“Cui prodest?” Diziam os romanos, a quem interessa? Assim como nos filmes sobre crimes a investigação sempre deve iniciar com este questionamento. Enquanto os jornais esmiúçam os detalhes da cena do crime, o investigador precisa ir mais a fundo, o que está além do óbvio, algo que elucide o crime, suas razões, os suspeitos e etc.
Como nos crimes, numa guerra também nem sempre é fácil descobrir a verdade, os fatos, os motivos, agravantes a atenuantes. Clausewitz, o famoso general prussiano, dizia que a política era a guerra por outros meios e talvez também vice versa. A vantagem da política é a significativa redução das baixas. Já o filósofo alemão Karl Marx dizia que a guerra era motivada pela disputa de mercados, portanto uma disputa mercadológica. Marx desnudou a hipocrisia das desavenças pessoais ou coletivas, antipatias mútuas.
Na Ucrânia ficou claro que a política e o arranjo entre países não foi suficiente para manter a paz armada que já perdura há pelo menos oito anos com a derrubada de um governo ucraniano e a posse de uma nova administração. Tomou posse um outsider da política e talvez o impasse atual deva-se muito a isto.
A Ucrânia deixou velhos amigos tradicionais encantada com as ofertas dos novos amigos de agora, imaginou nesta troca de lado alguma vantagem. Esta troca de lado tinha um preço, os novos amigos para ajudá-los condicionou a uma aliança militar e a hospedagem de mísseis de ataque contra os antigos amigos.
Não há movimento no tabuleiro político sem que haja ganhos ou possibilidades concretas de vantagens, como disse Marx: mercados. Quem ganharia e quem perderia com a movimentação da Ucrânia? Alguém quer muito esta guerra e se percebe com muita clareza com a cobertura da mídia. As primeiras medidas do ocidente ante ao reconhecimento da autonomia de províncias de maioria russa foram exatamente embargos econômicos. Nada disto é novidade na história.
Na Segunda Guerra os EUA ascenderam como uma potência econômica e militar. Foi bastante interessante para eles o resultado final. Com a Europa devastada e o Japão de joelhos, os mercados foram rapidamente tomados pelas grandes empresas americanas. O preço deste salto econômico foram os milhões de soldados mortos, um inconveniente tido como necessário à época. No fanal dos anos 60 o Vietnã, país miserável colonizado pelos franceses que o doaram aos EUA e fugiram, uma guerra anti-imperialista de independência estava em curso, logo milhares de soldados yankees estavam embrenhados nas matas. Quando o volume de caixões chegaram nos EUA a opinião pública ficou horrorizada, novos tempos em que ninguém mais estava disposto a pagaram este “preço”. Logo foram obrigados a uma retirada vergonhosa e sua consequente derrota.
Nascia no pós-vietnã um novo conceito de guerra onde não houvesse mortos, pelo menos não americanos, mas com todo o butim econômico. A isto se chama de proxywar, usar segmentos internos conjunturalmente descontentes com apoio financeiro, armas, equipamentos, inteligência e de mídia. Anos mais tarde foi a estratégia utilizada com o Talibã e alQaeda. Sempre há quem aceite aliar-se com o diabo para matar seu inimigo. No Iraque houve invasão direta e as coisas não foram como o esperado, mas pelo menos a empresas americanas ganharam de presente os poços de petróleo do país para sempre. No Afeganistão a ocupação foi longa e a saída melancólica com a volta do regime medieval islâmico e desunido, mas é um país miserável sem riquezas como o petróleo.
A vantagem geográfica da Ucrânia é imensa. Fica muito próximo de Moscou, instalar mísseis ali seria o ideal tendo em vista que os hospedados na Polônia e na Hungria ficam tão distantes que ao lançar um míssil seria interceptado pelas baterias russas ainda dentro destes países. Na Ucrânia os mísseis explodiriam já em solo russo.
Vejam, a temperatura subiu exatamente na insistência de uma aliança com a OTAN e na instalação de mísseis de ATAQUE em solo ucraniano, um direito de uma nação soberana. Porém, há que se dizer que quem passa a uma posição de ataque deve estar ciente das responsabilidades disto. Países lindeiros à Rússia não estão sob beligerância, nenhum deles tem mísseis de ataque direcionados à Rússia.
O que você vê na TV e muito do que reproduz as redes sociais é propaganda. Trata-se de que querem que veja, de vencer a narrativa dos fatos. Reparem que por aqui TODOS os analistas parecem ter a mesma opinião. É espantoso a repetição ad nauseum da mesma ladainha copiada de releases emitidos com objetivos claros distantes do jornalismo.
É de impressionar o que estamos vivendo, não há contraditório, não há debate ou divergência. A guerra é lamentável e os inocentes sempre morrem, todas são violentas e traumáticas, somo a isto que tão lamentável também é a mentira e a enganação que levam a tudo isto. Não há mocinhos ou bandidos nesta história, são todos bandidos E mocinhos em maior ou menor grau dependendo da conveniência. E assim caminha a humanidade, vai com a boiada quem quer.