Apesar das ameaças devido ao ‘reajuste zero’ para o funcionalismo, o ano letivo encerra dia 19 sem greve em Gravataí. Conforme a última decisão do conselho geral do sindicato dos professores (Spmg), fica para 2019 a pressão pela reposição de 16% em perdas calculadas pela categoria nos últimos quatro anos.
Em novembro, vinte assembléias regionais promovidas nas escolas municipais pelo Spmg tinham definido um indicativo de paralisação que seria submetido a assembléia geral, mas a data ainda não foi marcada.
No conselho, os trabalhadores da área de educação definiram para 26 de fevereiro, às 13h30min, na sala de reuniões do sindicato, uma plenária para “formular um calendário de mobilização para o ano, que será levado para discussão nas escolas”.
– Durante o recesso, a direção do sindicato discutirá com os conselheiros a formulação de uma proposta prévia – diz a presidente Vitalina Gonçalves, que prefere não dar mais detalhes sobre as estratégias da categoria.
– Falamos no ano que vem. Será um ano de lutas – resume.
O conselho do Spmg também decidiu manter a ação no Tribunal de Justiça (TJ) do Rio Grande do Sul que cobra a “revisão geral anual das remunerações dos servidores”. Sem pedido de liminar, a ação judicial tramita aguardando, neste momento, a manifestação da prefeitura.
Em novembro, Vitalina tinha falado ao Seguinte:
– Na data-base 2015-2016 o sindicato obteve decisão judicial favorável na justiça de Gravataí, que obrigou o prefeito a encaminhar a respectiva proposta de negociação. Foi a medida que conquistou o último reajuste.
Na última rodada de negociações, o próprio prefeito tinha comunicado a impossibilidade de qualquer reposição, o que deflagrou a reação da direção do sindicato.
– Na reunião com o prefeito e os secretários não se avançou nada. O governo fez críticas a outros governos que se financiavam em cima do funcionalismo, mas impõe o mesmo arrocho – argumentou à época a presidente, contestando o ‘300 mil contra 5 mil’, espécie de justificativa do governo para segurar os salários e conseguir conter o rombo na previdência (o Ipag, instituto de previdência do funcionalismo municipal) e investir em obras e serviços.
– Somos parte destes 300 mil. É o funcionalismo quem executa as políticas públicas. Há ideologia nisso também, de criar um falso bem contra o mal, no caso os servidores. O governo não está desligado de um projeto maior de sucateamento do serviço público – criticou.
Em março o sindicato dos professores aprovou uma pedida salarial de 20%, onde embutia também ganho real. O cálculo da categoria é de que, entre 2015 e 2018, a perda salarial só com a inflação chega a 16,6%.
– Um professor de nível 1, com salário de R$ 1.200, já perdeu R$ 3.600.
Nas projeções apresentadas na assembleia com base em dados do Tribunal de Contas do Estado (TCE), o SPMG sustenta que a receita comporta a pedida salarial sem ultrapassar o limite da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
– Depende da vontade política do prefeito. Há espaço para repor o que foi comido dos salários e também para negociar um ganho real.
Na conta do sindicato, mesmo que a receita corrente líquida ficasse congelada nos R$ 600 milhões de 2017, incluindo salários e contribuições do governo para o Ipag Previdência e o Ipag Saúde, o limite de gastos de 51,3% previsto pela LRF não seria ultrapassado com o reajuste.
– Com 15% iria a 48%, com 18% iria a 49% e com 20% a 50,35% – apontou na última assembléia geral a diretora Marli Medeiros, que também fez os cálculos projetando um crescimento de 5% em 2018, que elevaria a receita para R$ 630 milhões, e deixaria o comprometimento da receita em 46,55% para uma reposição de 15%, de 47% para 18% e de 47,56% para os 20% com ganho real.
– Os 5% que trabalhamos são uma projeção conservadora, já que deve fechar em 8% – calculou, mostrando gráficos que mostram que, não fosse a marolinha que virou um tsunami de crise em 2015, a receita em Gravataí poderia ter se mantido numa média crescimento chinês de 10%.
– Se nosso salário tivesse crescido na proporção da receita seria hoje 26% maior – calculou outra diretora, Irene Kirst, observando que enquanto a Prefeitura arrecadou 8% a mais a cada ano, a despesa com pessoal caiu 6%.
