No Dia Internacional da Mulher, hoje, 8 de março, o Seguinte: foi conhecer a história de três mulheres, escolhidas aleatoriamente. Não é possível entrevistar todas, de todas as profissões, por isso…
Bruna Boff tem aparência de menina frágil, delicada, criada cercada de mimos e cuidados. Só aparência. Aos 24 anos, esta acadêmica de Engenharia Civil da Ulbra de Canoas é estagiária num canteiro de obras da MRV Engenharia onde a predominância é da força bruta masculina que lida com ferro, blocos de concreto, massa de cimento.
Ana Maria Machado tem 48 anos, mora em Canoas e vem todos os dias a Gravataí para vender milho verde, rapadura ou flores num sinal de trânsito da avenida Dorival de Oliveira, altura da parada 79. Mãe de seis filhos, ela é aposentada e usa a atividade como complemento de renda para manter a casa que divide com dois filhos menores.
Aos 30 anos, Daniela Rodrigues Libreloto é solteira, tem uma filha de 14 anos e trabalha como frentista em um posto de gasolina da cidade. Aliás, ela é frentista há 10 anos, mais ou menos, e garante que tem orgulho da profissão. Tanto que se a filha optasse por seguir seus passos, diz que aprovaria a decisão, com toda certeza.
O que as três têm em comum?
São mulheres que não têm receio de enfrentar o dia a dia em meio a um universo onde a igualdade de condições com os homens ainda é muito questionada. E são mulheres que estão, de alguma forma, batendo de frente com o sexo oposto, ocupando o lugar antes ‘só deles’ ou convivendo com eles por força das atividades que escolheram.
Bomba de álcool
Daniela, a frentista, conta que por causa da sua profissão enfrenta preconceito principalmente no meio feminino e, pior, entre as próprias amigas. Elas jamais aceitariam colocar um uniforme e um boné com uma marca de combustível e nunca ficariam oito horas por dia abastecendo os carros.
— Entre os clientes, tanto homens quanto mulheres, nunca tive problemas. Eles respeitam a gente e respeitam a profissão — conta Daniela, enquanto luta com a mangueira da bomba de álcool para abastecer um táxi que acabou de estacionar.
E explica:
— Como o álcool tem saído bem menos a gente quase nem usa, daí a mangueira fica ressequida e difícil de dobrar.
E ela gosta da profissão em que trabalha há cerca de uma década. Há um ano, mais ou menos, está em um posto da Dorival. Para ela, ser frentista é uma profissão como qualquer outra desde que seja desempenhada com honestidade e dignidade.
Sobre o dia da mulher, Daniela arrisca:
— Eu acho, sim, que as mulheres têm direitos iguais aos dos homens e estão conquistando cada vez mais este espaço.
: Daniela diz que se a filha de 14 anos quisesse ser frentista, como ela, certamente teria seu apoio
Rosas vermelhas
Sob o sol forte do final da manhã desta quarta-feira das mulheres, uma ‘serelepe’ Ana Maria Machado serpenteia entre os carros sempre que estes param no sinal vermelho. Carrega nos braços um punhado de rosas vermelhas previamente embaladas para que os homens ofertem às esposas, namoradas, noivas, companheiras, amantes, amigas ou seja lá o título que lhes quiser atribuir.
— Ah, hoje tem boa procura sim — conta, oferecendo rosas aos motoristas que, na maioria, sequer baixam o vidro para que o ar quente da rua não invada o gelado ambiente do automóvel.
: Ana vem de Canoas para vender produtos – como as rosas de hoje – no sinal de trânsito
São rosas que custam R$ 5,00 cada, e Ana diz que não volta para casa antes de vender pelo menos 300 até o final do dia. O lucro, que não diz quanto é, serve para complementar a aposentadoria, dinheiro que usa para custear as despesas que tem com dois filhos que moram com ela, de 14 e 16 anos.
Separada, Ana considera que o Dia da Mulher deve ser todos os dias.
— A gente tem que ser os dois ao mesmo tempo, homem e mulher. Não é difícil, só as vezes é que fica um pouco mais complicado. Mas a gente se vira e acaba ficando tudo bem — diz a ‘pãe’ e vendedora ambulante.
Loira de olhos claros
Mais velha entre quatro irmãos, filha de um serralheiro e de uma dona de casa, Bruna Boff espera colar grau no ano que vem. Cursando Engenharia Civil, é estagiária num canteiro em que as obras de 240 apartamentos de um e dois quartos ainda estão brotando do chão, onde foram plantados na forma de estacas de ferro e concreto com 10 metros de profundidade.
A loira de olhos claros não vê problemas em conviver profissionalmente em meio aos brutamontes acostumados com sol forte, cimento, blocos de concreto, vigas pré-moldadas, ferro, terra revirada e, enfim, tudo que envolve uma obra de grande porte. Com uma prancheta nas mãos e capacete branco na cabeça, anda com desenvoltura.
Sua função, como o projeto foi concebido por uma equipe de engenheiros da construtora, é fiscalizar para que na hora de tirar o desenho do papel a coisa seja feita de maneira correta, na posição certa, com as especificações previamente determinadas.
: Bruna diz que as construções sempre lhe atraíram e por isso optou por cursar engenharia
Mãe arredia
Mas a Bruna não chegou a cogitar outra profissão?
— Não, nem pensei. Acho que sempre quis ser engenheira porque desde cedo gosto de obra. Uma construção em andamento sempre me chamava a atenção e estar em um canteiro de obras é uma realização — garante, voz suave.
Dizendo que tem apoio da família, conta que só a mãe, as vezes, fica mais arredia porque a filha trabalha em meio a quase só homens. Ou só com homens. São 40 homens tocando a obra onde ela trabalha, e vão ser mais daqui alguns dias.
No prédio em construção, embora a MRV Engenharia tenha mais 12 mulheres nas três plantas em andamento em Gravataí, são só a Bruna e mais três, todas na área administrativa. No estado a empresa tem 113 mulheres, sendo 71 delas botando literalmente a mão na massa e as demais em cargos administrativos como o de Bruna.
— Me sinto bem a vontade mesmo sendo só eu entre tantos homens. Nunca tive problemas porque todos me respeitam — diz, acrescentando que desde os 18 anos convive nesse universo e garantindo que nunca foi alvo do assédio masculino.
O objetivo de Bruna é se tornar uma profissional reconhecida e de sucesso na engenharia.
E assegura:
— A mulher está cada vez mais valorizada no mercado de trabalho. Isso também é fruto da sua preparação, da sua capacitação cada vez melhor. E há certas áreas profissionais que favorecem as mulheres porque somos mais detalhistas, mais organizadas, e temos uma visão mais ampla sobre o todo.