Em mais um dos perfis dos vereadores eleitos, o SEGUINTE: apresenta Maribel Rocha. Única mulher da atual legislatura, ela é do ‘partido do otimismo’.
Sentimento raro para ela, mas Maribel estava triste ao fim do primeiro dia de trabalho na Casa do Idoso.
– Não gostam de mim. Parece que falam em código. E de propósito. Acho que não é meu lugar – desabafou ao marido Idson, comentando a recepção que tivera, naquela manhã de janeiro de 2009, por parte da equipe que comandaria por indicação da prefeita Rita Sanco (PT).
– Tu és uma guerreira, nunca desistiu de nada. Tu vai conseguir. Amanhã tu resolverás isso – foi resposta que ouviu de seu maior incentivador na vida pública.
No dia seguinte, Maribel chamou a equipe e foi sincera:
– Estou me sentindo um peixe fora d´água. Sou comerciante, o que sei fazer é ganhar dinheiro. E para ganhar dinheiro, o que faço é trabalhar e trabalhar, sete dias por semana. Então, dedicação minha não vai faltar. Só quero que me digam quando estou errada, porque não vou errar mais.
Simples, extrovertida e, principalmente, uma trabalhadora obsessiva, Maribel conquistou seu lugar e, junto à equipe técnica, fez uma revolução no atendimento à terceira idade.
– Aumentamos os atendimentos de pouco mais de 100 para mais de mil – orgulha-se.
Quem testemunha é a assistente social Vera Peixoto, que na época era estagiária e foi uma das técnicas que firmou o pacto com a chefia. Ela viu Maribel ser eleita vereadora em 2012, na última vaga, com 851 votos, se formar em Gestão Pública em 2013 e a acompanha até hoje, agora como assessora, amiga e confidente.
– Tínhamos uma equipe multidisciplinar, cada um na sua, que atendia os idosos, havia histórico de saúde e medicação de cada paciente e, o mais importante, se promoveu a aproximação dos cuidadores e das famílias.
– Com muita franqueza, olho no olho, ela ganhou o respeito de todos – recorda a hoje “amiga de outras vidas”.
: No Chef na Cozinha, com a "amiga de outras vidas" Vera (à esquerda) e a filha Morgana
O cachorro e o dono
A fé no trabalho e o otimismo acompanham Maribel desde que, aos 21 anos, ao lado do marido, deixou a roça para fazer a vida na cidade. E transformou um pequeno boteco em seu primeiro mercado.
– Aí não entra nem cachorro… – uma vizinha ainda desconhecida alertou, ao observá-la arrumando a pequena peça.
– Espera para ver: vai entrar o dono e o cachorro também! – respondeu.
Sorrindo.
– Posso estar estressada ou triste, mas deixo isso dentro de casa. Nessa vida, sempre que atendo alguém, vou com um sorriso no rosto – orgulha-se.
– É preciso valorizar o lado bom das pessoas. Alegria atrai alegria. Alto astral contagia as pessoas.
: Casal que se conheceu 'na roça' construiu família e uma vida de muito trabalho e cumplicidade
Carta ao prefeito
Esse jeito de lidar com a vida foi fazendo de Maribel uma líder comunitária na Vila União. Seu comércio teve um dos primeiros telefones do bairro e se tornou ponto de referência. Dos problemas em comum, sabia todos.
– Tu tens que ser política! – ouvia sempre dos clientes do mercado, muitos sem saber que ela já tinha a política no DNA da família: um primo, uma prima e um tio já tinham sido prefeito e vereadores de Praia Grande, outra prima tinha sido parlamentar em Terra de Areia e um irmão também foi eleito para a Câmara de Mampituba.
Quando ia reivindicar algo pelo bairro, Maribel fazia do seu jeito: a política da boa vizinhança.
– Um dia mandei uma carta linda para o prefeito Sérgio Stasinski falando dos problemas nas ruas do bairro. Ele nos ajudou – exemplifica a agitadora, que em anos anteriores também já tinha reunido vizinhos e comerciantes para reuniões com os prefeitos Edir Oliveira e Daniel Bordignon – este um dos incentivadores para Maribel concorrer novamente após uma primeira tentativa frustrada em 2004, quando fez 622 votos pelo PV.
