Um levantamento inédito realizado pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM), em parceria com o Ministério Público do Rio Grande do Sul, serve de alerta sobre a qualidade da água na Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí, que abastece parte 1,3 milhão de pessoas da Região Metropolitana de Porto Alegre.
O relatório parcial do Projeto de Monitoramento de Agrotóxicos, referente ao período de abril de 2023 a março de 2024, identificou 43 diferentes ingredientes ativos de agrotóxicos em amostras de água e sedimentos.
Segundo o documento, elaborado com análises conduzidas pelo Laboratório de Resíduos de Pesticidas da Universidade Federal de Santa Maria (LARP/UFSM), herbicidas, fungicidas e inseticidas foram encontrados em larga escala. Entre os produtos mais detectados estão o tebuconazol (fungicida), presente em 61% das amostras, o imazetapir (herbicida), com 44,7%, e o clorantraniliprole (inseticida), em 38,3%.
Compostos proibidos e uso irregular
O levantamento chama atenção para a presença de substâncias que não deveriam estar em circulação, como o carbendazim, proibido no Brasil desde 2022 após reavaliação toxicológica da Anvisa. Também foram encontrados ingredientes ativos sem cadastro na FEPAM, como ametrina, fenoxicarbe, propoxur e hidróxido de fentina.
Apesar da proibição, os técnicos alertam que o carbendazim ainda pode aparecer no ambiente em razão da degradação de outros produtos derivados, como o tiofanato-metílico, ainda permitido.
Riscos à saúde e ao meio ambiente
Embora todas as amostras tenham ficado abaixo dos limites máximos de potabilidade estabelecidos pelo Ministério da Saúde, duas ultrapassaram os valores da Resolução CONAMA nº 357/2005 para águas doces. Uma delas foi coletada no ponto 7 do monitoramento, em dezembro de 2023, apresentando concentração de 2,4-D quatro vezes acima do permitido. Outra, registrada em abril de 2023, revelou excesso de carbaril.
O estudo também avaliou os impactos ecotoxicológicos e constatou que o fenoxicarbe, detectado em sedimentos, apresentou concentração acima do limite de segurança para organismos aquáticos, indicando riscos para a biodiversidade da região.
Água para mais de um milhão
A Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí abrange nove municípios — entre eles Gravataí e Cachoeirinha — e abastece cerca de 1,3 milhão de pessoas. Além disso, a área concentra ecossistemas frágeis como os banhados Grande e dos Pachecos, fundamentais para a manutenção da biodiversidade local.
De acordo com a FEPAM, a contaminação está diretamente associada ao uso intensivo de agrotóxicos em lavouras de arroz e soja, predominantes na região. Os picos de presença de herbicidas e inseticidas coincidiram com o calendário agrícola, reforçando a ligação entre as práticas de cultivo e a qualidade da água.
O monitoramento seguirá até o fim de 2025, totalizando 24 meses de análises. Os resultados finais devem subsidiar políticas públicas de controle do uso de agrotóxicos e proteção dos recursos hídricos.
O relatório alerta que, embora os níveis médios de agrotóxicos não representem risco imediato à saúde humana pelo consumo de água, a exposição contínua e combinada a diferentes substâncias pode gerar impactos ainda pouco mensurados, além de ameaçar a fauna aquática e os ecossistemas de banhado.
Clique aqui para acessar o estudo completo.