RAFAEL MARTINELLI

Pedágio na ERS-020 — na divisa com Taquara — não é mau negócio para Gravataí; a ‘ideologia dos números’

Se para alguns município o pedágio pode ser um horror, a instalação de um free flow na ERS-020, na divisa com Taquara, não parece um mau negócio para Gravataí. Nesta segunda-feira, 9h, na Prefeitura, tem audiência pública.

Olhando com precisão para o que o governo estadual apresenta — e para o que Gravataí recebe em troca — a ‘ideologia dos números’ aponta que, para os gravataienses, o pedágio na 020 é a passagem única para um pacote de investimentos que dificilmente existiria sem o modelo de concessões.

Gravataí venceu uma batalha importante ainda antes de a discussão avançar: não haverá pedágio na ERS-118, mesmo após a duplicação completa. O governador Eduardo Leite cumpriu a promessa feita em campanha e retirou do projeto qualquer forma de cobrança no trecho urbano.

O modelo prevê que a duplicação será concluída, a rodovia receberá manutenção permanente pelos próximos 30 anos, e duas passarelas estão previstas — uma na altura da Havan e outra próxima ao Hotel Radar.

Somam-se ainda a entrega da elevada na 118 com o Distrito Industrial (R$ 50 milhões) e a trincheira na 118 com a Avenida Brasil (R$ 24 milhões).

Esse conjunto de obras, que afeta diretamente a vida de quem mora, trabalha e se desloca por Gravataí, é viabilizado em grande parte pelos recursos gerados no Bloco 1 de concessões — do qual faz parte justamente o pedágio eletrônico da ERS-020.

O pórtico previsto para o km 22,9 da ERS-020 ficará em Morungava, fora da zona urbana, próximo à divisa com Taquara, no caminho para Gramado.

Isso reduz o impacto direto sobre a rotina diária dos moradores de Gravataí, ao mesmo tempo em que alinha o pagamento à lógica de uso: quem utiliza esse trecho contribui para sua manutenção e ampliação.

A cobrança começará somente em 2027, após assinatura do contrato prevista para o final de 2026. Será no modelo free flow, o ‘pedágio gourmet’, sem praças físicas, sem filas, sem interrupção do tráfego e com tarifa proporcional à distância percorrida.

O valor estimado para automóveis em Gravataí é de R$ 4,26 com aporte do Estado, ou R$ 6,49 sem recursos do Funrigs.

O aporte de R$ 1,5 bilhão do governo estadual reduz o custo do quilômetro no Bloco 1 de R$ 0,32 para R$ 0,21.

O que o pedágio da 020 viabiliza na prática para Gravataí

A inclusão da ERS-020 no Bloco 1 destrava R$ 218 milhões em duplicações na própria 020, além de R$ 140 milhões para concluir a duplicação da ERS-118 até Viamão.

No total, conforme o governo estadual, o Bloco 1 prevê R$ 6,41 bilhões em investimentos ao longo de 30 anos; R$ 4,86 bilhões somente nos primeiros dez anos; 213,7 km de duplicações, incluindo trechos de 020, 040, 115, 118, 235, 239, 474; 31 passarelas, acostamentos, marginais e trevos novos; estradas mais resilientes a chuvas intensas, com novas pontes e melhor drenagem e socorro mecânico 24h, ambulâncias e monitoramento por câmeras.

Em resumo: Gravataí recebe obras em rodovias estratégicas sem pagar pedágio na 118 — justamente a estrada mais usada pelos moradores — porque o equilíbrio econômico do bloco depende da arrecadação em trechos como a 020.

Para o pacote completo, o governo vende sua mágica: aponta que a comparação com estados que lideram concessões rodoviárias — como São Paulo e Paraná — demonstra que privatizar trechos estratégicos não é uma tendência isolada, mas uma resposta moderna a um problema conhecido: estradas caras, lentas e inseguras.

Cita que a CNT indica que rodovias em más condições elevam em até 49,6% os custos do transporte no Rio Grande do Sul. No ano passado, o Estado registrou mais de 137 milhões de quilos de CO₂ desperdiçados por má conservação, além de custos financeiros superiores a R$ 300 milhões.

E conclui que, com concessões, o tempo médio de viagem cai 8,35%, os custos operacionais diminuem, e o histórico mostra queda superior a 50% nos acidentes.

Na prática, conforme o governo, significa logística mais barata, menos desgaste do veículo, menos sinistros e mais competitividade para a indústria instalada em Gravataí.

Fato é que, propaganda à parte, para Gravataí o free flow na divisa com Taquara é uma engrenagem estrutural: sem ele, o Bloco 1 perde equilíbrio econômico e as obras na 118 e na própria 020 simplesmente não acontecem.

No mundo real, Gravataí está na posição de não pagar pedágio na sua principal rodovia estadual, receber obras pesadas, garantir a conclusão de duplicações, ter mais segurança viária e ainda ver o pórtico ficar longe da vida urbana.

Num Estado que precisa reconstruir infraestrutura, resistir ao pedágio nestes moldes pode ser um gesto até compreensível, mas nem sempre racional.

Olhando estritamente para a ‘ideologia dos números’ — e o pacote entregue a Gravataí — o pedágio na 020 não é um mau negócio. É, provavelmente, o único caminho para abrir a cancela para investimentos que a cidade espera por décadas.

Porém, não garante cliques. E tira votos. É cancela aberta, sim, para oportunistas.

Participe de nossos canais e assine nossa NewsLetter

Facebook
WhatsApp
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Conteúdo relacionado

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Receba nossa News

Publicidade