Carlos Urbim, esse contador de histórias que fez do Rio Grande do Sul um imenso livro de memórias, nasceu em Santana do Livramento, no dia 4 de fevereiro de 1948. Desde pequeno, demonstrava um olhar curioso sobre o mundo, transformando o cotidiano em poesia e prosa. Jornalista de formação, escritor por paixão, Urbim dedicou sua vida à literatura infantojuvenil.
Urbim iniciou sua trajetória profissional no jornalismo, trabalhando em veículos como o Diário de Notícias, a Folha da Manhã, Zero Hora e a RBS TV, além de colaborar com a revista Isto É. Sua atuação também incluiu a direção da Rádio da UFRGS, onde contribuiu para a difusão da cultura e da informação. Sempre atento às transformações do mundo, Urbim possuía uma escrita envolvente e um olhar crítico e sensível sobre a sociedade. Ele acreditava que as histórias tinham o poder de educar e transformar, fosse por meio do jornalismo ou da literatura.
Na década de 1970, em um Brasil sob regime militar, Urbim era uma voz que valorizava a memória e a identidade do povo, sem renunciar à crítica social. Como muitos intelectuais da época, ele não fazia discursos políticos diretos, mas suas histórias traziam reflexões sobre valores humanos, inclusão e justiça social. Ele via a cultura como um ato de resistência, uma ferramenta essencial para o fortalecimento da cidadania e da democracia.
Seus livros eram um convite à imaginação, ao lúdico e à reflexão. Urbim entendia as crianças e, talvez por isso, seus textos conversavam com elas sem subestimá-las. Cada frase era um gesto de carinho travestido de narrativa. “A palavra tem que estar cheia de imagens”, dizia ele. E ele sabia bem como fazer isso. Suas histórias nunca foram apenas palavras sobre papel, mas pequenas janelas para mundos cheios de cor, calor e emoção.
Um de seus livros mais queridos, “Uma Graça de Traça”, deu origem à personagem Biblió, que ganhou vida em uma adaptação teatral memorável pela atriz Dinorah Araújo. A obra, que mergulha na magia das palavras e no universo dos livros, encantou leitores e espectadores com sua proposta lúdica e poética. Dependendo da edição, o livro traz ilustrações de Monika Pepescu, Carla Pila ou Canini, complementando a narrativa com imagens igualmente encantadoras.
No teatro, Carlos Urbim escreveu “O Baú do Alvinho”, em parceria com Hermes Bernard Júnior, que mais tarde se tornou o livro “A Caixa do Alvinho”, com ilustrações de Laura Castilhos. Suas obras eram marcadas por um profundo respeito pela imaginação infantil e pela valorização da cultura.
Carlos Urbim foi fundamental para a literatura infantojuvenil brasileira. Seu livro “Um Guri Daltônico” (1984), com ilustrações, em edições diferentes, de Claudia Sperb e de Eloar Guazzelli Filho, foi lançado na Feira do Livro de Porto Alegre daquele ano e teve grande repercussão junto ao público, abordando a questão do daltonismo com sensibilidade e humor. Esse olhar afetuoso para as pequenas grandes diferenças era uma marca registrada de sua escrita.
Para comemorar os 40 anos da publicação de “Um Guri Daltônico”, a Editora AGE lançou, na Feira do Livro de Porto Alegre de 2024, um livro inédito de Urbim: “Maria Fumaça”. A obra, que chega às mãos dos leitores como um presente póstumo, reforça o legado do autor e sua capacidade de encantar gerações com histórias que celebram a infância, a memória e a identidade gaúcha.
Outras obras igualmente encantadoras incluem “Patropi, a Pandorguinha”, uma história repleta de lirismo sobre a infância e o vento que leva sonhos para o céu, com lindas ilustrações de Fetter. Já “Dinossauro@Birutices”, que mistura fantasia e realidade com um toque bem-humorado, contou com as ilustrações de Marco Cena.
Os livros “Caderno de Temas”, com ilustrações de Leonardo Menna Barreto Gomes, e “Diário de um Guri” trazem um olhar divertido e reflexivo sobre as descobertas da infância. Já “Dona Juana”, um conto cheio de simbolismo e afetividade, contou, novamente, com as ótimas ilustrações de Eloar Guazzelli Filho.
“Bolacha Maria”, com ilustrações de Gustavo Nakle, é uma fábula sobre memórias afetivas, remetendo àquelas pequenas lembranças que nos acompanham pela vida toda. “Saco de Brinquedos”, ilustrado por Laura Castilhos, carrega a ternura das infâncias simples e genuínas, enquanto “Os Farrapos” e “Rio Grande do Sul – Um Século de História” são obras que traduzem a cultura e a história gaúcha para leitores jovens. “Álbum de Figurinhas” e “Morro Reuter de A a Z” complementam seu legado, trazendo relatos que conectam infância e identidade regional de forma carinhosa e envolvente.
Tamanha foi a importância de Carlos Urbim para a literatura que, em 2009, ele foi escolhido como Patrono da Feira do Livro de Porto Alegre, uma honraria mais do que merecida para um escritor que sempre teve na literatura um espaço de encontro, troca e aprendizado. “A gente tem que abrir a porta da imaginação e sair passando”, ele dizia. E foi exatamente isso que fez ao longo de toda sua vida.
Carlos Urbim partiu em 13 de fevereiro de 2015, mas deixou um legado imortal. Seus livros ainda encantam, suas palavras seguem ecoando e seu olhar para o mundo permanece um convite à ternura. Como ele mesmo escreveu: “A gente tem que abrir a porta da imaginação e sair passando”. E talvez essa seja a melhor forma de lembrar Urbim: abrindo um de seus livros e deixando que suas histórias sigam nos fazendo sonhar.