– Sempre digo: gritos e xingamentos não ajudam em nada – ensina a instintiva ariana.
Mulher independente
Maribel não mudou o comportamento – ou tática – depois de eleita. Não apoiou Marco Alba (PMDB) na eleição, mas hoje faz parte da base do governo e tem com o prefeito uma ótima relação.
– Projetos bons para a cidade, eu votei a favor. Projetos que considerei ruins, como aqueles que mexiam com o funcionalismo, eu votei contra.
Não se sabe de nenhuma cobrança do prefeito em relação aos votos.
– Ele foi muito compreensivo, até porque nunca prometi nada além do que não poderia cumprir – confidencia.
Meninos…
Maribel também não gosta do debate político mais pesado que é travado nas sessões da Câmara. É raro ouvir sua voz, o que até surpreende quem conhece a mulher agitada e brincalhona de fora do plenário.
– Se eu vejo uma briga eu já digo: meninos, vamos parar.
Ela diz sofrer muito quando escuta críticas à ex-prefeita Rita Sanco, “uma pessoa muito íntegra”, de quem ficou ao lado até a cassação de 2011, que considera “uma injustiça”.
– Outra coisa que não gosto é de muita reunião. Gosto de resolver, não de jogar conversa fora.
: No plenário da Câmara, Maribel, sempre de alto astral, chama a atenção dos 'meninos brigões'
Caiu na Rede
Longe de ser uma entusiasta da doutrina comunista, em todas as decisões (inclusive a participação no governo), Maribel sempre andou de mãos dadas com seu PCdoB. Até não concordar com a pressão da direção estadual para, às vésperas da eleição, abandonar Marco Alba e se aproximar de Daniel Bordignon.
– Não sou de falar mal. O PCdoB sempre foi um partido limpo. Mas acho que as pessoas votam em pessoas, não em partidos – explica.
A escolha pela Rede veio da afinidade com João Derly, o primeiro judoca brasileiro a conquistar medalha de ouro em um mundial, que ela ajudou a ser eleito deputado federal.
– Ele já tinha saído do PCdoB e sempre me convidava para construirmos a Rede juntos – confidencia Maribel, que mostrou coragem ao optar por um partido ainda insipiente em Gravataí.
A corrida agora é para montar uma nominata de pré-candidatos – e necessárias coligações – que possibilite atingir o cociente eleitoral mínimo para garantir a eleição de pelo menos uma cadeira na Câmara.
: A recepção de Maribel na Rede ao lado do ídolo do esporte e deputado federal João Derly
Mulher e facão
Única eleita na atual legislatura, Maribel ainda vê preconceito em relação às mulheres na política:
– Para a mulher sempre é mais difícil ser respeitada. É um mundo machista.
Destemida, e sem deixar de entrar em vilas ou botecos durante a campanha, ela conta que chegou a ser ameaçada com um facão por um homem na Planaltina.
– Quando contei minha história, ele até pediu meu santinho. Mas será que a reação seria a mesma se fosse um homem? – questiona.
– Além de tudo, as mulheres quase sempre precisam resolver tudo nas famílias, para depois sair de casa. Não é fácil dar conta – diz a vereadora, que só franze a testa se alguém troca seu nome de Maribel para Anabel Lorenzi, a quem apoiou para prefeita em 2012.
– Independentemente de ser mulher, cada um de nós tem sua história.
Um pouco da história – e das histórias – da Maribel:
Maribel da Rocha Wagner nasceu em Passo de Torres, em 14 de abril de 1959, filha dos agricultores Artur e Adélia e irmã de Fábio, Osni, Venoir, Claudionor, Zélia e Miriam.
– Alguém pode até ter sido tão feliz quanto eu, mas uma infância mais feliz ninguém teve!
Quando não estava frequentando as aulas na escola estadual Bulcão Viana, a guria da roça nadava, andava a cavalo pelos campos, jogava futebol, caía de árvores e até brincava de artista nos circos que a família cedia espaço para se instalarem na fazenda.
– Fazia vezes de ginasta, malabarista e até trapezista – diverte-se, lembrando as artes da linda menina da direita na foto abaixo.
Uma das coisas que mais gostava era acompanhar o pai em serestas de gaita, em casa ou pela vizinhança.
– Ele era uma pessoa muito especial, muito feliz. O que tinha, dividia com os outros – emociona-se.
