Em meio a denúncias de fraudes no Bolsa Família envolvendo de servidores indicados politicamente, a Câmara de Vereadores de Cachoeirinha passou a discutir o Projeto de Lei nº 75/2025, que propõe a exigência de certidões de antecedentes criminais para estagiários e ocupantes de cargos em comissão (CCs) no âmbito da administração pública municipal.
De autoria do vereador Mano do Parque (PL), a proposta foi para análise constitucional das comissões e busca criar critérios mínimos de idoneidade para nomeações políticas e contratações temporárias no município.
De acordo com o texto, a apresentação da certidão seria obrigatória tanto na nomeação quanto na recondução ou prorrogação de contratos, incluindo documentos emitidos pela Secretaria de Segurança Pública do Estado e, quando possível, também pela Polícia Federal.
O projeto chega quando, mais uma vez, o noticiário político se mistura com o policial em Cachoeirinha. Entre os episódios recentes, há suspeitas de fraude nos benefícios sociais, envolvendo CCs, e inclusive abuso sexual, aí envolvendo servidor concursado, no âmbito familiar.
Embora a proposta encontre respaldo no princípio da moralidade administrativa, defendido pela Constituição, sua constitucionalidade formal resta em debate.
Isso porque, segundo entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), normas que tratam de critérios para nomeação de cargos dentro do Executivo, no caso, a Prefeitura, devem partir do próprio prefeito, sob risco de vício de iniciativa.
Ainda assim, o projeto propõe uma alternativa para manter a análise caso haja registros criminais: caberia à autoridade nomeadora decidir, de forma fundamentada, se o histórico é incompatível com a função.
Além disso, o texto prevê um impedimento direto para a nomeação de pessoas com histórico de agressão contra mulheres ou abuso infantil, o que reforça o caráter protetivo e preventivo da medida.
O posicionamento do prefeito, inevitavelmente, também faz parte do debate. Como o projeto é de iniciativa do Legislativo, a proposta, caso aprovada, pode ser vetada ou questionada judicialmente, sob o argumento de interferência na autonomia do Executivo.
No entanto, Cristian Wasem pode aproveitar a proposta e assumir o tema como política pública própria, propondo uma nova versão do texto com iniciativa formal correta.
A exigência de certidões de antecedentes para nomeações em cargos públicos não é novidade. Em diversas cidades brasileiras, leis semelhantes foram aprovadas, especialmente após a popularização do conceito de ‘ficha limpa’ também fora do contexto eleitoral.
O STF já decidiu que a exigência pode ser considerada constitucional quando respeita o devido processo legal, a proporcionalidade e a presunção de inocência.
Ao fim, lembra-me frase atribuída a Charles Bukowski: “Acho que a única hora em que a maioria das pessoas pensa sobre injustiça é quando acontece com elas”. Se a proposta avançar, é preciso razoabilidade. Principalmente quando se votam leis punitivistas no calor de escândalos e pressão da opinião pública.
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