A preservação do patrimônio, tanto material quanto imaterial, é um dos pilares fundamentais para a construção e fortalecimento da identidade de uma cidade. Esse processo não contribui apenas para a manutenção de tradições e histórias, mas desempenha um papel crucial no desenvolvimento urbano, social e econômico. No Brasil, essa preservação é respaldada por um conjunto robusto de leis, que garantem a proteção do patrimônio cultural como um bem coletivo e fundamental para a memória de um povo.
A Legislação que protege o patrimônio cultural
O Estado brasileiro tem reconhecido a importância do patrimônio por meio de suas leis. A Constituição Federal de 1988, no artigo 216, define o patrimônio cultural como “os bens de natureza material e imaterial” que têm valor histórico, artístico, arqueológico, etnológico, entre outros. Essa base legal é complementada por legislações como o Decreto-Lei nº 25/1937, que estabelece o regime de tombamento para proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, e é o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), que coordena as ações de preservação no país. Em nível estadual, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE), no Rio Grande do Sul, tem sido fundamental para garantir que marcos históricos locais, como a Igreja São Miguel Arcanjo, nas Missões, e o Mercado Público de Porto Alegre, sejam mantidos como testemunhos do passado e símbolos da cultura gaúcha.
Além disso, o patrimônio imaterial também é protegido por leis como a Lei nº 11.645/2008, que torna obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena nas escolas, contribuindo para a valorização e preservação das tradições culturais de grupos marginalizados.
A filosofia da memória e identidade cultural
Para entender a importância de preservar o patrimônio, é essencial considerar as palavras do filósofo francês Paul Ricoeur, que disse: “A memória é a base da identidade.” O patrimônio é, de fato, a memória coletiva de uma cidade ou nação, e é por meio dele que as gerações se conectam com suas origens e valores culturais. Como também afirmou o filósofo brasileiro Paulo Freire, “A cultura é uma forma de leitura do mundo.” Preservar o patrimônio material e imaterial é, portanto, garantir que a cultura de uma cidade seja lida e compreendida por todas as gerações, enriquecendo a vida dos habitantes e permitindo que eles se reconheçam na história que construíram.
A preservação do patrimônio é uma forma de garantir que uma comunidade se reconheça em suas raízes e identifique sua continuidade no futuro. O filósofo Edmund Burke já afirmava: “Um povo que não se orgulha de seu passado não terá futuro.” O patrimônio é um dos pilares sobre os quais uma cidade constrói sua identidade, e seu valor vai além do tangível: ele é a alma de um povo.
Exemplos de patrimônios no Rio Grande do Sul
No Rio Grande do Sul, muitos exemplos de preservação destacam a importância do patrimônio material e imaterial na construção de uma identidade cultural sólida. As Missões Jesuíticas, tombadas pela UNESCO como Patrimônio Mundial da Humanidade, representam um marco histórico e arquitetônico de grande importância, não apenas para o Estado, mas para toda a América Latina. A Igreja São Miguel Arcanjo, uma das ruínas das missões, é símbolo da resistência e adaptação de diferentes culturas e uma importante atração turística.
O Mercado Público de Porto Alegre é outro exemplo emblemático. Em sua longa história, o mercado não só representa um patrimônio arquitetônico de grande importância, mas também é um centro de convivência e de preservação das tradições culináriase culturais do Estado, como o chimarrão, o charque e o arroz com feijão. Assim, ele vai além da preservação arquitetônica, consolidando-se como um espaço vivo, onde a cultura se renova a cada dia.
Além disso, o Caminho dos Moinhos, na Serra Gaúcha, é um exemplo de como a preservação de construções antigas pode ser utilizada como ferramenta de desenvolvimento turístico, revitalizando cidades pequenas e gerando emprego e renda. Estilos musicais, como oFandango e o Bugio, por exemplo, e o hábito do Chimarrão, são expressões culturais imateriais que têm sido preservadas com grande entusiasmo e orgulho por nossa população, sendo reconhecidas como patrimônios culturais que representam a identidade do povo gaúcho.
Impactos do patrimônio no desenvolvimento urbano e econômico
A preservação do patrimônio, tanto material quanto imaterial, tem um impacto direto no desenvolvimento econômico e social de uma cidade. Quando o patrimônio histórico é preservado, ele não contribui apenas para a manutenção da identidade cultural, mas também se torna um vetor importante para o turismo, gerando emprego e promovendo a economia local. Muitas cidades que investiram em suas heranças culturais viram o renascimento de suas áreas centrais, o crescimento do comércio local e a atração de turistas interessados em experiências autênticas.
Além disso, a preservação do patrimônio contribui para a sustentabilidade urbana, uma vez que impede a destruição de edificações históricas e paisagens que poderiam ser degradadas por processos de especulação imobiliária. Isso também gera uma maior qualidade de vida para os habitantes, que têm o privilégio de viver em cidades com uma forte conexão com sua história.