– Eu sou muito assim: gosto de tudo, estou sempre bem-humorada.
Aos 19 anos casou com Idson, vizinho da Praia Grande, catarinense do outro lado do Rio Mampituba, que conheceu numa das tantas festas de igreja frequentadas pela família.
Os ‘catarinas’
Dois anos depois, o casal deixou a roça e abriu o mercado Pacotão, na parada 49 de Cachoeirinha, no lugar onde antes funcionava um pequeno bar de balcão.
– Ninguém dava nada pela gente, mas logo já estavam dizendo: “esses catarinas vem para cá e sabem ganhar dinheiro” – diverte-se.
– E é verdade: não vejo um se dar mal. Mas o segredo é a vontade de trabalhar. Atendia de segunda a segunda, das 6h às 22h. Sempre arrumando aqui, limpando ali, e oferecendo o que tinha de melhor para o cliente.
Maribel teve ainda dois outros mercados em Cachoeirinha, até investir em Gravataí. O marido achou um ponto barato e chegou em casa alertando que ela poderia não gostar, porque a Vila União tinha poucos moradores à época.
– Eu disse para ele que o bairro ia crescer e todo mundo ia comprar com a gente.
As andorinhas voltaram
A emoção toma conta de Maribel ao contar como tomou a decisão de concorrer novamente em 2012. Era 2011, em meio às turbulências da cassação da prefeita Rita Sanco, quando ela foi participar de um baile promovido pela Casa do Idoso. Ao chegar, uma gaita de 120 baixos igual à do pai soava “as andorinhas voltaram, e eu também voltei…” música que ouvia-o tocar com a prima Beatriz, ambos falecidos há pouco tempo, ela num acidente automobilístico.
– Eu estava ali, num lugar onde queria estar, e me lembrei dela, que fazia política para ajudar os pobres, não porque precisava. Eu me sentia como ela.
Enxugando as lágrimas, Maribel conta que não adiantou uma irmã vir de Mampituba aconselhá-la a não concorrer.
– É que o pai já tinha jogado muito dinheiro fora na política – explica.
– Só que quando ela viu todo mundo me abanando e me pedindo para ser candidata, disse “não está mais aqui quem falou!”.
O mercado Maribel vendeu há oito anos. O sucesso do ponto fez o novo proprietário manter o nome. Dos filhos Franc, Morgana e Maicon, o último “tem sangue de comerciante”, e se prepara para abrir uma fruteira.
Já Maribel, quando consegue uma folga da política, gosta de curtir os netos Tales, Stefani e Beatriz, e voltar às origens, no seu sítio em Santo Antônio da Patrulha.
– Esses dias, fui subindo, subindo, e quando me dei conta, estava lá em cima, fazendo uma poda na copa de uma árvore – ri.
: Maribel com marido, filhos e neta, é mulher presente em casa e na política
OS PRINCIPAIS PROJETOS APRESENTADOS PELA MARIBEL:
“Apresentei projetos como o que prevê nas maternidades as doulas, mulheres que dão suporte físico e emocional a outras mulheres, antes, durante e após o parto; o sistema de marcação de consultas para idosos pelo telefone; a criação do Centro de Apoio à Mobilidade Pessoas, para arrecadar materiais como cadeiras de rodas, muletas, andadores, colchões d´água e botas ortopédicas; a criação da Casa de Passagem para mulheres em situação de risco; além do Dia da Conscientização do Autismo e o Dia do Ciclista e do Ciclismo”.
UM ARREPENDIMENTO NA VIDA PÚBLICA:
“Não poder fazer tudo que gostaria pelas pessoas. A política não é tudo o que tu pensa”.
A MARIBEL PELA MARIBEL, EM UMA PALAVRA:
“Corajosa”.
OS PLANOS DA MARIBEL:
“A reeleição para vereadora. Depois, se for concorrer a outra coisa, que dirá é o futuro, que a Deus pertence”.
O QUE DIZ PARA O ELEITOR QUE NÃO ACREDITA MAIS NOS POLÍTICOS:
“É preciso saber em quem confiar”.
UM POLÍTICO ADMIRADO PELA MARIBEL:
“João Derly”.
O CANDIDATO A PREFEITO DA MARIBEL:
“Marco Alba”