Prefeito divulgou vídeo no final da tarde de sexta-feira em resposta à ameaça de greve de motoristas e cobradores na cidade
Quem costuma espiar por trás das palavras de um discurso político sempre está mais perto de enxergar a verdade do que quem só nada sobre a superfície. O discurso gravado em vídeo pelo prefeito Jairo Jorge no final da tarde desta sexta-feira, 10, sobre a crise do transporte coletivo da cidade, precisa ser interpretado mais do que só assistido; é no subtexto que está o mais importante.
Para quem ainda não assistiu, tem a chance aqui:
Jairo começa lembrando a greve que parou o transporte público entre o Natal e os primeiros dias do ano, janeiro. "A maior da história da empresa", afirma o prefeito. Era o assunto da cidade, como o blog retratou no post 'Rodoviários fazem assembleia e tem greve na pauta; Canoas em ônibus no Natal'; Luiz Carlos Busato, prefeito até dezembro, já havia feito um repasse de recursos à Sogal e estava atado ao final do mandato. JJ, ainda na condição de eleito, não podia negociar nada em nome do governo. Seria um final de ano de paradas vazias em Canoas.
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No dia da posse, em janeiro, Jairo anunciou a compra de passagens e antecipou o Auxílio Emergencial, que seria lançado em março. O socorro, então, não seria um 'dinheiro na conta da empresa', mas uma transação comercial feita com antecedência. O alívio, no entanto, durou pouco – e novas compras tiveram que ser feitas. Até agora, R$ 3,7 milhões, como recuperou o prefeito, ao longo do vídeo.
O problema é que a urgência parece ter virado um costume. E é aí que JJ foi 'educado', como me referi no título deste post. Ao se dirigir aos rodovíarios e, adiante, lembrá-los do acordo que impede a greve antes do dia 23 de setembro, na verdade o prefeito está querendo poupar os cofres públicos de mais uma injeção de recursos em uma ineficiente gestão privada. No fundo, os técnicos do governo sabem que esse antibiótico não faz mais efeito – mas ainda não se pode dizer que não terão de usá-lo novamente sob pena de inviabilizar a mobilidade dos trabalhadores pela cidade.
Ao prefeito, restou pedir compreensão e o cumprimento do acordo. Afinal, nem a Sogal e nem os rodoviários podem enxergar a prefeitura como um saco sem fundo de socorro financeiro, especialmente – repito agora porque já disse antes – quando o serviço prestado no transporte público está muito longe de ser razoável. A Sogal na UTI não pode drenar recursos da Saúde ou Segurança, mesmo sob a justificativa de ser um serviço público e, portanto, garantido à comunidade pela Prefeitura.
Qual a saída, então? Bom, JJ já deu uma pista. "Estamos trabalhando em uma proposta para enfrentar definitivamente a crise do transporte coletivo", finalizou o prefeito. Não acredito em intervenção, como aconteceu em Porto Alegre no finalzinho dos anos 80, embora essa alternativa volta e meia surja sobre a mesa do prefeito. Politicamente, especula-se subsídio e a nova licitação.
O primeiro vem sendo trabalhado junto aos governos do Estado e da União. Em Brasília, Bolsonaro disse 'não' à ideia dos prefeitos de criar um fundo nacional para custear as gratuidades e que daria cerca de R$ 12 milhões para Canoas no ano que vem. Ainda há tempo de discutir a ideia com o Congresso e incluir a proposta no orçamento da União mesmo sem o 'talquei' do presidente, mas as articulações políticas para isso ainda precisam avançar mais via Frente Nacional dos Prefeitos, da qual JJ faz parte.
Com o Estado, o subsídio é visto com melhores olhos – mas atingiriam, quando muito, o transporte metropolitano, restando a Sogal na mão – e no cofre – da Prefeitura novamente.
O caminho da licitação é a chance real de uma mudança drástica no sistema – incluindo os planos do aeromóvel e suas linhas elevadas cortando a cidade. Está marcada para 2023 – o que parece um pouco distante para o cidadão que vive sob a ameaça de não ter ônibus na rua com ou sem greve.
Aguardemos.