Sabe quando você lê algo tão genial que imediatamente pensa: “Preciso escrever sobre isso”? Foi exatamente o que aconteceu quando me deparei com uma crônica do icônico Luis Fernando Veríssimo, que me fez dar boas risadas e, ao mesmo tempo, refletir profundamente sobre a vida e sobre o que, afinal, significa realmente “interpretar”. O tema central era uma história curiosa e quase hilária sobre Marlon Brando, o gigante do cinema, e um exercício nada convencional proposto por Lee Strasberg, seu mestre no famoso curso de interpretação. E é sobre isso que vou contar agora, inspirada por Veríssimo, claro, e pela história da galinha de Brando.
Imagine a cena: um galinheiro, aparentemente comum, mas com um toque de surrealismo. Lee Strasberg, o renomado professor de atuação, propôs um exercício nada menos que intrigante para seus alunos. A tarefa era simples: todos deveriam se comportar como galinhas dentro de um galinheiro prestes a sofrer um ataque nuclear. Um cenário apocalíptico e angustiante, certo? O caos seria inevitável. As galinhas, criaturas instintivas por natureza, começariam a ciscarejar desesperadas, os olhos arregalados, as penas eriçadas, tentando entender o que estava acontecendo. Todos, sem exceção, deveriam reagir a essa iminente tragédia. Todos, menos um.
Lá estava Marlon Brando, em seu poleiro imaginário, inabalável, com os olhos serenos, como se o apocalipse fosse algo perfeitamente normal. Era como se o mundo estivesse acabando ao redor, mas Brando, em sua galinha desinformada, permanecia imóvel e tranquilo. Quando o exercício terminou, Strasberg, esperançoso por alguma explicação brilhante, olhou para Brando, que, com sua calma característica, respondeu: “Como uma galinha saberia que está prestes a acontecer um ataque nuclear?”
Silêncio.
E ali estava a chave para entender o que Brando queria nos ensinar: a galinha não sabia do cataclismo, e por isso não se agitou. Sua natureza não envolvia antecipação ou preocupação com algo que não era real para ela. Brando, com sua genialidade, havia se desapegado da visão dramática e do medo, abraçando o que era, na verdade, o realismo puro: a galinha não sabia e, portanto, não se abalaria.
A história, hilária e ao mesmo tempo reflexiva, foi meu ponto de partida para essa crônica. Enquanto me divertia com a situação — o mestre Strasberg tentando incutir pânico nas galinhas e Brando, o “estranho” do grupo, mantendo-se tranquilo em seu poleiro —, comecei a refletir sobre a nossa própria maneira de viver. Quantas vezes não nos agitamos sem necessidade, antecipando catástrofes que sequer existem? Às vezes, vivemos como aquelas galinhas nervosas, correndo de um lado para o outro, nos preparando para um apocalipse que só existe em nossas cabeças.
O exercício de Strasberg, que inicialmente parecia ser sobre como reagir ao caos, se transformou, na verdade, em uma lição de como a verdade de uma personagem deve ser compreendida. Marlon Brando não estava apenas atuando como uma galinha; ele estava desconstruindo o conceito de reação exagerada, de medo do desconhecido. Sua galinha não sabia que estava prestes a ser destruída, e por isso ela não se desesperava.
A lição que Brando nos oferece, com sua galinha desinformada, vai além do palco. Ele nos ensina que, muitas vezes, o segredo do realismo e da tranquilidade está em não antecipar o que não sabemos. O segredo está em aceitar o desconhecido sem medo, sem ansiedade. Não é sobre ignorar as dificuldades da vida, mas, sim, sobre entender que, assim como a galinha de Brando, podemos viver sem a necessidade de saber tudo sobre o que está por vir.
E assim, como Veríssimo nos faz rir e refletir, essa história de Brando e sua galinha se tornou para mim uma metáfora viva. Às vezes, devemos ser mais como a galinha desinformada: não sermos obcecados pelo futuro e, por isso, não nos desesperarmos por antecipação. Quem sabe, se fizermos isso, viveremos mais tranquilos, sem as corridas frenéticas pelo galinheiro da vida.