opinião

O maior acordo político de Gravataí; e o ’contra’

Vitalina, Janaína, sindicalistas e vereadores de oposição, na Câmara

Vitalina Gonçalves, presidente do sindicato dos professores, me rende no ‘cantinho do castigo’ desde o 2017 em que minha redação foi além de “minhas férias” e criei a expressão ‘ideologia dos números’, alertando e apelando por uma solução para o Instituto de Previdência e Assistência de Gravataí.

Tanto o IPAG Previdência, com um cálculo atuarial de R$ 1 bilhão necessários para garantir as aposentadorias pelos próximos 15 anos, além de uma contribuição extra da Prefeitura que, em 2035 pode quase dobrar o custo com a folha de pagamento; quanto o IPAG Saúde, na UTI da sustentabilidade com uma dívida de quase R$ 10 milhões, atendimentos suspensos e projeção de, pelo terceiro ano consecutivo, o orçamento esgotado antes de dezembro.

Terça, a resposta dada pela profe e a diretora-presidente do Ipag, Janaína Balkey, transmite tranqüilidade: o SPMG e o governo Marco Alba avalizam a sustentabilidade do Instituto de Saúde dos Servidores de Gravataí (ISSEG), o novo ‘plano de saúde’ que substituirá o IPAG Saúde, que atendia cerca de 10 mil pessoas entre servidores ativos, inativos, pensionistas e familiares.

Quando levantei o dedinho para perguntar, na reunião nas cadeiras da assistência do plenário da Câmara, onde também participaram três vereadores de oposição, Rosane Bordignon, Dilamar Soares e Carlos Fonseca, até pedi desculpas pela desconfiança. Mas, em outras palavras, imperava perguntar se o acordo para criar o ISSEG não obedecia a ‘Lei Vampeta’, aquela máxima dita pelo folclórico ex-atleta, de que o clube fingia que pagava seu salário e ele fingia que jogava.

Vitalina foi mestre na tradução:

– Estás perguntando se o acordo é um faz-de-conta?

– Sim – respondi, explicando a dúvida: governo e sindicato, na véspera do ano eleitoral, comemoram juntos um game over, como tratei no artigo Game over; o exemplo da política de Gravataí.

O prefeito conseguiu o que queria, desvinculando o CNPJ do ISSEG do IPAG Previdência, o que faz com que, se o novo instituto quebrar, não seja seqüestrado recursos das aposentadorias para pagar o rombo no plano de saúde. E também não abriu mão de fixar um prazo para a contribuição da Prefeitura: R$ 8 milhões, até 2026, com correção pelo INPC.

Já a direção do sindicato também teve seu ganho, já que a assistência em saúde não foi extinta, como era a ameaça inicial de Marco Alba e levou até a uma greve cujo slogan era #IpagFica.

Aos que não entenderam, explico: a ‘Lei Vampeta’ se daria numa engenharia política do governo para evitar o desgaste de deixar o funcionalismo sem plano de saída, e numa artimanha do sindicato empurrando o problema para 2021 ao apostar na vitória de um governo de oposição que retomasse as contribuições ilimitadamente.

E, minha maior dúvida: a sustentabilidade. Não será o ISSEG um novo ‘Walking Dead’, como chamo o IPAG Saúde?

– Não fizemos uma negociação de brinquedo, nunca fomos desleais com nenhum governo. Chegamos ao consenso possível para manter a assistência em saúde. Não tem nada a ver com eleição – garantiu Vitalina.

– É um projeto de consenso – confirmou Janaína.

– Se o sindicato aprova, me sinto contemplada – aderiu Rosane Bordignon.

– Se a Irene e a Marli, cérebros do sindicato, disseram sim, para mim está bom – concordou Carlos Fonseca, fazendo a mesura a Irene Kirst e Marli Medeiros, há mais de uma década na direção.

– Seria burrice tudo isso para não dar certo – resumiu Dilamar.

– É um momento histórico – descreveu Alan Veira, da base do governo, antes de escolher seu vilão; depois conto quem é e volto à política.

Antes, um pouco do que governo e sindicato consideram pilares da sustentação financeira e social do novo plano no PL 45.

A tabela por idade, uma necessidade devido ao envelhecimento dos servidores, e os redutores de mensalidade conforme faixas salariais, já revelei em primeira mão no artigo Como calcular mensalidade do ’novo Ipag Saúde’.

– Há um viés social. Uma pessoa com 60 anos e salário de até R$ 1,5 mil pagaria R$ 590 na tabela cheia. Com o limitador, paga 30% – exemplifica Vitalina, observando que o mesmo vale para os dependentes.

– A cada seis meses é feito um cálculo atuarial para verificar a necessidade de reajustes para manter o plano vivo – observa Janaína.

Estes estudos balizarão a adesão, ou mesmo a manutenção, de participantes. Celetistas, por exemplo, seguem fora neste momento. A tábua atuarial aponta que um terço tem acima de 59 anos, o que torna não rentável ao plano estender o atendimento a esta classe de funcionários.

Conforme governo e sindicato, o atuário que fez os cálculos atesta que, mantidas as regras, o ISSEG será sustentável mesmo a partir de 2027, ano em que a Prefeitura para de colaborar com os R$ 8 milhões anuais. Os mesmos cálculos apontam que a dívida de quase R$ 10 milhões do plano com a Prefeitura e fornecedores será paga até o fim de 2020.

– E os reajustes dos fornecedores, que o governo já fez acima da inflação em outro momento? – questionou Dilamar.

Vitalina e Janaína responderam que será sempre estudado pelo conselho do ISSEG, no qual o sindicato terá assento em um CC responsável pela assistência em saúde.