– Em outras palavras, o funcionalismo está financiando a administração pública – avaliou.
No ano passado, sem reajuste, os servidores da educação pararam por uma semana.
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Em comunicado aos associados, o Spmg informou ainda que “no período do recesso, irá manter a vigilância com relação a todos os movimentos do governo ligados ao Ipag”.
Como o Seguinte: revelou com exclusividade, o governo Marco Alba estuda a apresentação de um projeto modificando as formas de adesão, contribuição e prestação de serviços pelo Ipag Saúde, espécie de plano de saúde dos servidores públicos municipais de Gravataí.
O déficit no plano soma R$ 6,3 milhões nos últimos dois anos. E, ao lado da alíquota complementar, de R$ 1,6 milhão, recolhida mensalmente das contas da prefeitura para cobrir o rombo no Ipag Previdência e garantir a aposentadoria dos funcionários, é a justificativa do governo para não dar reajuste.
– Sem levar em conta os repasses patronais e a alíquota complementar para o Ipag Previdência, entre 2017 e 2018 a prefeitura bancará R$ 6,3 milhões para fechar as contas do Ipag Saúde. Se fossemos repor a inflação do período para os servidores, não precisaríamos investir a metade. Então, ao manter vivo o plano de saúde, o governo está sim dando uma reposição – argumentou secretário da administração, modernização e transparência, Alexsandro Vieira, na última reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (Codes).
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Os números apresentados foram assustadores, como tratei no artigo Os vilões que podem quebrar a prefeitura.
Em resumo:
Sem uma reforma na previdência nacional, a prefeitura de Gravataí quebra em 15 anos, já que o último estudo atuarial projeta em 2032 um gasto de sete a cada dez reais de receita só para garantir as aposentadorias dos 5 mil funcionários públicos municipais ativos, inativos e pensionistas ligados ao Ipag Previdência.
E, sem uma mudança no sistema de cobrança e oferecimento de serviços pelo plano de saúde do Ipag, o caixa continuará não fechando. Só neste ano o rombo no Ipag Saúde será R$ 4 milhões.
Neste cenário, sempre descrito pelo secretário da fazenda Davi Severgnini como ‘A Falha de San Andreas’ – em referência ao acidente geológico mais temido no mundo e que poderia desencadear um tsunami de proporções bíblicas em São Francisco, engolindo parte dos Estados Unidos – o congelamento nos salários do funcionalismo por mais de uma década também é uma realidade.
Pelo menos enquanto o céu for o limite tanto para a alíquota complementar com a qual o governo municipal cobre o déficit da previdência, quanto para o dinheiro que é preciso destinar ao Ipag para fechar as contas do plano de saúde.
– Não tem ideologia aqui. É matemática. Basta olhar para o cofre. A união quebrou, os estados quebraram e, se a reforma não for feita, os próximos a quebrar serão os municípios – resumiu o prefeito no Codes, citando mais uma vez a ‘fórmula 300-5’, onde chegará o dia em que os recursos para toda população, 300 mil, precisarão ser usados quase que exclusivamente para pagar os servidores, 5 mil.
– É um debate muito sério, sobre o qual não tenho do que reclamar dos funcionários, que tem sido compreensivos à medida que conhecem os números verdadeiros.
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Vamos aos números:
Os servidores contribuem com 14% dos salários bruto para o Ipag, o governo com 15,7% sobre a folha. A prefeitura também paga uma alíquota complementar para fazer frente ao déficit atuarial. É uma projeção de dinheiro suficiente no caixa para pagar as aposentadorias por 35 anos. Em 2018, a alíquota é de 14%. Em 2019, 18%. Em 2032, 72%.
– Neste ano R$ 5,5 milhões mensais vão para o Ipag. A partir do ano que vem, some a isso mais R$ 500 mil por mês. E a conta só aumenta, com a alíquota crescendo em média 4% a cada ano – contabilizou o secretário da administração, modernização e transparência, Alexsandro Vieira.
Marco e Vieira alertaram para a maquiagem nos cálculos do déficit atuarial até 2014.
– Como explicar que um estudo apontava R$ 214 milhões de déficit em 2014 e outro aponte R$ 1 bi em 2018? – comparou o secretário.
– É porque contratamos uma perícia para apontar os dados reais – respondeu o prefeito.
