Compartilhamos o artigo do jornalista e historiador Juremir Machado da Silva, publicado pelo Matinal Jornalismo
O eleitor pode tudo. Afinal, toda soberania emana dele. Às vezes, ele parece incompreensível. Em São Paulo, quase colocou o alucinado Pablo Marçal no segundo turno. Marçal não joga o jogo da democracia. A divulgação que fez de um laudo falsificado para tentar provar que o adversário Guilherme Boulos seria usuário de cocaína é um dos atos mais abomináveis da era tecnológica das eleições. Em Porto Alegre, apesar da falta de manutenção nos equipamentos de proteção contra enchentes, como se viu na tragédia de maio de 2024, quase 50% do eleitorado praticamente carregou Sebastião Melo nos ombros. Ele só não venceu no primeiro turno por ter estimulado demais a companhia de Felipe Camozzato, que lhe roubou o 0,28% necessários à consagração.
Guilherme Boulos (PSOL) e Maria do Rosário (PT) têm chances reais de ganhar no segundo turno? Tudo pode acontecer. Mas não é tarefa fácil. Na capital paulista, os votos de Pablo Marçal devem migrar para Ricardo Nunes, pavimentando o caminho para a reeleição do atual prefeito. Em Porto Alegre os votos de Juliana Brizola tendem a se dividir. Parte irá para Melo, parte irá para Rosário, que precisa explorar o reservatório de votos dos ausentes para sonhar com um triunfo na rodada final. Outra possibilidade é convencer eleitores de Melo a mudar de voto. O jeito será tentar convencer o eleitor de que Melo teve responsabilidade nos estragos das enchentes. Será que dá?
Na Câmara de Vereadores algumas surpresas e uma confirmação. A principal surpresa é a quebra da relação entre custo da campanha e número de votos. Candidatos com grande investimento não entraram. Marcelo Sgarbossa (Rede) aparecia como o décimo mais endinheirado. Fez uma votação reduzida. Abigail Pereira (PCdoB), primeiro lugar em recursos, não se elegeu. Em compensação, seu companheiro de partido Erick Dênil foi eleito. A confirmação é esta: venceu a polarização. Primeiro mais votado: Jessé Sangali (PL). Segundo lugar: Karen Santos (PSOL). O centro está fora de moda. Não faz cócegas nos eleitores.
A apuração em São Paulo deve ter provocado taquicardia em muita gente. Pablo Marçal esteve na frente de Guilherme Boulos tempo suficiente para provocar infartos em série. Em Porto Alegre, ao contrário, não se teve qualquer emoção. Melo liderou de ponta a ponta, oscilando entre 48 e 49% dos votos. Rosário jamais chegou aos 30%, patamar histórico do PT na cidade. Juliana Brizola não venceu a casa dos 21%. Era jogo jogado desde os primeiros resultados. Sua majestade, o eleitor, faz o que quer, nem sempre racionalmente. Criticá-lo não muda a realidade. Rejeição pode ser injusta, como a da Maria do Rosário, mas não deixa de ser um dado de realidade incontornável.
Imagino a dor de cabeça dos marqueteiros e consultores de campanha: que coelho tirar da cartola? Rosário e Boulos só podem esperar um coringa. Ele tem nome: Lula. Será que o presidente vai entrar com tudo nos palanques do segundo turno? Só ele, em tese, tem bala na agulha para virar o jogo, se comer a bola e não se poupar.