coluna do golembiewski

Anos Dourados

O jornalista Ruy Castro é mais conhecido pelas biografias que escreve, como as de Garrincha e Carmem Miranda, do que pelos seus outros livros. Mas ele tem obras que não contam vidas famosas, mas movimentos musicais como a bossa nova, ou o samba-canção e as boates do Rio de Janeiro nos anos dourados, como descrito no livro “A noite do meu bem”.

Ao contar a história do samba-canção o livro conta também a história do Brasil. E nestes anos dourados os problemas nacionais eram bem mais amenos do que os que vivemos agora, como demonstra o assunto polêmico do início do governo do General Dutra, em 1946: Os cassinos.

Na tarde de 30 de abril de 1946, o presidente Eurico Gaspar Dutra assina decreto-lei acabando com os jogos de azar no Brasil. Mas não são apenas os cassinos que deixarão de funcionar. As consequências deste ato vão muito além dos interesses dos donos das casas de jogo. Com uma tacada só, o ato presidencial deixa milhares de pessoas desempregadas e retira o palco de artistas, músicos e vedetes do teatro de revista.

O decreto, em poucas frases, faz ruir o império dos cassinos, com fundamento na alegada tradição moral, seja o que isso for: “considerando que a tradição moral, jurídica e religiosa do povo brasileiro é contrária à exploração dos jogos de azar, fica decretado o fechamento dos cassinos em todo território nacional”.

A vida tem lá suas regras perenes e imutáveis. Uma delas é a relação causa e efeito. O fechamento dos cassinos, incluindo, obviamente, o famoso cassino da Urca, tem como consequência o surgimento de boates no Rio de Janeiro. São casas inspiradas nas boates francesas, refinadas e sem hora para terminar, onde sempre é noite, mesmo que o sol lá fora já tenha dado as caras.

A migração dos artistas, músicos e vedetes dos cassinos para as boates ocorre naturalmente. Duas destas casas vão marcar época em Copacabana: a Vogue e a Sacha's. E a trilha sonora destas boates será o samba-canção. Nos pequenos palcos mal iluminados, cantoras como Aracy de Almeida e Dolores Duran tiveram seus nomes consagrados.

A elite carioca, intelectuais, boêmios, colunistas sociais, jornalistas em busca de informações e políticos serão os habitues destas boates as quais, em razão de seus frequentadores, são capazes de contar a história do Brasil das décadas de 40 e 50, os chamados anos dourados.

Tudo o que acontecia nas altas rodas do poder ressoava nos salões das boates. Na crise política que culminou com o suicídio de Getúlio Vargas em agosto de 1954, o vice-presidente Café Filho vai ao Palácio do Catete à tarde e lhe propõe que os dois renunciem. Getúlio diz que vai pensar, mas à noite, na Vogue, já se sabia que jamais haveria renúncia.

O que ninguém sabia, o que ninguém contava, era a carta na manga do velho caudilho: sair da vida para entrar na história, como escreveu em sua carta testamento, no dia 24 de agosto, há exatos 64 anos.

 

 

 

 

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