Mas fica pior. Se em 2017 a proporção era de um funcionário na ativa a cada 0,3 inativos, em 2018 serão um para cada meio.
– A massa de contribuição segue a mesma, enquanto crescem as aposentadorias e a expectativa de vida – comparou o secretário, prevendo a possibilidade de mais 447 aposentados no próximo ano, o que corresponde a cerca de 10% de um quadro que, com as novas tecnologias, não precisa de uma reposição na mesma progressão.
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– Erro no nascimento do instituto e incompetência para gerir o déficit – resumiu o prefeito.
O Ipag foi criado em 1996 sem caixa ou previsão de escala para aposentadorias. Logo no ano seguinte funcionários com décadas de serviço já começaram a se aposentar, sem nenhum encontro de contas para ressarcir o instituto com contribuições previdenciárias anteriores ao INSS.
Além disso, governos – Daniel Bordignon e Sérgio Stasinski, principalmente – não recolheram integralmente a contribuição patronal, que é a parte da prefeitura, levando a uma dívida de mais de R$ 100 milhões.
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Dá para piorar?
Sim.
É quando entra na conta o Ipag Saúde, que funciona como um plano de saúde dos servidores. Mesmo com o aumento em 1% nas contribuições dos funcionários e dependentes em 2018, a conta ainda não fecha. Cada titular desconta 5,5% na folha bruta, a prefeitura entra com 4,5% e dependentes pagam entre 2% e 3%.
– Todos com os mesmos direitos, o que leva a uma distorção onde os titulares respondem por R$ 2,5 milhões das despesas e os dependentes R$ 10 milhões. Aí, uma mesma consulta custa R$ 30 para o servidor e R$ 18 ou R$ 12 para o dependente. Não há plano privado assim – exemplificou o secretário, observando que os serviços oferecidos são ilimitados e correspondentes aos oferecidos pela Unimed.
– Há consulta, diagnóstico, pronto socorro, cirurgias, internação hospitalar, farmácia e odontologia. É um plano completíssimo. Talvez melhor que a Unimed no custo-benefício, porque no plano privado o serviço odontológico é pago a parte e há escalas de preço conforme a idade. No Ipag não. Não temos nem carência em Gravataí. Uma grávida de oito meses pode aderir ao plano e no mês seguinte terá a gestação coberta pelo Ipag – argumentou.
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O secretário antecipou aos conselheiros presentes no auditório da Dana que o governo prepara para fevereiro, na volta do recesso parlamentar, o envio de projeto à câmara de vereadores criando novas regras para adesão, contribuição e oferecimento de serviços.
– Sem mudanças, o Ipag Saúde está fadado a acabar – previu o secretário, logo interrompido pelo prefeito.
– Não vou propor a extinção, apesar de nem 10 dos 497 municípios gaúchos oferecer plano de saúde como o Ipag. Mas precisamos torná-lo sustentável – garantiu Marco Alba.
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Conclui o texto opinando:
“(…)
Além da sensibilidade social – de saber que a extinção do plano, que é defendida abertamente dentro do governo pelo secretário da fazenda, repercutirá diretamente na vida de pelo menos duas mil famílias de servidores – o prefeito certamente calcula que essas pessoas, que tem uma média salarial de pouco mais de R$ 2 mil, engordarão as filas do SUS, onde só de 2017 para 2018 mais de dois milhões de brasileiros buscaram socorro ao não conseguir pagar um plano de saúde.
Inegável é, porém, a solidez do argumento do governo sobre as dificuldades em dar reposição salarial, quando indiretamente colabora para garantir as aposentadorias e manter vivo o plano de saúde.
E, inevitável é que, onde a prefeitura tem ingerência, que é no Ipag Saúde, algo precisa ser feito. E esse algo lamentavelmente significará mexer mais uma vez no bolso de quem usa o plano.
Em relação ao Ipag Previdência, resta torcer para que o governo Jair Bolsonaro (PSL) consiga aprovar alguma reforma na previdência. O que o presidente eleito vai fazer, ninguém sabe ainda. Ele não foi aos debates, um modelo de reforma (ou mesmo as idades mínimas para aposentadorias de homens e mulheres) não constava no plano de governo do presidenciável e, pelo WhatsApp, mais se falou sobre o kit gay do que sobre a previdência.
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