perfil Paulinho da Farmácia

A chama da solidariedade

Paulinho fazendo o que mais gosta: ajudar

Em mais um dos perfis dos vereadores eleitos, o SEGUINTE: apresenta Paulinho da Farmácia. Ele viu a solidariedade transformada em votos

 

Das cinzas de uma tragédia, se construiu uma bonita história. Ver a família perder tudo em um incêndio e receber a ajuda dos vizinhos foi o que acendeu no menino de oito anos a chama da solidariedade.

– Dedico minha vida a fazer alguma coisa pelas pessoas quando elas atravessam os momentos mais difíceis – resume Paulo Remi Silveira Martins, o Paulinho da Farmácia, eleito vereador com 2.146 votos em sua primeira eleição, em 2012.

– Ajudar as pessoas é a minha cachaça! Nunca fiz algo pensando em uma retribuição. Não me passava pela cabeça ser candidato – conta o protético, hoje dono de farmácia, que em pilhas de pastas, guardadas em um armário especial para isso, coleciona dezenas de reportagens de mais de quatro décadas de ações sociais.

– Me arrepio quando olho essa… – diz ao mostrar uma edição onde aparece em uma grande foto de capa sob a manchete “Gente do bem: esse piá deu bom”.

 

O tio Zamba

 

Não apenas nas páginas dos jornais Paulinho começou a aparecer para Gravataí. Há 14 anos é voz assídua nos programas daquele que se tornou seu “amigo de cozinha” e guia na solidariedade e na política: o radialista, ex-deputado e ex-senador Sérgio Zambiasi, a quem carinhosamente chama de “Zamba”.

– Durmo pouco. Acordo às 4h, pego meu carro e vou para a rádio. Virei referência quando os ouvintes precisam de alguma coisa.

A relação com o “tio Zamba” (outra variável de tratamento usada por Paulinho) começou em 2002, quando apresentados pelo irmão Severino, que também tinha farmácia e disponibilizava medicamentos ao preço da nota para as campanhas de arrecadação feitas pelo programa para pessoas carentes.

– Nunca esqueço a primeira vez, quando levei um nebulizador, que um senhor deixou pago, para uma menina chamada Gabriela, que morava na vila Bom Jesus – conta.

– Faço isso todos os dias da minha vida. Às vezes estava à pé para fazer uma entrega e pedia os carros de vizinhos, alguns que mal conhecia. Aí a gente vê o quanto a solidariedade pode unir as pessoas.

 

: Paulinho diariamente no ar com seu mestre Sérgio Zambiasi, antes na Farroupilha, agora na Caiçara

 

A mulher gigante

 

Entre incursões em vilas dominadas por tráfico, onde é preciso pedir autorização de traficantes para entrar, e rotineiras buscas por leites especiais para crianças, cadeiras de rodas, muletas ou mesmo os remédios mais simples, há histórias que marejam os olhos de Paulinho. Como de Amanda Lentz, “a menina que não sorri” devido à síndrome de moebius, ou o drama da cozinheira Sandra Regina dos Santos, que ficou tetraplégica como consequência de um tiro que recebeu num assalto em agosto de 2011.

– Ajudo a Sandra até hoje. Recém consegui uma cadeira especial para ela – empolga-se.

Um caso que virou notícia internacional, Paulinho descobriu por acaso. Fazia compras em uma madeireira quando ouviu outro cliente perguntar sobre materiais para construir um andador.

– Ofereci ajuda para buscar a doação de um andador já pronto, mas o cara alertou que a pessoa que precisava tinha mais de dois metros!

Era Kátia D'Ávilla Rodrigues, a moradora da rua Santa Clara que sofria de gigantismo e faleceu em dezembro de 2011 aos 48 anos, quando era pesquisada sua condição de, com 2,38 metros, ser a mulher mais alta do mundo, superando no livro de recordes do Guinness a chinesa Yao Defen, de 2,34 metros.

– O sonho dela era, antes de morrer, poder andar na rua, mas não conseguia se movimentar porque tinha problemas de circulação. Conseguimos uma cadeira de rodas elétrica e um andador de titânio.

– Cada vez que eu ia lá ela me abraçava e agradecia simplesmente por poder dar uma voltinha no pátio de casa – emociona-se.

 

: Caso da 'mulher gigante' foi notícia nacional, como mostra reprodução do site G1, da Globo

 

Até o cafezinho

 

O difícil para Paulinho sempre foi fazer a solidariedade caber no bolso.

– A condição de vereador só aumentou a procura. E como não pego diárias, essas coisas… Muitas vezes fico no prejuízo, mas vivo para isso.

– E faço o serviço completo: se vou entregar uma cama hospitalar para alguém, gosto de montar, ajudar a instalar a pessoa em cima e ainda tomar um cafezinho juntos – exemplifica, agradecendo por ter a cumplicidade da esposa Carla e dos filhos Paula (25) e Eduardo (20).

