— Nossa, é a Larissa, do Diário de Larissa!!!
Era uma menina encontrando outra, da mesma faixa etária, no pátio da escola. A Larissa, ou a La, virou celebridade nas redes sociais. Ela virou youtuber.
A cena é fictícia, faz parte de um dos capítulos da websérie Dupla de Dois, que tem roteiro da dupla gravataiense Guilherme Rovadoschi, 23 anos, Arthur Menezes, 24, mas não está muito longe da realidade. É assim com a Lorena Eltz, por exemplo. Do seu quarto na casa simples da Cohab B, em Gravataí, ela se comunica com o mundo. E é, sim, uma celebridade.
— Eu nunca imaginei que isso fosse possível, que em qualquer lugar do mundo alguém poderia me ver e dar importância para o que eu faço — diz a adolescente de 17 anos.
No canal da Lory Eltz, que já conta com mais de 365 mil inscritos, e vídeos com mais de um milhão de visualizações, já chegaram mensagens da China, Japão, Estados Unidos ou Portugal.
— Pedem para eu ir para lá e demonstram um carinho imenso — conta a Lorena.
Você pode pensar que ter um canal no Youtube é coisa simples. Pegar um celular, ou uma câmera, botar para gravar e sair fazendo o que vem à cabeça. No melhor estilo “do it yourself”. Em parte, é isso mesmo, mas para uma turma de youtubers de Gravataí, não é bem assim. Eles ensinam: para se estabelecer e ganhar relevância na rede, é preciso “ter conteúdo”.
— Independente do que for tratar, mesmo que sejam vídeos simples, precisa ter algo para dizer, passar uma mensagem para o público e ao mesmo tempo ser divertido. Mostrar a realidade, principalmente, faz com que as pessoas se identifiquem comigo. Eu gosto desse desafio — diz a youtuber Isadora Quadros.
Logo nos primeiros vídeos, a moradora do Centro de Gravataí, que conta com 13 mil inscritos no seu canal, mostrou suas comprinhas de roupas em um brechó. Aproveitou o momento para falar sobre sustentabilidade.
Isadora tem 17 anos, e começou a postar no Youtube com 15. Ela já era conhecida na região pelas participações em concursos de beleza. São cinco faixas de miss representando o Rio Grande do Sul. Na rede social, porém, as possibilidades de mostrar muito mais sobre si mesma foram multiplicadas.
Entre as postagens mais recentes, Isadora fala desde a rotina na praia ou dicas de maquiagem, até assuntos como o diagnóstico de Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) ou bulimia.
— Eu procuro sempre manter uma base, falar de mim, e fazer com que o máximo de pessoas se identifiquem. O mais importante nessa rede é ser você mesma. As pessoas percebem quando não é a realidade e não há naturalidade — diz ela.
Produção para o Youtube
A websérie Dupla de Dois tem canal próprio no Youtube. O primeiro capítulo foi ao ar em março, e já tem 550 inscritos. A ideia saiu das cabeças de dois novatos nesta rede. Guilherme e Arthur são roteiristas, mas com experiências na televisão, mais especificamente, a TV a cabo. Como eles mesmos dizem, estão aprendendo a ser youtubers.
— Claro que, comparado ao que geralmente se vê entre os youtubers, o nosso trabalho é muito complexo. Tem roteiro, uma equipe de 12 pessoas, produção e cada capítulo leva horas para ser gravado. A linguagem, porém, é a mesma. Talvez a série nunca se torne um fenômeno tipo Wenderson Nunes, mas pode ser um Porta dos Fundos — brinca Rovadoschi.
O Arthur é um pouco mais familiarizado com o meio. Desde a faculdade de jornalismo, acompanhava os movimentos no Youtube.
— Sempre cuidei os movimentos que davam certo ou não na rede. A lógica desse meio é que o público não é mais só um receptor. Ele quer se identificar, interagir. E isso faz ele consumir e se engajar — explica.
A dupla trabalha nos roteiros das vídeo-aulas do Ensino à Distância, na Unilasalle, em Canoas. E a ideia de criar os personagens Larissa, a La, e Alex Salles, o Salles, em diálogos que, no projeto inicial, seriam curtos e rápidos, como tirinhas interpretadas, era justamente buscar a identificação. Neste caso, entre os estudantes do Ensino Médio, por exemplo.
— Queríamos trazer essa gurizada, e a que já cursa o EAD para dentro do campus. Porque quem cursa o EAD também vive essa rotina. O Dupla de Dois trata do que acontece com a La e o Salles desde a matrícula até o fim do curso. São coisas do dia a dia, diálogos curtos, com um humor ácido, e que comunicam mesmo com o nosso público — diz Rovadoschi.
No terceiro capítulo, por exemplo, a La cota que é youtuber. Rola aquela trollada básica e o caminho fica aberto para o que vem adiante. A partir de agora, ela vai descobrindo as possibilidades do próprio canal. E o público vai junto nessa viagem.
