Nos Jogos Vorazes disputados pelo governo Marco Alba e o sindicato dos professores, Vitalina Gonçalves e as professoras que comandam o SPMG desde sempre, mostraram força contra a extinção do Ipag Saúde, na sessão desta terça, quando lotaram o plenário e a rua José Loureiro da Silva, em frente ao Kinder Ovo da Câmara.
Além do grito em decibéis majoritariamente femininos, silenciosamente articularam nos bastidores a apresentação de um projeto de lei em contraponto ao PL 19, encaminhado pelo prefeito nesta segunda e que extingue o plano de saúde que atende cerca de 10 mil pessoas, entre servidores ativos, inativos, pensionistas e familiares.
Dimas Costa, que protocolou o texto escrito pelas sindicalistas às 16h58, dois minutos antes do fechamento da secretaria do legislativo, ganhou a estrelinha das professoras.
Um pouco de contexto antes de reproduzir a comentar o PL 28, de Dimas, que você lê na íntegra, artigos e justificativa, clicando aqui.
Se a Globo tivesse feito a cobertura da sessão de ontem, o jornalista enviado certamente teria estranhado, já que Dimas é do PSD, partido do ‘liberal’ Gilberto Kassab (sem bem que foi aquele que apagou a luz do governo Dilma e acendeu no governo Temer…). Já o SPMG é filiado à CUT e Vitalina, entre uma foto no palco com Lula, e uma hashtag #lulalivre, é a cara da esquerda de Gravataí na Frente Brasil Popular.
Mas tem um passado nesse presente.
Dimas foi eleito pelo PT, em 2013, e saiu apenas quando o partido foi esvaziado por Daniel Bordignon que, em sua obsessão por voltar a ser prefeito, se filiou ao PDT para livrar sua propaganda de campanha daquelas duas letrinhas – a 16ª e 20ª do alfabeto – tão odiadas por eleitores em 2016 e, hoje, talvez até mais na Gravataí que deu sete a cada dez votos para o ‘mito’ Jair Bolsonaro.
Em resumo: para quem conhece a aldeia, nenhuma surpresa; Dimas defendeu o funcionalismo como o ‘novo Bordignon’ que é.
Por apresentar o projeto, e pelos aplausos nos discursos que fez na sessão, ficou claro que o vereador que foi o candidato a deputado mais votado em Gravataí – superando Patrícia Alba e Jones Martins, candidaturas do MDB do prefeito – é o novo queridinho do funcionalismo.
O que tem sua lógica. E explico. Rosane Bordignon (PDT) e Paulo Silveira (PSB), os dois outros oposicionistas canhotos com mais conteúdo, fizeram discursos-padrão, ao estilo ‘nenhum direito a menos’. A esposa de Bordignon, no afã de agradar as colegas, cometeu inclusive um erro grave: disse que, num governo dela ou do marido, mesmo que seja extinto, o Ipag Saúde será retomado.
Não direi que é demagogia, o substantivo feminino que suaviza a mentira, porque Rosane é grande demais para isso, com seus 44 mil votos como candidata a prefeita em 2016. A professora, que não foi à última assembleia do sindicato, certamente não sabia que desde 2003 é proibido criar assistência em saúde em institutos de previdência municipal, o que a própria presidente Vitalina Gonçalves alertou ao microfone naquele dia 12.
Ok, e Dimas? Dimas fez a sua, legislou, apresentou uma proposta, mesmo que demagógica, factível, e experimentou uma reação incrível, já que concordou com o prefeito ao retirar a contribuição da Prefeitura, mas saiu como herói. Distribuiu cópias de seu projeto no plenário e saiu, de seu jeito estabanado, derrubando papéis para panfletear junto aos servidores que ficaram na rua, devido à superlotação do plenário, onde foi recebido aos gritos, tipo torcida de futebol, Dimaaaaas, Dimaaaas.
Como tenho a mania de atrapalhar os preguiçosos da leitura e gostar de contar a história toda, afinal, texto jornalístico também é documento histórico, antes de voltar ao projeto de Dimas, porque é a conclusão de tudo, faço parênteses de que os vereadores governistas fizeram o que tinham que fazer na sessão: ficaram quietos, porque a decisão de extinção já está tomada pelo governo e entrar em debates é ‘dar tamanho’ aos oposicionistas. Assim é a política. Os 11 votos para aprovar o PL 19 estão garantidos.
Como um folclórico colchete, relato também que Dilamar Soares, sempre um caso a parte, criticou a cobertura do Seguinte: para o ‘caso Ipag Saúde’: como os petistas de ontem, e os bolsonaristas de hoje, encarnou o ‘Globo Mente!’.
Mas, vamos ao que é notícia, que é o PL de Dimas, agora que o leitor conhece os personagens, interessados ou interesseiros: não sou muito bom de contas, então espero nesta quinta, na assembleia do sindicato dos professores, a partir das 13h no CTG Aldeia dos Anjos, a partir da exposição das mestres entender a matemática. Dimas propõe que os servidores arquem com todo custo do plano, aumentando alíquotas e regulando serviços, caso necessário.
