CARLOS WAGNER

Ganhará o debate na TV entre Lula e Bolsonaro quem tiver mais sangue-frio

Ainda não foi confirmado o debate mais esperado pelos eleitores, que confrontará o presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A realização do debate foi alinhavada pelas empresas de comunicação, que formaram consórcios de imprensa e já têm agendados quatro encontros entre os quatro candidatos mais bem colocados nas pesquisas de intenção de votos. O primeiro, previsto para 17 de setembro, não sairá porque Bolsonaro e Lula não confirmaram a presença – há matéria na internet. Pelos números das últimas pesquisas, Lula está em primeiro lugar, com chances de vencer no primeiro turno. Bolsonaro vem em segundo e apostando que a sua candidatura será turbinada pelos R$ 50 bilhões da chamada PEC da Bondade, aprovada pelo Congresso, para serem usados em programas sociais. Se acontecer o debate, seja qual for a estrutura do encontro, Bolsonaro e Lula terão a oportunidade de dizer a que vieram. É sobre isso que vamos conversar.

Partimos do princípio que o debate entre os candidatos, incluindo Lula e Bolsonaro, aconteça. Independentemente dos números das pesquisas, ele vai influenciar as eleições. Lembro o seguinte. Em outras eleições presidenciais os candidatos entravam no estúdio de TV para o debate carregando pastas de documentos. As pastas funcionavam como um recado para os adversários, do tipo: “Olha bem o que tu vais fazer, porque também tenho os teus podres aqui”. Essa estratégia pode até se repetir. Mas não será o ponto central. Uma leitura atenta do que temos publicado mostra que Bolsonaro tentará atrair Lula para uma discussão na pauta de costumes, especialmente a questão do aborto. Não é por outro motivo que parlamentares bolsonaristas continuam investindo no caso da menina de 11 anos de Santa Catarina que foi estuprada e teve o aborto impedido pela juíza Joana Ribeiro Zimmer. A decisão da juíza foi revogada porque a lei permite o aborto em caso de estupro. O caso continua pipocando na imprensa porque o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos decidiu investigar os médicos que fizeram o aborto. Há outro caso, que aconteceu em 1989, que certamente os estrategistas da campanha de Bolsonaro já estudaram. Até porque um dos envolvidos é aliado do presidente, o ex-presidente Fernando Collor de Mello. Na época, Collor e Lula disputavam o segundo turno da eleição para a Presidência da República. Na última semana da propaganda gratuita Collor colocou no ar um depoimento de uma ex-namorada do Lula, Miriam Cordeiro. Ela disse que Lula era racista e que, em 1974, pediu que ela fizesse um aborto. Paulo Tarso Santos, marqueteiro de Lula na época, afirmou que Miriam recebeu dinheiro de Collor – há matérias de jornais e trabalhos acadêmicos sobre o caso na internet.

Uma das apostas dos estrategistas de Lula é o desempenho de Bolsonaro no combate à pandemia causada pela Covid-19. Por quê? Várias questões, vou citar duas. A primeira é que existe uma abundância de imagens sobre as vítimas sendo enterradas em covas comuns nos cemitérios de Manaus (AM). A maioria delas morreu asfixiada por falta de oxigênio hospitalar causada por negligência do então ministro da Saúde, o general da ativa do Exército Eduardo Pazuello. Sobre o episódio há vídeos de Bolsonaro fazendo gracejos sobre a situação. O segundo motivo é que existiu a Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado sobre a Covid-19, a CPI da Covid, que produziu um relatório de 1,3 mil páginas documentando as irregularidades do governo, como o boicote às vacinas e o uso da cloroquina para tratamento da Covid, uma medicação sem efeito contra o vírus. E as experiências ilegais feitas em doentes. Essa CPI foi acompanhada pela população como se fosse uma novela de sucesso na televisão. Ela coloca as digitais do governo Bolsonaro nas mais de 670 mil mortes de brasileiros pelo vírus. Esse relatório foi notícia nos principais jornais ao redor do mundo. Citei esses dois casos, pauta de costume e pandemia, porque eles exigem do candidato um raciocínio rápido e conhecimento profundo da questão para não falar bobagem. Um tropeço pode custar caro. Muitos colegas apostam que a questão da corrupção vai ser o principal tema do debate, se houver, entre os dois candidatos. Pode até ser. Mas aposto em dois outros temas: as Forças Armadas. Hoje existem mais de 6 mil militares (ativa, reserva e reformados) de várias patentes trabalhando no governo federal. O segundo tema é a questão das milícias do Rio de Janeiro e as mortes, em 2018, da vereadora Marielle Franco e o seu motorista Anderson Gomes.

Sem o risco de cometer exageros. Em nenhum outro momento da história política brasileira houve tanta abundância de temas para serem debatidos como o atual. Vasculhando o que temos publicado, o número de matérias sobre como os candidatos irão se comportar durante os debates são escassas. Vou lembrar um fato. Em 2018, o então candidato a presidente Bolsonaro surpreendeu os jornalistas quando começou a criticá-los ao ser entrevistado ao vivo. Nunca ninguém tinha feito nada semelhante. Fomos surpreendidos pelo comportamento do hoje presidente. Em um ambiente confuso como o atual, onde o presidente do país tenta detonar a Justiça Eleitoral todos os dias, não podemos nos dar ao luxo de sermos surpreendidos. Vou citar um exemplo. O candidato Ciro Gomes, 64 anos (PDT), deverá começar os debates atacando Lula e Bolsonaro. À medida que o debate avance, ele concentrará a sua artilharia em quem estiver demonstrando mais vulnerabilidade. Por quê? É a última chance dele fazer crescer a sua candidatura. Todos os temas que serão debatidos são por demais conhecidos. Se não houver um debate entre Lula e Bolsonaro, esses temas que citei farão parte da propaganda eleitoral. Ou seja, de uma maneira ou outra, eles vão circular. A essa altura do jogo, precisamos explicar para o leitor o que está acontecendo nos bastidores das campanhas dos quatro candidatos que irão aos debates. A propósito, quando Lula e Bolsonaro vão bater o martelo e confirmar a presença nos debates? Ninguém sabe. Nem eles mesmos. A questão será decidida pelo andar da campanha.

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