Sobre a preservação do patrimônio, destaque para Jaime Lerner
Jaime Lerner, renomado urbanista e ex-prefeito de Curitiba, sempre defendeu a preservação do patrimônio como parte fundamental do planejamento urbano. Para Lerner, “A preservação do patrimônio é uma forma de planejamento inteligente, pois integra o antigo ao novo, valorizando a identidade da cidade e ao mesmo tempo promovendo a sua revitalização.” Ele acredita que as cidades não devem apagar sua história, mas, sim, integrá-la ao novo desenvolvimento urbano, criando ambientes que respeitam e celebram sua tradição, ao mesmo tempo em que se modernizam. Essa visão reflete a importância da preservação como ferramenta para o crescimento sustentável das cidades.
A formação de uma sociedade e a preservação do patrimônio, avisão de Marilena Chauí e Rousseau
A filósofa Marilena Chauí, em suas reflexões sobre a formação de uma sociedade, aponta que a cultura e o patrimônio são elementos cruciais para a construção da identidade coletiva. Segundo ela, a preservação do patrimônio não é apenas um ato de memória, mas uma forma de fortalecer os laços entre os cidadãos, garantindo que as próximas gerações continuem a construir sobre as bases da cultura e história que receberam. “A preservação do patrimônio é a manutenção do imaginário coletivo, um processo contínuo de reafirmação da identidade cultural de um povo”, afirma Chauí. Essa preservação, portanto, é essencial para a construção de uma sociedade mais justa e integrada.
Jean-Jacques Rousseau, em suas obras sobre a formação dos estados e sociedades, argumenta que a construção de uma sociedade justa passa pela proteção dos direitos e valores coletivos. A preservação do patrimônio cultural é uma extensão dessa ideia, pois, ao proteger os bens culturais, um Estado assegura que sua identidade e história sejam respeitadas, formando uma base sólida para a cidadania e o desenvolvimento social.
Tradições como processo de evolução e sua importância para a identidade
A visão moderna sobre o patrimônio cultural reconhece que as tradições não são estáticas; elas são processos de constante evolução. O patrimônio imaterial, como festas populares, danças e músicas, está em constante transformação, pois se adapta ao contexto social e às novas gerações. Assim, a preservação das tradições não significa apenas conservar o que é antigo, mas garantir que essas expressões culturais continuem a evoluir, sem perder sua essência, de forma a refletir as mudanças da sociedade.
A tradição, portanto, deve ser vista não como algo fixo, mas como parte de um processo dinâmico que acompanha o fluxo da vida social. O sociólogo Zygmunt Bauman, ao falar sobre a modernidade líquida, afirma que as tradições precisam ser preservadas não em sua forma rígida, mas em seu poder de adaptação às novas realidades. Essa visão moderna sobre a preservação do patrimônio permite que as cidades mantenham sua identidade, ao mesmo tempo em que se abrem para o novo, criando uma sociedade em constante evolução e crescimento.
A preservação como compromisso coletivo
A preservação do patrimônio é um compromisso coletivo que exige a colaboração entre governo e comunidade. Políticas públicas eficazes, aliadas à conscientização da população, são essenciais para garantir que tanto o patrimônio material quanto imaterial sejam respeitados e valorizados. Como afirmou o filósofo François-Xavier de Feller: “O patrimônio é o maior bem da humanidade, ele não se perde, se transmite.”
Portanto, proteger o patrimônio cultural é mais do que uma tarefa burocrática ou legal: é uma forma de garantir que a história de uma cidade seja preservada e que as futuras gerações possam se orgulhar de suas raízes culturais. A cidade que valoriza seu patrimônio – seja ele material ou imaterial – está investindo em seu futuro, criando um ambiente onde a identidade cultural é a base para um desenvolvimento sustentável, próspero e integrado.
Preservar o patrimônio é garantir que o passado inspire o presente e o futuro, pois, como disse o filósofo francês Henri Bergson, “A memória não é o que se recorda, mas o que se transmite.” E é essa transmissão contínua que forma o alicerce para a construção de uma sociedade mais coesa, consciente e próspera.
Gravataí promove desenvolvimento baseado na valorização e preservação de sua história e cultura
Gravataí, uma das cidades com maior crescimento no Rio Grande do Sul, é também um rico testemunho de história e cultura, abrigando edificações e locais históricos que narram a trajetória de nossa comunidade. Entre os símbolos mais emblemáticos estão o Seminário São José, a Igreja Nossa Senhora dos Anjos, a Escola Dom Feliciano, a Capela Santa Cruz, o Forno Colonial, o Quilombo Manoel Barbosa e, segundo consta, as ruínas de um antigo Cemitério Guarani na região de Santa Tecla. Esses patrimônios – alguns em bom estado de preservação e outros demandando maior atenção, são peças fundamentais da memória coletiva de Gravataí.
A atual gestão municipal tem demonstrado um compromisso crescente com a preservação desse legado, implementando políticas e ações voltadas à valorização do patrimônio histórico-cultural. Com uma abordagem moderna e alinhada ao desenvolvimento urbano sustentável, essas iniciativas refletem a preocupação em equilibrar o crescimento da cidade com o fortalecimento de sua identidade cultural, garantindo que os símbolos do passado continuem a inspirar as gerações futuras.
