No Brasil, o 7 de setembro virou uma espécie de sessão nostalgia golpista. Em 2021, Jair Bolsonaro transformou a data em palco para ameaçar o STF, chamar Alexandre de Moraes de “canalha” e, de brinde, prometer que só Deus o tiraria de Brasília, como bem lembra Cleber Lourenço, no ICL Notícias.
Quatro anos depois, na Avenida Paulista, Tarcísio de Freitas fez um número cover: repetiu as mesmas frases, a mesma entonação e até a mesma raiva ensaiada contra Moraes.
É como aquela máxima de Luis Fernando Verissimo: “Aqui, a história não se repete como farsa, as farsas se repetem como história”.
O público, menor e desanimado, ainda tentou dar ritmo à encenação no palco de Tarcísio. Mas nem mesmo o choro e o áudio gravado de Michelle Bolsonaro com a voz do marido, em modo ‘Jovem Pan’, como referiu o historiador João Cezar de Castro Rocha, conseguiu empolgar.
Aquele que reputo o principal pesquisador da extrema direita brasileira estava lá e chamou de “grande fracasso” e “desagregação”. Faz sentido: quem vai a um ato ‘patriótico’ com bandeira dos Estados Unidos, como a que foi desfraldada na Av. Paulista?
É tipo cantar o hino nacional com playback do Star-Spangled Banner. Um September 7th.
Mas a questão não é só estética. Tarcísio resolveu usar o microfone para vender a mais nova aberração jurídica em liquidação no Congresso: a anistia geral.
Não é só para Bolsonaro e os ‘turistas patrióticos’ do 8 de janeiro. A redação é tão ampla que pode salvar até o PCC e milícias, como alertam os juristas Lenio Streck e Damares Medina.
Nas palavras de Streck no X, trata-se de “uma confissão de golpismo” que ainda abre caminho para “um futuro golpe”. Já Medina alertou, no ICL: com a fórmula “associadas de qualquer modo”, até organização criminosa pode virar manifestação política.
O Estatuto do PCC, por exemplo, tem até partes lúdicas que falam em direitos humanos. Que tal?
Tudo isso para quê? Para agradar a família Bolsonaro, que anda mais desconfiada de Tarcísio do que de urna eletrônica. Eduardo Bolsonaro, por exemplo, já chamou o governador de São Paulo (e seus colegas Caiado e Ratinho Jr.) de “carniceiros” — abutres de olho no espólio do pai.
A resistência é compreensível: enquanto Jair Bolsonaro já broxa diante da realidade de que não pode mais ser candidato e que a cadeia bate à porta, Tarcísio já fala com os contadores e negocia a herança antes do velório terminar.
Só que Eduardo, aquele do clã que embarcou para Disney numa aventura sem retorno, tem razão em desconfiar. Se Tarcísio fosse presidente e decretasse anistia ou indulto, o STF barraria pela inconstitucionalidade. E aí? O governador paulista até assinaria o papel, mas, quando viesse a reação da Corte, faria o quê? Abriria guerra?
Nada. Jogaria a toalha com um “tentei, gente, mas a vida segue, vamos transformar o Brasil numa Argentina do Milei”.
O que Eduardo percebe é que Tarcísio quer o espólio do bolsonarismo sem assumir a herança da briga — e, para os radicais, não existe Bolsonaro sem conflito eterno com o Supremo.
Ao fim, Tarcísio pode repetir os gritos, as ameaças e até o figurino do 7 de setembro de 2021. Pode tentar vender anistia como “pacificação nacional”, mesmo que sirva de passe-livre para facções. Pode até posar como herdeiro legítimo do mito. Mas enquanto Eduardo Bolsonaro não for ‘convencido’, sempre restará a dúvida: quem realmente acredita que Tarcísio abriria guerra contra o STF?
Aparentemente, só falta Eduardo Bolsonaro para Tarcísio enganar.