– Eles sempre participam de tudo. Já perdemos juntos muitos almoços em família – diverte-se.

 

: Paulinho na sua lida solidária do dia a dia

 

O Paulinho pode!

 

Paulinho recebeu no início de 2011 o ultimato para concorrer a vereador, em almoço na casa de Zambiasi, no Morro Santa Teresa, quando o radialista concluía o mandato de senador.

– Já tinha recusado uma vez. Dessa, não escapei – brinca.

– Não entendia nada de política e não tinha contato de ninguém que eu ajudava para pedir voto – lembra.

Mas o legado de solidariedade o aproximou os eleitores.

– Saí por aí batendo de casa em casa. Em uma visita na Cohab um senhor queria nos botar para correr, dizendo que político não entrava na casa dele. Um amigo que estava comigo agradeceu, mas pediu licença para me apresentar. Quando falou “Paulinho da Farmácia”, vieram os filhos me abraçar, dizendo que eu tinha ajudado a mãe deles.

– E eu nem lembrava… – surpreende-se.

 

Só pauta boa

 

Na Câmara, Paulinho é uma referência até para os colegas, quando o assunto é uma cadeira de rodas ou um par de muletas. Não foi só uma vez que outros vereadores lhe pediram ajuda para eleitores.

De personalidade afável, não faz o tipo de vereador que participa dos debates mais acalorados na tribuna, onde costuma usar o espaço apenas para apresentar alguma ação do mandato ou fazer homenagens.

– Para mim é pauta positiva, ou não vou à tribuna. Não é da minha natureza. Acho um teatro, uma perda de tempo que não agrega, ficar horas e horas debatendo e não resolver uma situação…

Só se incomodou quando apresentou projeto mexendo nas diárias pagas para viagens de vereadores e assessores. Foi bombardeado, principalmente dentro da base do governo, até retirar a proposta.

 

: Paulinho não gosta de levar temas polêmicos para tribuna da Câmara

 

Sem maquiagem

 

Paulinho não joga com as palavras ao descrever o tipo de trabalho que faz: “assistencialismo” é a expressão que ele mesmo usa, por mais de uma vez, em meio à conversa.

– Comigo não tem maquiagem. Ajudo as pessoas porque gosto, sem interesse. E se tivesse que escolher entre a política e o trabalho assistencial, escolheria a solidariedade, que é o que me dá satisfação.

 

Um pouco da história – e das histórias – do Paulinho:

 

Nascido em 4 de maio de 1966, em Santa Rosa do Sul, distrito de Sombrio, Santa Catarina, Paulinho é filho dos agricultores Horácio e Honorina, e irmão de Manoel, Pedro, Isaurino, Severino, José, Alori, Ivan, Rosane e Antônio, que um a um foram trocando a realidade de uma vida de “plantar para comer” na roça, pela esperança de uma vida melhor na cidade.

O sonho se transformou em pesadelo aos oito anos, quando já tinha vindo há quatro com os pais para o Rio Grande do Sul: a residência onde a família morava, na rua Xavier de Carvalho, no bairro Sarandi, em Porto Alegre, foi consumida por um incêndio.

– Perdemos tudo, mas graças a Deus ninguém estava em casa, ou poderia ter acontecido uma tragédia – resigna-se.

Os pais e os irmãos, inclusive ele, estavam trabalhando.

– Era uma época difícil, onde ter carne na mesa era uma raridade. Eu trabalhava desde os sete anos.

– O menino Paulinho brincou pouco – lembra, com um meio sorriso no rosto.

Com a roupa do corpo, e muitas coisas doadas pela vizinhança, Paulinho foi morar na casa da tia Eneida, na parada 51 de Cachoeirinha, até os pais e os irmãos comprarem um terreno na parada 53 e construírem uma casa para a família.

– A mãe mora lá até hoje.

Enquanto estudava na escola estadual Liberato Salzano, Paulinho era, como ele mesmo diz, “mandalete”, no consultório do dentista Humberto Averbuch.

– Servia cafezinho, ia comprar coisas para o consultório… – recorda.

 

 

A primeira farmácia

 

Adolescente, Paulinho começou a trabalhar com o irmão protético, Antônio, e, já técnico em Contabilidade no Liberato, se formou em Prótese Dentária, na escola técnica Ernesto Dornelles. Tinha 29 anos quando ouviu de outro irmão, Severino, que tinha uma farmácia no Sarandi, a sugestão de ter seu próprio negócio.

– Abri uma farmácia na Assis Brasil, perto do hospital Cristo Redentor, mas logo precisei vender porque a dívida ficou grande. Foi quando vim para cá – explica, sentado em uma sala nos fundos da Drogamed, desde 1995 seu negócio, e seu ‘bunker da solidariedade’, na parada 61 da avenida Dorival de Oliveira.

Ali, atende ao lado da esposa, Carla.