Entre os exemplos dessas iniciativas está a entrega do Casarão dos Bina, que foi cuidadosamente restaurado e revitalizado. Transformado em um centro cultural, o espaço preserva a história local e oferece atividades artísticas e educativas, tornando-se um ponto de encontro para a comunidade e um atrativo turístico significativo.
Outro destaque é a restauração em andamento do Museu Agostinho Martha, um importante marco cultural e histórico de Gravataí. Este museu, localizado em uma construção de valor histórico inestimável, está sendo revitalizado com o objetivo de preservar a memória da cidade e ampliar o acesso da população à sua história. A iniciativa busca transformar o museu em um espaço vibrante de aprendizado e conexão com as raízes culturais de Gravataí.
Temos ainda a reforma e transformação da antiga sede prefeitura na Casa de Cultura do Município, um espaço que abrigará atividades culturais e artísticas, consolidando-se como um ponto de referência cultural para a cidade.
Outro exemplo de valorização cultural e desenvolvimento urbano é a construção do Mercado Público, que não apenas fortalecerá a gastronomia local, mas impulsionará o comércio, especialmente dos pequenos empreendedores. Esse espaço servirá como ponto de encontro para a comunidade, reunindo tradição e inovação, e um atrativo para turistas.
A revitalização da Praça Leonel de Moura Brizola, conhecida como Quiosque da Cultura, é outra ação importante. Localizada no coração da cidade, essa praça simboliza um ponto de convergência cultural e social. Além de proporcionar lazer e convivência, o espaço abriga pequenos eventos que celebram a arte, a música, o teatro e a literatura, tornando-se essencial para o fortalecimento de nossa identidade cultural.
A construção de uma nova praça às margens do Rio Gravataí, no bairro Parque dos Anjos/Caça e Pesca, demonstra um compromisso com a valorização ambiental e o lazer sustentável. Essa área públicapromove a integração entre a comunidade e um dos principais recursos naturais da cidade, nosso Rio Gravataí.
Nossa cidade também tem se destacado pela preservação de seu patrimônio cultural imaterial, manifestado em eventos e tradições que fortalecem a identidade local e atraem visitantes de diversas regiões. Exemplos marcantes dessa rica herança cultural são o Rodeio Internacional do Mercosul e a Carreteada Estadual, expressões da cultura gaúcha que celebram a história e os costumes do Rio Grande do Sul. Essas tradições reforçam a conexão da comunidade com suas raízes mais profundas, simbolizando o vínculo de pertencimento ao nosso Estado.
Outro exemplo singular de tradição preservada em Gravataí são os Ternos de Reis, manifestações culturais de origem ibérica que ocupam um lugar especial na cidade. Essa prática secular celebra a visita dos Reis Magos ao Menino Jesus, unindo fé, música e confraternização comunitária. Grupos de Ternos de Reis visitam residências, entoando cantos típicos que transmitem mensagens de esperança e religiosidade, promovendo um ambiente de união e celebração.
Essas manifestações culturais — o Rodeio, a Carreteada e os Ternos de Reis — integram o conceito de patrimônio imaterial, pois representam o imaginário simbólico e a memória coletiva de nosso povo, além de manterem vivas práticas culturais que conectam gerações e fortalecem a identidade local. Como define a UNESCO, o patrimônio cultural imaterial é formado por “práticas, representações, expressões, conhecimentos e habilidades transmitidos de geração em geração, constantemente recriados pelas comunidades em função de seu ambiente, sua interação com a natureza e sua história, promovendo assim um sentimento de identidade e continuidade”.
Essa perspectiva amplia-se com a construção de novas tradições, que também podem integrar o conceito de imaterialidade. O Brique da Redenção, em Porto Alegre, e o programa Rua Aberta, aqui na Aldeia, são exemplos de como aquilo que é novo pode se transformar em parte da imaterialidade cultural, uma vez que tudo o que hoje é tradicional já foi, em algum momento, uma novidade. Isso reforça a ideia de que a cultura é um processo vivo, em constante transformação, onde práticas emergentes podem adquirir o mesmo valor simbólico das heranças mais antigas, conectando comunidades ao longo do tempo.
A preservação do patrimônio material e imaterial é essencial para a construção e fortalecimento da identidade de Gravataí. Não se trata apenas de conservar objetos ou tradições, mas de assumir um compromisso com a memória coletiva, conectando gerações passadas e futuras. Como afirmou o filósofo Paul Ricoeur, “a memória é o eixo da identidade”. Assim, a valorização do patrimônio cultural não apenas guarda o passado, mas também constrói narrativas que dão sentido ao presente e orientam o futuro. Em Gravataí, ações que promovem a história e a cultura locais refletem essa abordagem, consolidando a cidade como um espaço de celebração da memória e da diversidade cultural.