coluna do silvio

Bancas de Revista, as últimas posições da resistência 

Bancas de revistas ainda sobrevivem em Gravataí

Nos anos 70 e início dos 80, trabalhar em uma banca de revista era o meu sonho. Imagina poder ler tudo que chegava, de graça! Isso por si só já era pagamento suficiente. Mesmo sem trabalhar em uma, passei boa parte da infância e juventude dentro de algumas. Centenas de vezes corria até a tabacaria do Valdomiro ali na parada 72 com dois gibis já lidos, ele trocava dois por um, sempre usados, bom para todo mundo.

Quando ia para o Dom Feliciano, no centro da cidade, a passada na banca da rodoviária era sagrada e basicamente em CADA parada da antiga avenida Flores da Cunha encontrávamos uma ou mais bancas de revista.

No entanto passeio de "responsa" nesta área era ir até o centro de Porto Alegre, só para ir na banca da Alfândega. Essa sim, não apenas para comprar, mas era um ponto de encontro para se conversar sobre as noticias. Em uma época onde ainda não existiam Shopping Centers, a banca da Alfandega era o meu Shopping… Mesmo não comprando 5% do que queria (sempre queria as caríssimas revistas importadas) alguma era a escolhida para sair comigo debaixo do braço.

Então veio a internet e sua revolução na forma como a comunicação passou a ser feita, divulgada e distribuída. Sua agilidade impressionava para a época, não apenas pela velocidade que a informação chegava, mas também por abrir espaços generosos para as noticias locais. Nos anos 80 quando morei em São Paulo recordo minha alegria ao ver Gravataí sendo citada por duas vezes nos noticiários, mas infelizmente eram apenas por conta de tragédias, não era factível ter as noticias do dia a dia de cidades distante que não fossem a capital do estado.

A internet mudou tudo isto, mas também decretou uma agonizante morte das tão queridas bancas de revistas. Aos poucos o público deixou de aparecer exigindo que as bancas passassem por uma reformulação, uma diversificação de produtos e serviços. As revistas ganharam a companhia de refrigerantes, balas, recarga para celular, carimbos, apostilas para concursos e toda a sorte de produtos possíveis. 

Roberto Dias, 57 anos, manteve uma banca em Cachoeirinha por muitos anos mas acabou migrando para motorista de aplicativo:

– Não é apenas a internet, o shopping center tomou conta desde negócio, pois a pessoa vai para comprar qualquer coisa ou passear, e passa na banca que tem lá dentro – disse Roberto, que avaliou a possibilidade de migrar para o Shopping, mas o valor do aluguel alto, e as vendas em queda, o afastaram da ideia.

O comentário de Roberto parece encontrar reflexo mesmo para as maiores bancas, haja vista que mesmo a gigante Banca da Alfandega encerrou seus trabalhos, não sem antes passar por um período de triste ostracismo acentuada com a morte de seu proprietário Julio LaPorta no ano de 2013.

Ao longo da avenida Dorival de Oliveira ainda podemos encontrar verdadeiros bastiões de resistência que se recusam a encerrar as atividades. Na parada 67 a Banca LM, de propriedade das irmãs Zuleica e Solange mantém o ponto nos últimos 5 anos, e neste tempo identificaram uma queda enorme nas vendas de revista:

– Vendíamos 20 a 30 revistas Playboy e hoje nem existe mais a revista – lembrou dona Zuleica que disse não vender mais do que 2 ou 3 jornais por dia.

– A banca de revista vai terminar, eu pretendo me manter, mas colocando outros produtos, ainda tenho clientes fieis que reservam, eu mando whats avisando que chegou, mas para revista e jornal mesmo, em muito pouco tempo não vamos ter mais nada.

Mesmo no shopping o movimento de venda de jornais e revista não representam mais a maior parte do faturamento e a diversificação de produtos é tanta que as pessoas já não identificam mais a loja por esta designação, virou bazar, loja de variedades, tabacaria, qualquer coisa menos banca de revista.

– O que mais vende agora é o Diário Gaúcho, mas é mais por causa do brinde que as pessoas querem – disse Maria da Graça, proprietária da banca na parada 63.

– Ler mesmo, é muito pouca gente compra para ler.

A este que vos escreve em um sistema digital, pode parecer um contraponto sentir o fato da mídia offline estar com os dias contados, e não se trata tanto pelo apego sentimental ou "tátil" dos prazeres que a leitura sempre me proporcionou, mas sim do perigo de estarmos sendo substituídos, não pelos informativos imparciais que prezam pela verdade, mas em ver tanta gente elegendo as redes sociais como sua forma principal de receber informação, sem sequer questionar sua veracidade. 

Como já dizia o escritor inglês Charles Colton em sua obra La Can: "A má-informação é mais desesperadora que a não-informação".

 

Participe de nossos canais e assine nossa NewsLetter

Facebook
WhatsApp
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Conteúdo relacionado

Receba nossa News

Publicidade