– Ela era namorada de um ricaço e trocou por um pelado – diverte-se, lembrando o dia em que se conheceram, e Paulinho chegou de ‘furão’ no aniversário dela de 19 anos.

 

: Família está envolvida em todas as ações sociais de Paulinho

 

O caminho do meio

 

O convite de Sérgio Zambiasi para testar seu trabalho social nas urnas fez o amador Paulinho encarar já na chegada o jogo de poder da política. O PTB, partido no qual se filiou, estava dividido entre os ex-prefeitos Edir Oliveira e Abílio dos Santos. Edir queria apoiar a candidatura de Marco Alba (PMDB) a prefeito. Abílio preferia Daniel Bordignon (PT), de quem tinha inclusive a garantia de ser o candidato a vice.

– O Zamba me disse para focar na minha campanha – conta Paulinho, que seguiu à risca a dica matreira do guru que, fiel à própria regra, não deixou claro a quem apoiava e, na inauguração do comitê de Paulinho, foi embora na hora em que Marco chegava, para evitar a fotografia.

Ao fim, o PTB como partido apoiou Marco na eleição vitoriosa à Prefeitura, enquanto Abílio ficou ao lado de Bordignon na candidatura que acabou sem os votos contabilizados nas urnas devido aos pedidos de impugnação pela justiça eleitoral municipal e estadual.

– Fui sempre fiel ao governo – resume Paulinho, que na única votação importante em que não seguiu a base, foi eleito vice-presidente da Câmara ao ajudar a eleger presidente um vereador governista, Juarez Souza (PMDB), que estava rebelado contra a candidatura oficial de Beto Pereira (PP).

 

Fogo amigo

 

Paulinho diz ter sentido as chamas do ‘fogo amigo’ após a expressiva votação – 13.228 votos – na primeira eleição para deputado estadual em 2014, onde concorreu também pilhado de Zambiasi.

– Tentei de tudo, mas ficou difícil permanecer no PTB – explica.

Sem meias palavras, ele aponta o motivo de sua saída, justamente quando presidia o partido: uma articulação de Edir Oliveira para isolá-lo como único candidato a vereador. Para ser eleito, Paulinho necessitaria mais de seis mil votos, devido ao cociente eleitoral.

– Ele queria que eu não fosse eleito. Vive ainda naquela ideia antiga de não deixar ninguém crescer. Quer ser dono do partido. Como não conseguia, ia sair, levar candidatos e me deixar sozinho.

– De patinho feio eleito na primeira eleição, mesmo numa campanha no cabo da adaga eu fiz uma bela votação para deputado e tinha admiração da direção estadual. Em vez de dar apoio, afeto, começaram a me tratar mal, a querer me isolar – desabafa.

Paulinho recorda um episódio da campanha para Assembleia Legislativa que estremeceu ainda mais a relação com Edir.

– Sem me consultar, ele contratou pessoas para trabalhar para minha campanha. E todos tinham sido apoiadores do filho dele (Luciano Oliveira) para vereador.

 

: Paulinho na campanha para deputado estadual

 

Com Marco

 

A ida para o PMDB teve a bênção de Zambiasi.

– Almocei com o Zambiasi e disse que iria procurar o prefeito. Ele deu o ok e na mesma tarde eu já estava entrando no gabinete do Marco. Ele me aceitou na hora – conta, descartando qualquer possibilidade de ser candidato a vice.

– Não é minha hora ainda.

 

: Paulinho entra no PMDB de Marco com a expectativa de ser um dos puxadores de voto para o partido

 

OS PRINCIPAIS PROJETOS APRESENTADOS PELO PAULINHO:

 

“O principal projeto que apresentei, e moralizava as viagens de vereadores e assessores para congressos e cursos, não tive apoio para aprovar”.

 

UM ARREPENDIMENTO NA VIDA PÚBLICA:

 

“Sem arrependimentos. O que fiz sempre foi com amor”.

 

O PAULINHO PELO PAULINHO, EM UMA PALAVRA:

“Solidário”.

 

OS PLANOS DO PAULINHO:

“Crescer na política com uma plataforma de boas ações, para ajudar as pessoas”.

 

O QUE DIZ PARA O ELEITOR QUE NÃO ACREDITA MAIS NOS POLÍTICOS:

“Que a política pode interferir positivamente na vida das pessoas. É preciso acreditar que há bons políticos”.

 

UM POLÍTICO ADMIRADO PELO PAULINHO:

“Sérgio Zambiasi”.

 

O CANDIDATO A PREFEITO DO PAULINHO:

“Marco Alba”.

 

O SELFIE DA CAPA

Na série de perfis com os 21 vereadores eleitos, para a chamada de capa o SEGUINTE: pediu que cada um fizesse um selfie, em um lugar que considera simbólico da cidade. PAULINHO DA FARMÁCIA fez o seu botando o pé na rua.

 

: O selfie que é capa do SEGUINTE: no perfil do Paulinho.

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