A Polícia Civil do Rio Grande do Sul deflagrou nesta quinta-feira (16 de outubro) a Operação Falsa Fé, uma ofensiva interestadual contra uma organização criminosa especializada em aplicar o chamado “Golpe do Falso Pai de Santo”.
A investigação, conduzida pela 3ª Delegacia de Polícia de Canoas, contou com o apoio do Ciberlab/Diopi/Senasp, órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, e da Polícia Civil de São Paulo. A ação mobilizou 120 policiais civis nos dois estados.
Durante o cumprimento dos mandados, foram executados 18 mandados de busca e apreensão e sete mandados de prisão temporária nas cidades paulistas de São Paulo, Itapevi, Cotia e Jacareí.
Até o momento, oito pessoas foram presas, incluindo o homem apontado como o “pai de santo” líder do grupo. Também foram bloqueadas contas bancárias e apreendidos celulares e um veículo utilizado pelos investigados.
Vítima perdeu mais de R$ 180 mil em supostos rituais espirituais
De acordo com a investigação, o grupo se aproveitava de pessoas emocionalmente fragilizadas para aplicar golpes sofisticados envolvendo supostos “trabalhos espirituais”.
Um dos casos apurados pela Polícia Civil mostra a atuação cruel da quadrilha. Uma mulher, abalada após o fim de um relacionamento, encontrou nas redes sociais o anúncio de uma suposta “Mãe de Santo”, que prometia “trazer o amor de volta”.
No dia 29 de maio de 2025, a vítima fez o primeiro contato com a golpista, que cobrou R$ 300 por um ritual de “amarração”. Em seguida, passou a exigir novos pagamentos sob o pretexto de realizar “trabalhos complementares”, como “dominação de coração” e “casamento de almas”.
Quando a vítima tentou desistir, ouviu que as entidades espirituais poderiam puni-la.
A partir daí, as cobranças se intensificaram. Os criminosos começaram a ameaçar e extorquir a mulher, alegando que ela havia “enganado as entidades” e que “pagaria caro” se não enviasse novos valores.
O suposto “Pai de Santo”, que se apresentava como chefe do terreiro, passou a enviar mensagens e fazer ligações em tom autoritário. Em um mês, a vítima transferiu mais de R$ 180 mil em pagamentos via PIX e TED, com valores que variavam de R$ 1,5 mil a R$ 37 mil, para diversas contas bancárias de pessoas físicas.
Em determinado momento, o criminoso chegou a afirmar que precisava comprar um bode preto para concluir o ritual, cobrando mais R$ 1.500. Depois, disse que o dinheiro estava “bloqueado pelo banco”, e exigiu novas transferências de 4% e depois 13,5% como supostas taxas de liberação — tudo falso.
A quadrilha ainda enviava prints adulterados de conversas com falsos gerentes de banco e empresários para dar credibilidade às mentiras. Mesmo após sucessivos pagamentos, as ameaças continuaram, e a vítima, emocionalmente abalada, só então decidiu procurar a Polícia Civil.
Investigação aponta uso de redes sociais e manipulação psicológica
Segundo a delegada Luciane Bertoletti, titular da 3ª DP de Canoas, o grupo agia de forma organizada, com funções bem definidas e uso profissional de perfis falsos em redes sociais para atrair vítimas.
“Eles se aproveitam da vulnerabilidade emocional das pessoas, criando uma relação de dependência e medo. É um crime que mistura estelionato e extorsão, com grande impacto psicológico e financeiro”, explicou a delegada.
O diretor da 2ª Delegacia de Polícia Regional Metropolitana de Canoas, delegado Cristiano de Castro Reschke, destacou que o golpe faz parte de uma nova geração de crimes virtuais baseados em manipulação emocional.
“Os criminosos usam tecnologia e persuasão de forma cada vez mais sofisticada. Primeiro ganham a confiança, depois exploram a vítima emocionalmente e, por fim, passam à fase de ameaças e extorsão. É uma sequência devastadora”, alertou o delegado.
Operação Falsa Fé: integração nacional no combate a golpes digitais
A Operação Falsa Fé é resultado de um trabalho conjunto entre as polícias civis do Rio Grande do Sul e de São Paulo, com apoio do Ciberlab/Diopi/Senasp, que atua no rastreamento digital e bloqueio de ativos financeiros de grupos criminosos.
A Polícia Civil reforça que as vítimas de golpes virtuais e financeiros podem — e devem — registrar ocorrência em qualquer delegacia ou pela Delegacia Online (www.delegaciaonline.rs.gov.br), inclusive de forma anônima.