Pela complexidade financeira, as 10 mil pessoas atendidas pelo Ipag Saúde precisam ficar atentas. Como um plano que fechou 2018 com uma dívida de R$ 6,4 milhões com médicos, dentistas, hospitais, clínicas e laboratórios, vai sobreviver com pouco mais da metade do orçamento? No ano passado, o plano tinha R$ 25 milhões, 5,5% da contribuição de servidores e familiares, e 4,5% de contribuição da Prefeitura. O déficit projetado para este é igual ou maior. Pela proposta de Dimas-direção-do-sindicato, para tapar o ‘rombo do rombo’, os funcionários e dependentes terão que pagar mais para manter o plano, já que a sócia paritária, a Prefeitura, vai ser excluída da conta.
Inegável que, politicamente, é uma jogada genial. Ganha Dimas, ganha a direção do sindicato. Se assim o funcionalismo entender na assembleia de amanhã, a categoria associa-se também à aventura. Desenhando: aprovada o projeto de Dimas, o Ipag Saúde se mantém vivo, mesmo que as custas de mais descontos para o funcionalismo e mais dívidas para a Prefeitura. Extinto, lembrem, por lei jamais poderá ser recriado, nem que Vitalina seja a próxima prefeita.
Acredito que a direção do sindicato será didática na assembleia desta quinta. Em nome da verdade vai explicar para a categoria que, apoiando o PL de Dimas, os servidores terão que fazer o sacrifício de pagar mais pelo menos até 2020. Com a sobrevivência do Ipag Saúde até lá, mesmo que o déficit passe dos R$ 20 milhões, o SPMG poderia negociar com o próximo prefeito.
Alguém pode estar se perguntando: então, porque o prefeito não aceita a proposta, já que não mais precisará pagar a parte da Prefeitura e evita uma greve de uma semana, um mês ou ene dias? Arrisco: não vai aceitar porque é o jeito Marco Alba de ser. Não por ódio ao funcionalismo, como vendem os adversários, nem pela vaidade de não perder essa para o menino Dimas, mas porque é um pragmático e o que mais quer é deixar como legado uma gestão de equilíbrio das contas públicas.
Marco sabe que, mesmo sem a contribuição do governo, a Prefeitura segue como o CNPJ garantidor do Ipag Saúde. Assim, qualquer conta que restar, quem paga é o cofre público. Se para manter os serviços o Ipag, por exemplo, precisar restringir uma cirurgia ou uma obturação num dente, e o usuário for a justiça, vai ganhar a autorização para o procedimento, porque ele tem um contrato assinado, como num plano privado, que lhe assegura uma cesta de procedimento. Ao fim, quem vai pagar é a Prefeitura. Os sequestros de receita seriam feitos da conta o Ipag Previdência, para o qual o município já drena R$ 60 milhões por ano entre contribuição patronal, parcelamento de uma dívida de R$ 120 milhões e uma alíquota completar que, para enfrentar um déficit atuarial bilionário, em 2019 é de 18% sobre a folha de pagamento, e em 2035 será de 72%, para garantir as aposentadorias dos servidores pelos próximos 15 anos.
Para quem ainda não entendeu a voracidade do jogo, a ideia do sindicato, que ganhou em Dimas o melhor porta-voz que poderia ter na Câmara, é manter o Ipag vivo, pedalar as dívidas e apostar que um prefeito de oposição será eleito em 2020, para poder negociar a volta de uma contribuição da Prefeitura a partir de 2021. Se o Ipag Saúde fosse viável, como sustenta a justificativa do PL de Dimas, bastaria o SPMG criar um CNPJ, montar um plano de saúde e arrecadar a contribuição dos servidores.
Só que, aí, não teria a Prefeitura de orçamento quase bilionário como garantia de que, se quebrar, os cofres públicos pagam a conta. É o que Marco Alba não quer mais fazer em seu governo. Lembrem-se do mantra: ‘300 mil habitantes não podem pagar por 5 mil servidores’.
É aquela coisa, o direito de cada um acaba quando alguém reage ou chama a polícia. Na guerra de narrativas entre o sindicato e o governo, em tempos binários como os de hoje, inevitavelmente alguém será o vilão da história. Durmam a ideia, que a princípio pode parece tresloucada, mas uma greve só ajuda Marco Alba ganhar apoio popular – e volto a isso num próximo artigo.
Imagina se o prefeito enlouquece e propõe um plebiscito para consultar a população, a maioria usuários do SUS, se a Prefeitura tem que contribuir, ou ser a fiadora de um plano de saúde dos servidores e familiares?
Não é torcida ou secação, porque só um sádico não fica preocupado com a possibilidade das 10 mil pessoas atendidas pelo Ipag Saúde engrossarem as filas do SUS. A única coisa fácil é dizer que o jornalismo é a empregada doméstica do poder. Quando ouço isso, sempre recomendo: experimenta perguntar a opinião da diarista…
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