numa alusão ao slogan que tem sido repetido por Marco e apoiadores, de “cuidar das pessoas”.
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O Seguinte: traz outras impressões da noite
1.
Observando seu entorno, Anabel parece uma alienígena quando a crise política nacional ganha os microfones. Ela é notória crítica ao impeachment da presidente Dilma Rousseff, enquanto Stédile, Beto Albuquerque e Redecker, por exemplo, fizeram discursos febris, falando em “quadrilha que assaltou a nação”, “mentira que ganhou as eleições” e “mudar Gravataí como estamos mudando o Brasil”, para ficar só nos ‘elogios’.
No encerramento de sua fala, Anabel mostrou que já tem discurso pronto para evitar constrangimentos durante a campanha:
– Estamos aqui para cuidar da nossa cidade, para propor soluções aos problemas que todos conhecemos em Gravataí. Do Brasil cuidem os que ocupam espaços onde tem influência para isso.
– O eleitor está cheio da velha política das brigas e enganações.
2.
Miki Breier tem uma história ao lado de Anabel. Foram casados, tem filhos, e caminham juntos até hoje na política. Ninguém melhor para desmistificar a característica de intransigência que adversários tentam colar em Anabel.
– Muitos confundem com teimosia, mas a Anabel é uma mulher de convicções e de muita perseverança.
– Anabel une a leveza de quem sonha, com a força para liderar.
Muita gente riu, entendendo como uma confidência de ex-amantes e bons amigos, mas a fala de Miki alerta para como as mulheres são maltratadas na política. Herança da sociedade patriarcal, machista, que chama o homem de “firme, determinado e preparado” e a mulher de “teimosa, histérica ou com pouca habilidade para o trato político”.
3.
Miki também poupou Levi, que nunca governou Gravataí, mas deu uma provocadinha em Marco e Bordignon:
– Não é preciso falar mal dos outros. Os projetos deles estão morrendo sozinhos. Pelo que fizeram ou deixaram de fazer.
4.
Stédile, depois de alertar para o risco de muitos votos nulos em 2016, arrancou risos constrangidos ao comparar sua primeira eleição como prefeito de Cachoeirinha, em 2000, com os dias de hoje:
– Eu estava no PT e dizia para os eleitores olharem para o governo de Gravataí (o primeiro de Bordignon), que asfaltava ruas, fazia obras. Fui eleito.
– Hoje a gente não teria como dizer isso. Gravataí ficou para trás. Lá em Cachoeirinha, de 890 ruas, só faltam asfaltar 13.
5.
– Não podemos deixar o outro voltar ou esse continuar. Gravataí precisa de mudança. Temos que mostrar ao eleitor que somos de confiança para virar esse pessimismo todo com a política – disse Beto Albuquerque, se referindo a Bordignon e Marco.
– Depois de tantos escândalos e enganações, a mentira está começando a ter perna curta na política.
Batendo forte no PT de Dilma, mas poupando o PMDB de Temer, Beto fez lembrar o prefeito Marco Alba, em trecho de seu discurso:
– Ninguém em casa gasta mais do que ganha. O Brasil quebrou, o Rio Grande do Sul faliu e não paga mais nem salários em dia, culpa de uma cultura de irresponsabilidade com o dinheiro público.
6.
– Não aguentava mais aquele discurso de pagar dívidas! – desabafou Fred Pinho, sobre a época em que estava na base de apoio do prefeito.
– Nosso governo será para todos, não para um grupo restrito – disse o vereador mais jovem do Brasil, que na base do governo cobrava muito internamente o suposto privilégio a outros vereadores próximos ao prefeito.
7.
O vereador Paulo Silveira, apesar de lembrar jingle antigo de Anabel, “eles querem brigar, nós queremos trabalhar”, não deixou de cutucar Marco e Bordignon.
– Hoje a Prefeitura é uma ilha, cheia de donos, onde cada um governa para os seus.
– E, ao contrário de outras, a candidatura de Anabel não precisa esperar pelos juízes. Já é campeã.
8.
Carlos Fonseca também atacou as suspeitas de sempre sobre a situação jurídica da candidatura de Bordignon:
– Anabel não tem que sair pela cidade dizendo se é ou não candidata. Ela é ficha limpa.
9.
Carlito Nicolait lembrou sua história de 32 anos no PT, onde disse perceber a decadência gradual dos governos, até sair do partido.
– Anabel tem tudo para devolver esperança às pessoas, recuperar a auto-estima de quem mora em Gravataí.
– Hoje temos um prefeito encastelado, que governa de costas para a cidade.
10.
Francisco Pinho foi um show a parte. Pagava um pedágio no microfone a cada vez que apresentava o discurso de uma liderança. Com sua voz característica, alta, buscava empolgar os pré-candidatos, suas famílias e apoiadores.
– Se vocês não pedirem votos para o vizinho do lado, alguém vai pedir – ensinou.
– E tem que pedir para prefeita também. Quase sempre fui oposição e sempre digo que vereador que não tem o prefeito do lado só faz de conta que é vereador, porque consegue fazer quase nada.
11.
Pinho também arrancou risos ao apelar para Anabel para que ouça o vice, Beto Pereira.
– Como vice, não fui ouvido pelo prefeito. Queria ter ajudado mais. Aqui em Gravataí sempre tivemos esse problema. Tanto que teve quem precisou se mandar para Cachoeirinha – brincou, se referindo a Miki Breier, que foi vice de Bordignon, entre 1997 e 2000, e hoje é candidato a prefeito de Cachoeirinha.
12.
Pinho também elogiou a postura de seus apoiadores que tinham cargos na Prefeitura e saíram juntos com ele.
– Ninguém ficou pendurado nos empregos.
– E 99,9% dos pré-candidatos a vereador não queriam apoiar o prefeito.
13.
Como tem acontecido com outros partidos, ao final do encontro era pedido que todos devolvessem suas bandeiras, para serem reutilizadas em futuras atividades.
Essa campanha será de dinheiro curto no caixa 1.
14.
Sobre uma parceria entre Anabel e Levi, parece não ter passado de uma lâmpada incandescente, como as que saíram do mercado na sexta, 1º de julho.
À tarde Levi estava sob os holofotes batendo fotos para campanha, ao lado do vice Alemão da Kipão (PSD).
Se tudo não passou de fofoca, escondamo-nos em Quintana:
– A mentira é uma verdade que deixou de acontecer.