Com a vacinação parada por falta de doses, o prefeito Luiz Zaffalon tuitou ranking que coloca Gravataí como a mais eficaz na imunização contra a COVID-19. Mas, então, por que estamos atrasados no critério da idade, em relação a outros municípios? O secretário da Saúde Régis Fonseca explicou ao Seguinte:. Ao fim do artigo, opino.
– Diferente de outros municípios seguimos o PNI (plano nacional de imunização) e vacinamos todos os grupos prioritários, inclusive industriários e construção civil. Agora avançaremos mais rapidamente na idade – diz o secretário, a quem resta torcer pelo cumprimento do calendário apresentado pelo governador Eduardo Leite, que prevê todos os gaúchos adultos vacinados até 20 de setembro.
– Se a vacina chega, aplicamos. Fazemos o que está sob nossa ingerência. E isso nos coloca na liderança do ranking entre as 10 maiores cidades – explica, citando os percentuais postados por Zaffa, que mostram eficácia de 96,3% para Gravataí; 92.1 Caxias; 88 Novo Hamburgo; 87 Canoas; 86.7 Porto Alegre; 84.8 Viamão; 83.2 São Leopoldo; 76.6 Pelotas; 62.4 Santa Maria e 59.9 Rio Grande.
Já por idade, enquanto Gravataí estacionou nos 52 anos, Porto Alegre e Cachoeirinha, por exemplo, estão nos 50, Canoas nos 48, Viamão e Alvorada já em 43.
Hoje Leite confirmou a projeção de liberação de vacinas para 849 mil gaúchos entre 50 e 59 anos até dia 30; 438 mil entre 45 e 49 anos de 1º a 15 de julho; 440 mil entre 40 e 44 anos de 16 a 31 de julho; 600 mil entre 35 e 39 anos de 1º a 15 de agosto; 600 mil entre 28 e 34 anos de 16 a 31 de agosto e 972 mil entre 18 e 27 anos de 1º a 20 de setembro.
Com a chegada de novas doses do Governo do Estado entre esta quinta e sexta, a Secretaria Municipal da Saúde já se prepara para retomar a vacinação da primeira dose em Gravataí neste sábado. Também deve chegar lote de AstraZeneca para a segunda dose, mas ainda não há público na espera devido ao prazo necessário entre uma aplicação e outra. Fila de 1,5 mil pessoas existe para a D2 da Coronavac, que está sendo aplicada hoje. No último sábado, 1.072 pessoas foram vacinadas em um mutirão de aplicação de doses da vacina.
– A redução na idade em outros municípios pode dar a falsa impressão de que mais pessoas são vacinadas, mas na eficácia, na relação entre as vacinas que chegam e as que são aplicadas, lideramos o ranking – conclui o secretário, relatando que somente na última sexta foram aplicadas 7 mil.
No total, até o meio-dia desta quinta, 140.188 vacinas já tinham sido aplicadas em Gravataí.
Gravataí tem 200 vacinadores, distribuídos em 29 unidades de saúde. Conforme a estratégia da Prefeitura, nos finais de semanas 11 unidades têm sido abertas, mas com mais salas de imunização.
Conforme Régis, já se percebe o impacto da vacinação na pandemia.
– Mesmo com aumento de casos temos redução de internações e mortes – observa.
Como reportei em A ’despiora’ da COVID: platô é de 3 vidas perdidas por dia em Gravataí; São mortes com rosto, como os Denicol ou a profe Maura, o número de internações varia entre 38 e 40 pacientes, e a mortalidade caiu de uma média de 3,6 vidas perdidas a cada 24h em maio para 3 nos primeiros 15 dias deste mês.
– Ainda é preciso muito cuidado. Não estamos em uma estabilidade com menos mortes, como janeiro, por exemplo – alerta, sobre o mês em que o número de óbitos estava em 2 a cada 24h.
Às 13h de hoje os números oficiais registravam 22.368 casos e 822 vidas perdidas em um ano e três meses de pandemia.
Ao fim, reputo errado tanto o critério definido por técnicos e governos de priorizar grupos inclusos no PNI, como seguiu Gravataí, quanto aqueles que defendem simplesmente o critério da idade.
O primeiro permite distorções locais, como em Gravataí 5 mil industriários do complexo automotivo da GM estarem no grupo prioritário, mesmo que a montadora e as empresas sistemistas estejam paradas desde março e, portando, são funcionários sem a obrigação de sair de casa.
Como é o caso do político Roger Correa, que tratei em Por que vereador de Gravataí foi vacinado contra COVID aos 31 anos.
O segundo, da idade, é bem contraposto pelo The Intercept em Entrevista: ‘O critério de faixa etária para organizar vacinação não basta. Ele é elitista e racista’, que conversa com idealizadores de um estudo publicado pelo Instituto Pólis, organização da sociedade civil de defesa do direito à cidade.
Os pesquisadores analisaram dados da Prefeitura de São Paulo obtidos via Lei de Acesso à Informação para entender como as mortes por COVID-19 se dividiram entre diferentes atividades profissionais e diferentes territórios da cidade.
Conforme o artigo, “eles constataram o que a parte mais pobre de São Paulo já sabe na prática: morre-se mais por COVID-19 nas periferias, onde trabalhadores precisam sair de casa para trabalhar e o acesso à saúde é mais precário”.
Segue: “Entre março de 2020 e março de 2021, o primeiro ano da pandemia, mais de 30 mil mortes por OVID-19 aconteceram apenas na cidade de São Paulo. Ao menos duas mil delas acometeram empregadas domésticas, trabalhadores da construção civil e motoristas de aplicativos. O grupo representa 6,5% das mortes na maior cidade do país e poderia ter ficado em casa – mas suas atividades nunca foram classificadas como não essenciais”.
Associo-me à conclusão de que a vacinação deveria levar em conta os aspectos territoriais e raciais, em conjunto com os de faixa etária e de mortalidade, para compor uma estratégia que priorize as áreas que mais sofrem com a pandemia.
“Em tempos de doses de vacina escassas, começar a vacinar pela periferia”, defendem os pesquisadores, “poderia inclusive diminuir a disseminação da COVID-19 nas áreas centrais da cidade, já que significaria imunizar trabalhadores que se deslocam e consequentemente se expõem mais ao vírus”.
Nas comorbidades, independentemente da idade, o elitismo já apareceu branco como o papel dos laudos e atestados apresentados nas filas da vacinação. Muito mais ‘brancos ricos’ diagnosticaram comorbidades e vacinaram do que ‘pretos pobres’.
São os fatos, aqueles chatos que atrapalham argumentos. Está lá, em estudo do Ministério da Saúde: em 2019 o índice de comorbidades, no Brasil inteiro, era maior na população branca do que em relação à população parda – muitas vezes também com comorbidade, mas sem acesso ao diagnóstico.
Trágico, mas na história do vírus os mais pobres foram infectados pelos mais ricos e as evidências são de que estão sendo vacinados depois.
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