O excesso de chuva afetou os gaúchos, com perdas de residências, pertences e documentos, além do luto por familiares e animais de estimação. Mas como lidar com as frustrações? Como encontrar apoio emocional para enfrentar esse momento tão dramático? A psicologia têm sido uma aliada nesse processo de reconstrução.
Alef Lemos, psicólogo do Centro Médico do Hospital Dom João Becker, destaca que profissionais de saúde têm desempenhado um papel importante nos abrigos humanitários, oferecendo suporte inicial e orientando voluntários para ampliar essa rede. “Precisamos reconhecer as fases do luto, que são negação, revolta, barganha, depressão e aceitação. E a partir daí, entender que se pode lamentar a destruição de uma cidade, de uma ponte, de uma rodovia, de um restaurante e de uma casa. Não ficamos enlutados apenas por pessoas, mas também por objetos e lugares com valor afetivo”, explica.
Segundo Alef, nos atendimentos aos fragilizados são aplicados os cinco pilares dos primeiros socorros psicológicos: garantir segurança, acolher, encorajar, promover autoeficácia comunitária e facilitar a conexão entre pares. Sintomas comuns nesse tipo de trauma, como culpa, insônia, irritabilidade, desatenção, sensação de insegurança, isolamento social e ansiedade costumam surgir e diminuir com o passar do tempo (em torno de 60 dias).
Entretanto, durante ou mesmo após esse período é comum haver gatilhos que podem afetar severamente a saúde mental. “Viver um novo período de chuvas intensas ou lembrar dos aniversários do desastre podem aflorar emoções negativas. É fundamental estar atento ao que pode evoluir para uma condição patológica. Em situações de catástrofe como essa, há um risco aumentado para o abuso de álcool e outras drogas, bem como o surgimento de ansiedade, depressão e estresse pós-traumático”, ressalta o psicólogo do HDJB.
ADAPTAÇÃO – A palavra “resiliência”, tão comum nos tempos modernos, tem sido frequentemente mencionada em matérias jornalísticas, redes sociais e manifestações de autoridades. Segundo Alef, para a psicologia a resiliência diz respeito a capacidade de adaptação a novas e desafiadoras situações que a vida nos apresenta. A enchente certamente foi uma delas e está exigindo uma boa capacidade de adequação, tanto do ponto de vista individual, quanto coletivo. “Para facilitar esse processo, podemos apostar em empatia, compaixão e solidariedade como eixos de coesão social. Investir no que une aquela comunidade: o chimarrão, a culinária, a música gauchesca, etc.”, sugere.
Alef destaca que as consequências emocionais se manifestam em um número muito maior de pessoas do que se poderia imaginar. Mesmo aqueles que não perderam bens ou familiares acabaram atingidos de alguma maneira. “No Rio Grande do Sul, se você não foi diretamente impactado, certamente conhece alguém que foi. Além disso, houve restrições nas atividades laborais, fechamento de escolas e mudanças na rotina das famílias. Isso pode gerar sintomas semelhantes aos de quem vivenciou perdas mais significativas”, completa o psicólogo.