Com professores e alunos ainda abalados pelas inundações, Gravataí e Cachoeirinha retomam as aulas “gradativamente” em escolas municipais, nesta semana que se inicia, após 12 dias letivos de paralisação.
Conforme os governos Luiz Zaffalon e Cristan Wasem, um dos principais motivos do retorno é a fome – o que trato no fim deste artigo.
Antes vamos às informações.
Gravataí já recebe alunos nesta segunda-feira, 20. A secretária da Educação Aurelise Braun explica ao Seguinte: que a orientação é para famílias manterem contato permanente com as escolas para ter informações específicas.
“Em razão de muitos professores e demais servidores da educação residir em cidades afetadas pelas enchentes, algumas escolas poderão ter os horários de atendimento modificados”, diz publicação da Prefeitura sobre a retomada das aulas “gradativamente”.
– Os servidores não terão prejuízo – garante Aurelise, questionada sobre a possibilidade de corte no ponto dos professores e funcionários com dificuldades de acessar as escolas.
A forma de recuperação das aulas, pelo conjunto das escolas, e pelos professores que não conseguirem chegar até elas, ainda não foi definida pela Prefeitura e conselho municipal de educação.
Nenhuma escola de Gravataí sofreu avarias. A única que retorna apenas na semana seguinte é a Olenca Valente, que ainda serve de abrigo para mais de 100 moradores da Vila Rica, bairro da escola e o mais atingido pelas inundações.
– Vamos realocar quem não tem para onde ir – explica, projetando a baixa das águas durante a semana e a avaliação das condições de retorno para casa dos moradores do bairro.
O sindicato dos professores (SPMG) mostra preocupação com a volta às aulas, que, conforme a presidente Vitalina Gonçaves, não foi discutida pelo governo municipal com a categoria.
Pesquisa feita pelo sindicato indica que 600, de 2,5 mil servidores, terão dificuldade de chegar às escolas.
– Muitos ainda não voltaram para casa, muitos perderam tudo – constata, cobrando do governo a definição de um instrumento legal para que servidores não tenham o ponto cortado, além de alertar para sobrecarga desses profissionais na recuperação das aulas.
– Antes da catástrofe, escolas já enfrentavam falta de professores e monitores. O cenário agora é pior. Precisaremos de assessoria da Smed – apela, citando como exemplo a Vanius Abílio dos Santos, que, do quadro de 45 professores, não tinha 4 e, a partir desta segunda, não terá mais 8.
Em Cachoeirinha, os alunos retornam só na quarta, 22. A retomada na segunda e terça-feira será apenas para professores e funcionários, que terão acolhimento psicológico conforme a secretária da Educação Isabel Fonseca, que também orienta famílias a buscar mais informações junto às escolas.
Conforme informado à Prefeitura pelo sindicato dos municipários (Simca) 347 entre 1,6 mil professores e funcionários foram atingidos e/ou tem hoje dificuldade de acesso a Cachoeirinha por morar em Canoas, Porto Alegre, Viamão, São Leopoldo e outras cidades mais inundadas.
– Não haverá corte do ponto e nem desconto, mas os servidores ficarão devendo o cumprimento da carga horária – explica Isabel Fonseca, lamentando que cerca de uma centena de professores ainda estão com suas moradias inundadas.
– Por isso, após conversar com diretores na sexta-feira, preparamos um acolhimento psicológico nesta segunda e terça – explica, destacando como qualidade da rede ter profissionais da área em todas as escolas.
Val Moreira, presidente do Simca, não atendeu contato do Seguinte: na manhã deste domingo, para se manifestar sobre o retorno das aulas.
Chegamos, então, à questão da fome.
Para além da questão educacional, cognitiva, calendários ou índices estatísticos, as secretárias Aurelise e Isabel explicam a volta às aulas também pela necessidade de alimentar crianças e adolescentes.
– É desumana a condição de uma série de professores fora de casa, com dificuldade de acesso, ou mesmo ajudando diariamente como voluntários, mas muitos alunos precisam da escola para comer – resume Aurelise Braun, estimando falar de 7 mil dos 29 mil alunos da rede municipal.
– Trocamos o lanche por comida nas segundas-feiras porque percebemos que alunos chegavam com muita fome – exemplifica, informando que, no período sem aulas, focos de atendimento com comida e doações foram nas regiões das principais escolas atingidas pela insegurança alimentar.
– Serviremos a merenda mesmo para turmas que não tiverem aula – informa Isabel Teixeira.
Ao fim, a volta às aulas é mais uma questão extremamente complexa em meio à maior catástrofe climática da história do Brasil. 2024 parece restar um ano perdido. E a fome? A fome é sempre uma indecência.
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