A votação deve acontecer na próxima terça.

– Não estamos pressionando. Afinal, antes condenávamos a pressa em extinguir o Ipag Saúde. Negociamos por quatro meses com o governo, ouvimos a categoria em 41 assembleias nas escolas, projetamos mais de 20 cenários e por uma semana fizemos os ajustes nos cálculos – disse Vitalina, com a concordância de Janaína e de vereadores de governo e oposição de que terça é um bom prazo.

Janaína garantiu fôlego financeiro por mais um mês de transição, conseqüência das limitações em consultas e procedimentos nos últimos 90 dias.

– A receita mensal era de R$ 1,7 milhão e a despesa R$ 2,4 milhões, além da dívida. Reduzimos para R$ 1,6 milhão, o que garante agosto – informou, sobre uma realidade que já tinha tratado no artigo Ipag limita atendimentos; é, e será, a nova realidade.

A transição do Ipag Saúde para o ISSEG mantém os mesmos fornecedores até nova negociação, para não prejudicar o atendimento aos usuários.

 

Opino.

No papel e nos bites, nos cálculos do atuário e na fidúcia dos representantes do governo e sindicato, o novo plano é bom. Os próximos meses mostrarão a adesão dos servidores, ou a migração para planos privados mais baratos (e, invariavelmente, com menos serviços) ou a engorda na fila do SUS.

Já tinha elogiado os rascunhos do acordo nos artigos  A primeira tabela de contribuição ao ‘novo’ Ipag SaúdeUma solução para crise no Ipag Saúde e outros links relacionados. Admiti, inclusive, que no auge da crise gerada pelo projeto que extinguia o IPAG Saúde, não acreditava no diálogo, mas em dois monólogos inconciliáveis, travados entre históricos adversários políticos: o prefeito e a direção do sindicato.

Aí volto à política, sempre com seus bonzinhos e malvados. Para Alan Vieira, vereador que parece falar pelo governo sobre o tema, desde a CPI do IPAG, em a culpa da falência do plano foi diluída entre governos passados e a condescendência das próprias sindicalistas, o vilão da história foi a imprensa.

Eu, no caso, já que o Seguinte: é onde o assunto é há três anos tratado para além de releases publicados pelo Sindicato e pela Prefeitura em seus sites.

– A imprensa gosta de cizânia, seja para vender ou barganhar – deu nos dedos o vereador, manuseando a régua que lhe convém.

– Ouviu certinho, Martinelli? – pontuava sua fala na tribuna Vitalina, como que com uma palmatória vocal.

– É uma sessão solene para ti? – brincou o vereador Jô da Farmácia.

Fiquei feliz por, com minha ‘ideologia dos números’, ‘incomodar’ os envolvidos, com mais ou menos dificuldade em interpretar textos, mesmo que os longos e seriais artigos sobre a crise no IPAG Previdência e Saúde nunca tenham figurado entre os mais lidos. Afinal, a chatice do tema é diametralmente oposta à sua importância para as contas públicas (e o reflexo em toda população) e a vida dos segurados.

De consolo que netos, quando pesquisarem, talvez só encontrem as explicações do ‘chato do textão’, com seus fatos, aqueles chatos que atrapalham argumentos e passam longe de memes, posts caça-cliques, crítica ou elogio fácil ao sabor oportunista do momento.

Ao fim, após quatro meses de realidade, e ‘ideologia dos números’, que interesseiros e interessados que orbitam a política adoram confundir com ‘terrorismo’, o prefeito Marco Alba e a presidente do SPMG Vitalina Gonçalves firmaram um caloroso e sorridente aperto de mão.

Parabéns!

Mas há reticências.

Por mania, observo on e o off na casa legislativa. E a política é uma nuvem que às vezes está aqui, e logo ali, como ensinava o falecido. Pelo menos um vereador da oposição tem dúvidas sobre o novo ISSEG. E sua opinião carrega o peso de sua influência na Câmara, e também de candidato a prefeito:

– Governo e direção do sindicato aprovam o acordo, isso eu sei. Quero ouvir quem vai pagar. Sem usuários, o plano não sobrevive. Pena o ISSEG não ter sido submetido a uma assembléia geral do funcionalismo. Minha tendência é votar a favor, mas estou estudando. Não quero ser avalista de uma fake news – diz Dimas Costa, que, por obvio, nas teorias conspiratórias da política, possivelmente desconfie de um acordo que tem a aprovação de adversários seus: Marco Alba e Daniel Bordignon.

Se for um solitário voto – ou acompanhado de talvez de Paulo Silveira, também candidato a prefeito e, como Dimas (aparentemente ‘ex-queridinho’), não citado por Vitalina em seu pronunciamento na tribuna da Câmara, o que foi percebido não só pelo jornalista, mas por outros vereadores –certamente encarnará o ‘contra tudo que está aí’ e pelo menos parecerá fazer uma aposta contra o ISSEG, para, no futuro, se tudo der errado, dizer: “eu avisei”.

Porque, aprovado, o novo ISSEG será.

Se Alan Vieira, ou mais alguém, leu até aqui o textão, respondo o desafio feito por ele na sessão. Como nos momentos de crise entre governo e sindicato chamei a relação de Jogos Vorazes, o vereador perguntou qual seria o nome do filme, agora, com o histórico acordo.

Não uso um filme, mas uma série Netflix.

Designated Survivor, o ‘House of Cards do bem’, com Marco Alba não como um malvado Frank Underwood, e sim o bonzinho Tom Kirkman.

 

O PROJETO

Para ler o projeto na íntegra e entender as tabelas de mensalidades clique aqui.

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