RAFAEL MARTINELLI

Todos os repúdios e versões sobre o post de vereador armado exibindo filhote de javali que matou; Entre a náusea e a legalidade

Polemizou a postagem do vereador de Glorinha Rafael ‘Alemão’ Schmidt (MDB) armado e mostrando javali abatido por ele. A Associação de Preservação da Natureza Vale do Gravataí (APN-VG) soltou nota de repúdio e a vereadora da causa animal de Gravataí, Márcia Becker, informou que vai denunciar o colega de partido na direção estadual do MDB e também instar o Ministério Público. Já o político penhora legalidade no que cometeu nas redes sociais.

Reputo nauseante a postagem, uma molecagem política do nem tão mais jovem vereador de 29 anos, que está em seu segundo mandato e já presidiu a Câmara do ‘paraíso entre a Capital, a Serra e o Mar’. Mas vamos às informações – inclusive a argumentação do político –.e, ao fim, analiso.

Diz a íntegra da nota da APN Vereador de Glorinha/RS sorri com orgulho para foto com filhote de javali morto: É essa imagem que Glorinha quer passar?:

“(…)

Nos últimos dias têm circulado essa foto que o vereador POSTOU, com a legenda “de um final de semana qualquer”. Uma atitude exibicionista.

Esta atitude revela uma falta total de respeito não apenas pela vida animal, mas com toda a cidade, já que ele não representa só quem votou nele.

Os javalis são sim uma espécie invasora e que causa muitos dados às lavouras e aos ecossistemas naturais, mas foram as ações humanas que os colocaram nesses ecossistemas. Não é desta forma que iremos preservar nosso ecossistema.

É necessário promover a conscientização sobre a importância da conservação dos habitats naturais e do respeito a vida.

(…)”

A mesma postagem da APN – que aos 43 anos é uma das entidades pioneiras do ambientalismo no Brasil – traz recorte da Folha de S. Paulo alertando que, em 23 de agosto, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) suspendeu licenças para a caça de javalis e outras espécies exóticas de forma preventiva. Conforme a reportagem, “especialistas alegam que algumas pessoas estão usando a caça de manejo como desculpa para praticar caça esportiva, que é ilegal no Brasil”.

A APN conclui no post: “Se brincar de sair por aí matando já é problemático por si só, o quão desprezível é matar um filhote?”

O vereador atendeu ao Seguinte: na noite deste sábado.

– É mimimi. Não me arrependo. Vou postar de novo e marcar a APN – disse Alemão Schmidt, argumentando que responsáveis pela nota “não entendem nada de sustentabilidade e recursos naturais”.

O político lista uma série de danos provocados pelo javali ao meio ambiente, inclusive a destruição de ninhos de aves e a morte para alimentação de filhotes de veado, lebre e graxaim.

– Onde os javalis passam não sobra nada da lavoura e fauna. Tem o faro 11 vezes mais aguçado que o cachorro. É uma espécie exótica e invasora: deve ser exterminada – resume.

Alemão Schmidt disse ter em dia as autorizações do Sistema de Informação de Manejo de Fauna (Simaf) do Ibama para caça do javali, que são renováveis a cada quatro meses, além de armamento legalizado.

– Não seria bobo de não poder comprovar a legalidade. Gasto tempo e dinheiro com isso. Não houve proibição e sim suspensão de novas emissões até ser feita a transição da fonte de autorização da Secretaria Estadual de Agricultura para o Exército – garantiu, optando por não dizer ao certo a data e o local do abate do filhote de javali, mas enviando o Ofício 61/2023 do Ibama que informa que “assevera-se que autorizações emitidas, por meio do Simaf, anteriormente à data de 21/07/2023, continuam vigentes até a data de validade expressa no documento”.

– (o abate) Foi no Centro do Estado. Não vou dar detalhes para não ajudar na defesa deles. Vou resolver isso no Judiciário com a APN. Segunda-feira vou na Polícia Civil registrar ocorrência com base no artigo 340 do Código Penal – informou, dizendo que não há registros legalizados da existência de javalis em Glorinha e lembrando que, literalmente, já vestiu a camiseta da associação ao atuar, como vereador, na linha de frente do movimento ‘Xô Lixão’, que ajudou a barrar a instalação de uma termelétrica da gigante do lixo Estre em Glorinha.

O artigo 340 do Código Penal trata de “provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado”, com pena de detenção, de um a seis meses, ou multa.

– Sou vítima de perseguição ideológica. O problema não é o javali, é a arma – disse, alegando conhecer “comunistas” e “petistas” da APN, além de estar sempre preparado para ser abordado em fiscalizações de órgãos ambientais.

– Vou embuchá-los de tanta documentação, que nem cabe em meu porta-luvas – disse, concluindo:

– Só falta não poder postar algo lícito, legal, em minha rede social privada.

Explicações dadas, reafirmo: reputo nauseante a postagem, uma molecagem política.

Não precisava Alemão Schmidt posar ‘instagramável’ sobre um filhote abatido, mesmo seja, como descreveu o javali, “o pet do capeta”.

Salvo engano, considero que, enquanto acusa “comunistas e petistas” pelo repúdio, o notório bolsonarista Alemão Schmidt, conscientemente ou não, também calça a ferradura ideológica ao se exibir com uma arma e sorrindo sobre um animal morto.

Não precisava postar, Alemão!

Ao fim, se me permite, vereador, inclua fora dessa o Fórum de Gravataí/Glorinha, com seus 37.040 processos distribuídos, o terceiro num ranking gaúcho que nenhum município ganha ao figurar.

Ao expor seu exibicionismo de rede social – que, para homens públicos como o senhor, jamais serão privadas – a APN chamou atenção para algo que, se não está errado no seu caso, legal ou moralmente, pode induzir outros caçadores sem documentação a achar que está ‘tudo liberado’.

E, aí concluo com o coração de quem milita na causa animal: seu post chocou muita gente que tem compaixão pelos seres vivos não-humanos.

Ver o filhote de javali morto aos seus pés me fez mal.

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