JEANE BORDIGNON

As palavras voam

“Roubei” o título desta coluna de um poema da Cecília Meirelles que eu me identifico muito. Tanto que usei essa poesia no prefácio do meu primeiro livro, “Brado Carmesim”. Mas não imaginava o quanto seria profético.

A metáfora do voo já me acompanhava há algum tempo. Quando entrei nas redes sociais (lembram do Orkut?), ainda muito tímida, usava a imagem de uma borboleta em vez da minha foto. Ao criar minha página no Facebook para publicar meus textos, dei o nome de “Voos e Palavras”. Minha apresentação era: “Se as palavras têm asas, que elas me levem para longe”.

Nessa época eu já mirava o Rio de Janeiro, mas não podia calcular o quanto representaria na minha vida. Quem imaginaria que a menina de Gravataí lançaria seu livro aos pés dos Arcos da Lapa? Eu só sabia que o Rio me chamava. E em meio ao processo de mudança, o livro foi acontecendo. Talvez tenha sido o destino dele nascer carioca.

A poesia me levou a muitos lugares. Primeiro às janelas dos ônibus de Porto Alegre, onde por muitos anos eu li os versos de tanta gente. E ao maior evento literário do nosso estado: a Feira do Livro de Porto Alegre. As coletâneas do concurso Poemas no Ônibus foram lançadas no Memorial do Rio do Sul, mas o Caderno de Literatura nº 22 da AJURIS me deu a oportunidade de estar no palco mais almejado por todo escritor gaúcho, o palco principal da Feira. Hoje em dia, as sessões coletivas de autógrafos estão em espaços separados, mas naquele tempo o palco era um só. 

Na mesma época eu começava a descobrir que minha poesia poderia ir além do papel e ganhar voz. Os saraus do Gente de Palavra despertaram a poeta que sou hoje. Pude entender que haviam múltiplas possibilidades para meus versos. E o Festival Aedo – Arte e Expressão da Oralidade, foi um grande exemplo disso. O poema Brado Carmesim foi traduzido para o espanhol (pela Lota Moncada) e para o inglês (pela Cristina Macedo), além de ganhar a companhia de uma arte visual inspirada nele. E teve sarau, claro. Minhas asas cresciam!

Já no meu Rio de Janeiro querido, eu fui do Leblon a Santa Cruz (no extremo oeste da cidade) para dizer poesia. Do morro da Babilônia ao viaduto de Realengo. Da imponente Casa da Leitura, em Laranjeiras, à singela biblioteca pública Cruz e Souza, de Bangu, passando pelos inesquecíveis saraus de rua da Lapa, onde a poesia e a arte eram mais democráticas do que nunca. E ainda fui escritora convidada para a Festa Literária de Duque de Caxias

As andanças no Rio me levaram a estar entre os poetas selecionados para a exposição Poesia Agora, que reuniu mais de 500 escritores, trazendo um panorama do cenário da poesia contemporânea nacional. Sem palavras para definir a emoção de ter um poema meu na mesma mostra que Elisa Lucinda, Angélica Freitas, Chacal, Salgado Maranhão e Sérgio Vaz! Referências, sabe? E minhas palavras fazendo parte disso. Parece que eu estava no caminho certo!

A vida seguiu em frente e me fez voltar para minha aldeia. Veio a pandemia da Covid, onde o isolamento também proporcionou muitos encontros virtuais, porque os poetas precisam de saraus, mesmo que seja por video. E que coisa linda era ver na tela reunidos poetas de vários cantos do Brasil, e até em outros países! Esses saraus também me proporcionaram conhecer a Fernandinha Meirelles, neta da Cecília. Ainda parece um sonho que a neta de uma das minhas maiores inspirações ouviu meus poemas e soube do quanto a avó dela é importante na minha construção de poeta.

Os saraus virtuais me inseriram cada vez mais nos grupos de mulheres escritoras, uma trajetória que já tinha começado quando estava no Rio e ajudei a construir o coletivo Nós, as poetas. Mas conhecer o movimento Mulherio das Letras abriu outras possibilidades. Fui selecionada para as coletâneas de Portugal e dos EUA (essa bilíngue)! Além das coletâneas do coletivo Enluaradas, que também reuniu escritoras residentes em diversos estados e países.

Em 2023 lancei meu segundo livro, “É mais simples do que parece”, num singelo formato pocket, editado pelo querido Carlos Albani (o inventor do vento). Pois a Marta Cortezão, uma das idealizadoras do Enluaradas, adquiriu meu livro, que seguiu para a Espanha, onde ela mora há alguns anos. A Marta é amazonense e nos conhecemos pessoalmente na Feira do Livro de Porto Alegre do ano passado. Acho lindo como a poesia é maior do que qualquer limite geográfico!

Para o terceiro livro, Pequenas Histórias, precisei fazer uma campanha de pré-venda. E as colaborações vieram de vários lugares: Gravataí, Porto Alegre, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, João Pessoa… Se esse livro foi publicado, é porque minhas palavras já voaram tanto! Como cantou Gonzaguinha: “é tão bonito quando a gente entende que a gente é tanta gente por onde quer que a gente vá…”

Mas eu nem imaginava onde essa coluna no Seguinte me levaria. Recentemente, montando meu portifólio de escritora, fiz uma busca no Google por publicações sobre mim, e descobri que um poema, que publiquei aqui durante a pandemia, foi utilizado como texto de referência em uma prova de admissão à especialização em Língua Portuguesa da Universidade Federal Fluminense, de Niterói. Minha escrita tem qualidade, sim, e não devo mais duvidar disso. 

E, sem dúvida, as palavras voam e se espalham pelo mundo!

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