Bolsonaro sabe que nos próximos meses não terá condições de ser nem mesmo jardineiro da sede do Clube Militar no Rio. Na foto mais recente, ele aparece sentado no leito da UTI lendo um papel.
Sem camisa, de óculos, fixado na leitura. É possível contar 10 pontos com algum tipo de conexão dos aparelhos com seu corpo. São fios de eletrodos e cateteres que medem e mantêm sob controle sua situação de saúde precária e instável.
Mas Bolsonaro parece ler com atenção. Com uma sonda gástrica no nariz e com todos aqueles fios que monitoram e calibram seus sinais vitais.
O paciente saiu há quatro dias de uma cirurgia que durou 12 horas. E manda dizer, pela foto, que aquele papel na mão o mantém conectado com o mundo das grandes decisões. Aquele não seria um papel qualquer com sua taxa de colesterol.
Sendo Bolsonaro um ex-presidente, a foto tem algum impacto. Que seria maior se ele fosse governante de alguma coisa. Porque passaria a ideia de que detém poder e mantém contato com uma realidade que exige sua atenção, mesmo naquelas circunstâncias.
Mas Bolsonaro não detém função pública, não governa, não faz nada que possa significar, como gestor de qualquer coisa, uma preocupação com o bem-estar dos brasileiros. O que ele informa, em meio ao emaranhado de fios, é que continua conspirando.
Bolsonaro ressuscitou para nos alertar de que continua fazendo o que sempre fez, desde que perdeu a eleição e perdeu o golpe. Bolsonaro conspira.
O líder do PL na Câmara dos Deputados, Sóstenes Cavalcante, já avisou que seu chefe é quem dará o aval decisivo ao novo texto do projeto de lei que poderia anistiar manés terroristas do 8 de janeiro.
Levarão a Bolsonaro a minuta da anistia, assim como no fim de 2022 levaram a minuta do golpe. Tudo em papel, com prova analógica das manobras, como foi com a trama golpista que não deu certo.
O que Bolsonaro sugere, na cena em que lê alguma coisa, é que tem o controle da situação. E que finge, com a ajuda de Cavalcante, estar mesmo interessado apenas na absolvição dos patriotas.
É constrangedor para as instituições, em especial para o Supremo, passando por Ministério Público e também pelo Congresso, que um cara alquebrado, réu por crimes variados, às vésperas da condenação e com um pé na cadeia, conspire do hospital, de dentro da UTI.
E ainda mais na situação em que se encontra, expondo toda a sua fragilidade física, que se tornou crônica e parece irreversível, se for considerada a sequência de episódios médicos.
O Brasil continua sob a ameaça de um golpista que hoje não consegue andar sozinho, assim como quase não ficava em pé quando se enfurnou no Alvorada depois de ser derrotado por Lula. Mas o que será de Bolsonaro nos próximos meses?
É provável que saia do hospital e seja filmado comendo frango com farofa com as mãos em alguma lancheria de Brasília. É certo que continuará aparecendo, como derrotado, em pesquisas que simulam uma disputa improvável com Lula em 2026. É possível que tenha nova recaída.
Tudo é provável para Bolsonaro, desde o momento em que passou a ser visto como terrorista pelo Exército, que dele se livrou para que incomodasse os civis e passasse a usufruir dos benefícios da democracia.
Na foto em que lê algo, ele pode estar fingindo que aquele papel tem conteúdo ameaçador para Lula, o governo, Alexandre de Moraes, para a PGR e para as esquerdas.
Se for um papel em branco, não interessa. O que importa é a cena. Somos ameaçados por alguém que ainda não foi liberado nem para tomar canja.