— A própria linguagem das vídeo-aulas, que já tínhamos uma experiência, é muito Youtube. Tem um âncora, um professor, uma animação. Nas vídeo-aulas o desafio é trazer aquela naturalidade para o aluno, como um diálogo direto, sem se tornar desinteressante — afirma Rovadoschi.
Pois aquele projeto simples se tansformou em algo bem mais arrojado. A webserie já tem três capítulos no ar. Serão 10 por temporada, todos já gravados. E a próxima tem início previsto para agosto.
: A Lorena criou um canal, e agora lidera uma causa | Imagem: EDUARDO TORRES
Um canal que virou bandeira
Hey, Lorelys!
É assim que a Lorena Eltz dá as boas vindas aos seguidores do seu canal a cada novo vídeo. Tudo começou em 2015, depois de algum tempo de gravações, sozinha no seu quarto, sem postar nas redes. Quando Lorena apareceu para o mundo, virou fenômeno, e símbolo de uma causa. Chegando ao terceiro ano do canal, ele se tornou uma forma de criar contato entre portadores e familiares de portadores da Doença de Crohn. A partir do trabalho da Lorena, uma associação está sendo criada.
— É muito fácil fazer um vídeo e criar um canal, mas para se manter, precisa passar uma mensagem e fazer a diferença — ensina a menina de 17 anos.
Desde o primeiro vídeo, que hoje já tem 1 milhão de visualizações, Lorena fez a diferença. Era algo simples: “me conhecendo melhor”. Como uma apresentação do canal.
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A história da menina que virou fenômeno no Youtube
É que a apresentação desta menina da Cohab B, então com 14 anos, era também a revelação sem mitos da vida com a rara Doença de Crohn. Diagnosticada em 2007, a rotina dela desde sempre foi tomada pelos exames e tratamentos, até o transplante de medula, em 2016.
— Com oito meses de canal, as pessoas falavam que eu estava fazendo tão bem para elas, então, eu percebi que não poderia parar de fazer as postagens quando estava no hospital, porque isso fazia sentido para essas pessoas — lembra.
Em 2016, quando foi para São Paulo fazer o transplante, foram seis meses de internação. Neste tempo, o canal virou um vlog com o que acontecia durante o tratamento. Foi nesta época que o canal bombou.
— Eu estava preocupada, deixei 10 vídeos prontos antes de viajar, depois, vi que seria importante mostrar a realidade. Fiquei sem cabelo e não me envergonhei disso, porque era como eu estava mesmo — conta.
A Doença de Crohn é uma enfermidade na qual o sistema imunológico ataca o próprio organismo, sobretudo o sistema digestivo, provocando inflamações no intestino. O tratamento envolve o transplante da própria medula do paciente. Após este processo, o tratamento segue. A cada dois meses, Lorena volta a São Paulo para isso, mas agora tem motivos mais especiais para os deslocamentos. A remuneração com os vídeos e os patrocínios têm garantido o tratamento da Lorena.
Neste mês, ela lançou o seu livro: “Hey, Lorelys” em três cidades paulistas. No dia 5 de maio, o lançamento será na Livraria Santos, do Shopping Gravataí. De certa forma, a menina começou a realizar um dos seus sonhos. Quem acompanha o canal, sabe que Lorena sonha em conhecer o mundo. Um mapa mundi estilizado ilustra o seu quarto/estúdio. Quem sabe ela agora não consegue concretizar o desejo de viajar o mundo, literalmente, para passar a sua mensagem?
Curso para virar um youtuber
Faça você mesmo. Mas faça bem feito.
Se este é o novo lema para se destacar na rede, a Escola QI, de Gravataí, criou uma forma de ajudar a quem deseja criar um blog ou um canal no Youtube. Um curso profissionalizante para bloggers e youtubers.
— Temos uma procura bem grande de uma galera mais nova mesmo. Entre os 12 e os 30 anos. O curso tem dicas sobre a forma de gerenciar e monetizar na rede — explica a coordenadora do curso, Cristina Jung.
Segundo ela, com a popularização do Youtube, o nível do conhecimento técnico das ferramentas para se operar a rede com mais qualidade caiu bastante. E o entendimento de que basta ligar a câmera ou celular e sair gravando não costuma dar muito certo.
— Atender à demanda de quem assiste é o desafio hoje. Vai se destacar o que for interessante a um público X. Já houve ondas de “modas” com canais de gamers, maquiagem ou comida. Hoje, a rede se define muito por nichos. Quem aposta na qualidade e na mensagem com conteúdo, tende a se dar melhor — acredita a professora.
O curso dura 75 horas, com uma aula semanal de três horas. São lições que vão desde o desenvolvimento da produção gráfica para blogs e Youtube até o design, web design e game design. Atualmente, entre os cinco núcleos da QI, são 115 alunos em meio ao curso.