O prefeito Marco Alba (MDB) acaba de anunciar, ao lado de secretários e vereadores, a antecipação do 13º para os cerca de 5 mil funcionários públicos de Gravataí: 25% em outubro, 25% em novembro e os 50% restantes em dezembro.
A análise que fiz em 2018 vale em 2019.
Evoco mais uma vez minha criação: a ‘ideologia dos números’.
Prefeitura não é banco, que vive do lucro. Mas também não é casa da moeda, que fabrica dinheiro quando quer. No caso de Gravataí, está mais para a pessoa que a renda não cresceu como imaginava, fez economia de guerra para pagar as dívidas, se incomodou até com a família e agora já consegue investir na casa.
Demora um pouco para perder a pose de vilão.
É uma escolha.
Inegável é que Marco Alba tem achado um jeito para equilibrar as contas em Gravataí. Reduziu o endividamento de 56% da receita em 2012 para 14% em 2018, conforme dados do Tribunal de Contas.
Assim, em meio a uma crise onde, no Rio Grande do Sul ou no Brasil, infelizmente, para quem olha para os lados, o maior negócio parece ser o ‘aluga-se’, e como perspectiva a ekipekonomika do governo federal comemora crescimento de menos de meio digito num PIB de trimestre, parece-me motivo, se não para comemorar, pelo menos para aparentar tranqüilidade o fato de Gravataí conseguir botar a cabeça para fora d´água com investimentos públicos (mesmo que por meio de financiamentos, que, registre-se, só existem porque há certidões negativas de débitos); além de receber grandes empreendimentos privados e, pelo terceiro ano consecutivo, antecipar o 13º sem a necessidade dos servidores recorrerem a empréstimos bancários.
As parcelas no dia 20 de cada um dos próximos meses movimentarão cerca de R$ 10 milhões na economia local. É obrigação? Deveria. Mas não é o que está acontecendo no Estado, onde o governador Eduardo Leite começa em setembro a pagar os salários de agosto, nem na Capital com Nelson Marchezan (PSDB) ou, para apontar para o lado canhoto da força, na São Leopoldo, de Ary Vanazzi, do PT.
Com a reposição apenas da inflação do período 1º de maio de 2017 a 30 de abril de 2018 (1,69%) e calculando perdas de 16% nos salários dos últimos cinco anos, os sindicatos dos professores e dos municipários por óbvio querem mais do que salários em dia. Mas, sem torcida ou secação, há de se ouvir os argumentos do governo sobre o o bilhão necessário, conforme cálculo atuarial, para garantir aposentadorias até 2032. O que, já antecipei há dois anos, ameaça reposições salariais pelos próximos 15 anos.
Para se ter uma idéia, além da contribuição patronal para o Instituto de Previdência do Funcionalismo (R$ 3 milhões/mês), a Prefeitura arca com um parcelamento de dívidas com o mesmo IPG, do período de 97 a 2008, que consome R$ 900 mil a cada 30 dias pelos próximos nove anos, perfazendo R$ 120 milhões; além de outros R$ 2,3 milhões mensais para uma alíquota complementar, também para assegurar aposentadorias, que é de 18%, vai a 22% em 2020 e, em pouco mais de uma década, pode fazer com que Gravataí pague quase duas folhas salariais, hoje R$ 23 milhões/mês.
A folha responde neste setembro de 2019 por 45,36% da receita corrente líquida. O teto, conforme a Lei de Responsabilidade Fiscal, é de 54%. O limite prudencial, 51,3%. Bom, né? Então, poderia dar reajuste!
– Infelizmente, qualquer percentual incide sobre o patronal e a alíquota complementar – contrapõe Davi Severgnini, secretário da Fazenda, que atesta a necessidade do congelamento salarial.
Para ele, ‘reajuste zero’ não é, já que as alíquotas complementares pagas pela Prefeitura, ao fim, funcionam como uma ‘poupança’ para a aposentadoria dos servidores.
Davi também alerta para os efeitos da economia nacional em Gravataí nos últimos cinco anos. O ICMS, por exemplo, está cerca de R$ 60 milhões abaixo da projeção que se fazia no ‘pré-crise’.
– A receita já deveria estar em R$ 1,3 bilhões – calcula o prefeito, comparando com os manos de R$ 800 milhões projetados para o ano.
– Entre as contas que pagamos e temos que pagar é meio bilhão. Nenhuma dívida nossa, de 2013 para cá. Dói – acrescenta, listando R$ 250 milhões pagos em dívidas e outros R$ 250 milhões com parcelamentos negociados e pagos regularmente.
Em precatórios, que são dívidas cíveis e trabalhistas, com fornecedores e trabalhadores, são mais de R$ 100 milhões pagos ou parcelados até 2024, cuja regularidade rendeu certificado de ‘bom pagador’ do Tribunal de Justiça, recebido hoje por Marco Alba e que trato em artigo posterior.
– Nossa despesa judicial, toda por calotes de governos anteriores, equivale a duas pontes do Parque dos Anjos por ano – resumiu Jean Torman, procurador-geral.
Aí, volto à questão das escolhas.
A opção de Marco, após equilibrar as contas e o gasto com folha (para efeitos de comparação, em Gravataí é menos de 5 a cada 10 reais, em Cachoeirinha próximo a 7 a cada 10), ao invés de reajustar os salários do funcionalismo, é pagar em dia e entregar obras. São mais de R$ 50 milhões em financiamentos, principalmente em obras de asfaltamento e infraestrutura, cuja projeção da Fazenda é de absorção no orçamento sem explodir o percentual de endividamento.
Onde entra a ‘ideologia dos números’?
Parece-me saudável que o próximo governo mantenha as contas em dia, principalmente com os fantasmas vestidos em Armani que, sentados em escritórios luxuosos de Detroit e Milão, a cada vez que fazem as contas aterrorizam Gravataí com nada impossíveis saídas da GM e da Prometeon, após o ‘ciao Pirelli’ devido ao High Value, conforme já tratei em artigos como Acordo inédito garante mais de 70 mil por demissões na Pirelli; entenda os benefícios, Tirando a bunda da cadeira para socorrer Pirelli; Eles Não Usam Black-tie, Pirelli já era; choremos juntos e shallow now e Acordo Mercosul-União Européia é ruim para GM Gravataí; there is no free lunch, nem marmita grátis.
Sobre as opções de cada candidatura, não apenas torçamos, mas cobremos para que fiquem claras em 2020. Um grupo pode dizer que vai investir nos salários do funcionalismo; outro, dizer que vai fazer obras e, tantos, podem dizer ainda que farão as duas coisas, que os professores ganham mal e o povo merece asfalto na frente de casa.
O mistério está em perguntar: “Como?”.
Respondido ou não, o voto é responsabilidade de cada um.
Ao fim, estamos ainda em 2019 e, nos dias de hoje, não é feio elogiar a antecipação do 13º. No ano passado, conforme dados da Famurs, nem 3 em cada 10 dos 497 municípios gaúchos conseguiu fazer isso.