Aqui Onde se Espera
Aqui onde se espera
– Sossego, só sossego –
Isso que outrora era,
Aqui onde, dormindo,
-Sossego, só sossego-
Se sente a noite vindo,
E nada importaria
-Sossego, só sossego-
Que fosse antes o dia,
Aqui, aqui estarei
-Sossego, só sossego –
Como no exílio um rei,
Gozando da ventura
– Sossego, só sossego –
De não ter a amargura
De reinar, mas guardando
– Sossego, só sossego –
O nome venerando…
Que mais quer quem descansa
– Sossego, só sossego –
Da dor e da esperança,
Que ter a negação
– Sossego, só sossego –
De todo o coração ?
(Fernando Pessoa)
***
Aqui é onde se espera.
Cada dia, acordo com o sossego de uma casa em silêncio. Leio um livro. Atendo meu filho mais velho, que demanda pouco trabalho, apenas alguma atenção.
Sossego.
Dia e noite.
Sossego.
Num exílio.
Por aqui, espero que o sossego acabe, nego-o.
Troco a calmaria pelo choro que pede alimento e amor.
(Lembrarei disto em frente ao espelho, as olheiras fundas)
Aqui é onde se espera.
A espera está no fim.
Em minha provável última semana de gestação, espero para ver o rosto do Artur, meu segundo filho.
Espero para ver o rosto do Augusto, meu primeiro filho, conhecendo o rosto do meu segundo filho.
Escrevo enquanto espero.
Aqui, onde se espera.
Sei que repito-me: nas palavras escritas, na sensação já vivida de esperar, na ansiedade de um segundo parto.
Aqui onde se espera.
A espera está no fim.