3º NEURÔNIO

A ‘PEC da Blindagem’ e as instituições políticas brasileiras

Diego Saldanha, pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Elites, Instituições e Agentes do Sistema de Justiça (LELIA-UFRGS), mestrando em Ciência Política e servidor da Câmara de Gravataí, colabora com o Seguinte: 


A “PEC da Blindagem”, como tem sido apelidada a Proposta de Emenda à Constituição nº 3/2021, coloca na vitrine a fragilidade das instituições brasileiras. Por essas terras, havia uma vontade: a atuação dos três Poderes deveria se estabelecer a partir de um sistema de vigilância mútua, que serviria para compor uma rede de proteção às próprias instituições. Esse sonho, no entanto, não se concretizou plenamente. Muitos atos que confrontam a ordem constitucional ou a soberania nacional não são contidos por aqueles que deveriam agir. Como consequência, agentes repletos dos mais criativos impulsos autoritários acabam por se manter no jogo político.

Ainda que imperfeito, o sistema de pesos e contrapesos brasileiro é um sistema. Assim, perturbações à ordem estabelecida acarretam mudanças no jogo de poder entre as instituições e seus agentes. E essa instabilidade não é necessariamente desejável, seja para os próprios participantes do jogo, seja para o povo. Afinal, parece haver grandes problemas sociais e econômicos depositados ao lado da mesa. Problemas que exigem grandes articulações políticas, como a que observamos em nome da autopreservação.

Movimentos como a “PEC da Blindagem” não são novidade. Em 2021, por exemplo, o enxugamento realizado na Lei de Improbidade Administrativa levou ao esvaziamento quase absoluto do instituto. Contudo, seria um equívoco imaginar que – assim como ocorreu com essa Lei – não haveria uma resposta fortemente negativa por parte dos eleitores. Muitos deles, sob a esperança das bandeiras moralizantes, içadas por esses mesmos parlamentares, concederam-lhes milhares de votos na eleição passada. Agora, somam-se pedidos de desculpas às bases de apoio, acusações de “voto coagido” e até mesmo negações ao painel de votação.

O rebote veio no domingo (21). Em oposição à “PEC da Blindagem” e ao Projeto de Anistia, formou-se um movimento significativo de oposição à Câmara de Deputados nas capitais do país: para além da mobilização partidária sobre o tema, há também uma desilusão que se abate sobre o sistema político como um todo. Afinal, a capacidade do Poder Judiciário de julgar parlamentares envia uma mensagem clara: a lei é universal e deve ser aplicada a todos.

Sobre a viabilidade do projeto, o processo de apreciação de uma PEC é complexo, com votação em dois turnos nas duas Casas. Assim, a tendência é que a PEC não seja bem-sucedida no Senado por dois motivos: o governo Lula tem maior influência na segunda Casa, e o Senado é tradicionalmente mais institucionalizado. Ao contrário da Câmara, que tende a ser mais impactada pelo fervor político, o Senado é menos imediatista e tende a ser mais cauteloso ao tratar da ordem política.

Ainda assim, o jogo é político e as instituições são formadas por pessoas, o que significa que essa tendência pode se alterar. No entanto, já na segunda-feira (22), Hugo Motta (REPUBLICANOS), Presidente da Câmara de Deputados, desvalorizou a PEC que havia pautado, chamando-a de “tóxica”. Temos também acenos importantes no Senado: o Senador Otto Alencar (PSD), Presidente da CCJ, informou que a PEC não passará em sua comissão, e o Senador Davi Alcolumbre (UNIÃO), Presidente do Senado, criticou publicamente a pauta.

É verdade que os agentes passam e as instituições ficam, embora muitos agentes permaneçam mesmo quando não deveriam, sobretudo quando as respostas institucionais não são efetivadas contra seus intentos antidemocráticos. Para além disso, movimentos de autopreservação colocam em xeque a legitimidade das nossas instituições perante a sociedade. Assim, se a PEC for adiante, num futuro próximo, não bastará apenas pensar em novas soluções para os problemas que surgirão; teremos que, em algum momento, desfazer o retrocesso deste ano.


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