coluna da marcilene

Sobre o tempo e o conhecimento inútil

O filósofo inglês Bertrand Russel escreveu, na primeira metade do Século XX, um texto em que fala sobre a importância do conhecimento que não se presta a um uso meramente prático, que ele chama de conhecimento inútil. Ele fala que esse tipo de conhecimento, capaz de dar prazer e proporcionar grandes alegrias, não pode ser produzido sem que haja tempo dedicado ao ócio.

No texto, que se chama “Elogio ao ócio” e que foi publicado no livro de mesmo nome, Russell fala sobre como o conhecimento foi deixando, ao longo do tempo, de ser visto como um bem em si, ou um meio, para transformar-se em “mero ingrediente da aptidão técnica”. A falta de tempo só nos permite conhecer aquilo que vai “nos ajudar na luta pelas coisas que consideramos importantes” e úteis.

E quem, em sã consciência, diria que os conhecimentos úteis não são importantes? Afinal, são eles que nos permitem desempenhar nossas atividades profissionais e ganhar dinheiro; são eles que nos ensinam modos de ser e de viver. Mas, segundo Russell, a principal vantagem do conhecimento inútil é incentivar a atitude mental da contemplação.

Por meio da contemplação, sem a preocupação com o tempo, somos capazes de permitir que novas e revigorantes ideias fluam, que novas perspectivas se coloquem, que novos pontos de vista sejam considerados. Não é sem razão que a meditação tem conquistado tanto espaço no mundo contemporâneo em que as pessoas não dispõem de tempo para, simplesmente, parar e não fazer nada por alguns minutos.

Será que é possível encontrar tempo em 365 dias (Ops! 366 dias) para contemplar por alguns minutos, para desligar (inclusive, o celular), para olhar o mundo sem pressa e sem a necessidade de opinar ou julgar? Se puder dar uma sugestão para esse ano que se inicia, e que tem um dia a mais no calendário, eu direi que você deve dedicar um pouco de tempo para o conhecimento inútil.

E esse conhecimento pode ser buscado em um livro, em uma revista abandonada em algum lugar à espera de tempo para ser lida, em uma boa prosa, no aprendizado de algo que não tenha qualquer utilidade imediata na sua vida, como aprender a fazer uma cebola caramelizada, por exemplo.

Eu diria, também, que você deve reservar um tempo em meio à correria diária para sentar-se em algum lugar, em silêncio, e apenas contemplar a paisagem à sua frente.

Abrir os olhos e ouvidos para a sabedoria do conhecimento inútil pode ser a chave para uma vida mais tranquila e menos angustiada, diante do imperativo do tempo que corre e das muitas exigências que a tecnologia nos impõe.

Também pode ser um modo de percebermos que somos seres coletivos, somos a materialização de muitos discursos e não apenas das circunstâncias da nossa realidade mais imediata.

Como disse Russell: “A vida confinada ao estritamente pessoal se torna, cedo ou tarde, insuportavelmente dolorosa. Somente através das janelas abertas para um universo maior e menos tormentoso é que os momentos mais trágicos podem ser suportados”.

 

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