Pelas redes circulam convocações sobre ‘votação da CPI’ e até de ‘impeachment’ do prefeito, mas a verdade é que oposição ainda não reuniu assinaturas necessárias para investigar atos do governo
O cavalo-de-batalha escolhido pela oposição para fustigar o governo volta a pauta da Câmara de Canoas nesta terça-feira, 4. O pedido para criação de uma CPI que tenha como objetivo investigar decisões do prefeito Jairo Jorge na gestão da crise da enchente estará na agenda do parlamento — mas diferente do que dizem perfis de oposição e de pré-candidatos nas redes sociais, não será votado.
Segundo o regimento interno da Câmara, uma CPI só pode ser aberta a partir de um requerimento assinado por pelo menos um terço dos vereadores. Sete dos 21, portanto. Não há previsão para abertura de investigação a partir de um pedido popular: caso uma denúncia seja formalizada por um eleitor do município, como é o caso do documento entregue pelo treinador Juninho, semana passada, o pedido em questão precisa ser endossado por sete vereadores — ou será arquivado por não cumprir o requisito de assinaturas mínimas, sem votação.
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Além disso, a CPI precisa ser aberta sobre ‘fato determinado’ e com um mínimo de informações que indiquem o cometimento de ilegalidades, irregularidade ou má gestão da coisa pública. Por ‘fato determinado’, entende-se que uma CPI não pode ser genérica; não se pode abrir uma investigação sobre todos os aspectos da enchente, por exemplo, mas é possível analisar pontualmente decisões e escolhas feitas pelo governo em momentos específicos da crise.
Até às 21h de domingo, 2, não havia qualquer requerimento de CPI oficialmente protocolado no sistema eletrônico da Câmara, nem a assinatura de nenhum vereador a respeito.
Oposição em busca de votos
O blog passou o final de semana conversando com vereadores ligados ao governo e à oposição a respeito da possibilidade de criação de uma CPI na Câmara nesta terça, 4. Márcio Freitas (PRD), um dos líderes do movimento de oposição, garante já ter sete assinaturas para protocolar o pedido e que poderia até chegar a nove ainda no início da semana.
Não disse quais, porém.
Dos 21 vereadores, seis já se manifestaram nas redes sociais a favor da medida: além de Márcio, seu companheiro de bancada Leandrinho; os vereadores Airton Souza e Abmael Oliveira, do PL; e Juares Hoy e Jonas Dalagna, do PP.
Márcio espera um ‘racha’ na base do governo para angariar apoio à CPI. O alvo é claramente o vereador Eric Douglas, do União Brasil, que na sexta-feira, 31, publicou vídeo nas redes sociais dizendo que ‘votaria com o povo’ se precisar decidir a respeito de uma investigação sobre atos do governo. Eric, no entanto, tem sido enfático a respeito de outra questão que precisa ser levada em conta no momento: o uso político da CPI.
Gilson Oliveira (DC) também comunga da posição de que há vereadores, pré-candidatos a vereador e a prefeito querendo usar a pauta da CPI para crescer politicamente em meio à crise.
A política e a crise
Há uma perspectiva que explica isso: a CPI não seria uma ‘pauta do povo’, mas um instrumento das lideranças políticas que pretendem conduzi-los à eleição. Uma prova disso seria a pressão que houve sobre a Câmara na terça-feira da semana passada, dia 28, quando as galerias do plenário foram tomadas de manifestantes que, aos gritos e muito agitados, inviabilizaram a condução dos trabalhos no parlamento.
A manifestação acabou em ovos atirados ao paço, que o blog retratou — e condenou — no post CANOAS | Protesto com ovos: ‘povo pelo povo’ virou desculpa para o deboche; democracia não é ‘amém’ à baderna.
A manifestação de 28 de maio circula pelas redes como espontânea, mas foi filmada apenas por assessores, pré-candidatos e influenciadores da oposição. Os ovos que chegaram para serem jogados no prédio da Prefeitura comprovam que houve, no mínimo, alguma premeditação no movimento.
E o temor de que a manifestação dos ovos evolua equivocadamente para algum tipo de violência também preocupa.
A preocupação crescente entre os parlamentares sobre os rumos da crise divide-se, hoje, com esta indisposição também muito sólida sobre serem usados como ‘massa de manobra’ para os interesses eleitorais claramente postos no movimento pró-CPI.
Dado isto, a abertura da investigação segue tão certa quanto incerta, dependendo da perspectiva com que se olhe. Aliás, esta é outra máxima da política brasileira: um terreno fértil onde pode acontecer de tudo, inclusive nada.