3º NEURÔNIO

Busca por notoriedade na rede aponta a arma no Congresso

Recomendamos o artigo do jornalista Juan Arias, publicado em sua coluna no El País


Todos sabem que senadores e deputados em Congressos ao redor do mundo sempre agiram com os olhos postos na repercussão que podem ter na mídia. Aqui, no Brasil, o que parece interessar aos parlamentares, hoje, é o eco que suas intervenções podem ter nas redes sociais, que atingem milhões de pessoas. E para isso vale tudo, até a ameaça de uns deputados a outros, de arma em punho.

O novo Congresso, com apenas dois meses de existência, em que a extrema-direita tem maioria e cresceu a presença de deputados das polícias armadas, vive cenas que não só assustam o cidadão comum como colocam em causa julgamento da própria democracia.

O presidente do Congresso, o deputado bolsonarista Arthur Lira , chegou a condenar as atitudes bélicas de alguns dos seus colegas, qualificando o que está acontece de “deprimente”. E o que está acontece é que o Parlamento está virando um campo de batalha com repercussão até policial.

Um dos casos que mais repercutiu nacionalmente nos últimos dias foi o do deputado de direita Alberto Fraga, representante no Congresso do chamado “grupo da bala”, formado por ex-policiais , ex-militares e dois deputados que foram os mais votados do país: o progressista André Janone e o bolsonarista Nicolás Ferreira, ambos com milhões de seguidores nas redes sociais.

Há poucos dias, Fraga, em meio a uma discussão na importante Comissão de Constituição e Justiça, chegou a ameaçar o esquerdista Janone: “Não uso chupeta, uso revólver”. Janones sentiu-se ameaçado de morte e foi à polícia denunciar o colega. Por sua vez, o novo deputado, sargento Faur, ameaçou seriamente o ministro da Justiça de Lula, Flavio Dino: “Trabalhei 35 anos na Polícia Militar atirando na cabeça de morador de rua… Flavio Dino, seu merda, vem ver para minha arma aqui”.

A gravidade dessa mudança de atitude, carregada de conotações bélicas no Congresso, é a busca por maior projeção nas redes sociais, que deu a vitória a Bolsonaro em 2018. O diálogo e a reflexão entre os legítimos representantes da sociedade, sancionados nas urnas, estão sendo substituídos pela agressividade utilizada nas redes em busca de projeção social. E isso contamina tanto à direita quanto à esquerda. Por enquanto, a esquerda se encontra em posição inferior perante a direita, que faz das redes seu reino e seu trampolim para se promover, algo que falta ao novo governo progressista de Lula .

A esquerda descobriu ultimamente a força até subversiva das redes sociais e Lula ainda se vangloria de não ter celular ou de usá-lo minimamente. Um bom ou um mau exemplo? O problema é que o líder golpista Bolsonaro voltou de seu exílio voluntário de três meses nos Estados Unidos depois de ter perdido, ainda que por pouco, as eleições presidenciais. E seus capangas sabem usar a força das redes como ninguém. E continuarão a fazê-lo, o que significará um difícil desafio para o governo que não pode se dar ao luxo de emular seu inimigo político no uso criminoso dos novos meios de comunicação, onde se mostram os mais experientes.

O governo Lula está tentando intervir em um debate tão complexo que atinge o mundo inteiro sobre a delicada questão da informação contra o descontrole das redes sociais. Para isso, ele pensa em criar algum instrumento capaz de lidar com as fake news . O problema é que essa iniciativa está sendo vista como censura. Um governo pode legislar sobre o conteúdo das redes? É o que se perguntam, alarmados, aqueles que temem que Lula ceda aos velhos desejos da ala mais radical de seu partido, o PT, que em seus governos anteriores tentou, ainda que em vão, controlar jornais e televisões.

Isso até chegar o primeiro mandato de Dilma Rousseff , que em seu discurso de posse lançou a famosa frase: “Prefiro o barulho dos jornais ao silêncio das ditaduras”. Dilma havia sido presa e torturada pelos militares. Acabaram por retirá-la da presidência em seu segundo mandato.

E agora que Lula voltou ao poder, ele enfrenta um dos momentos mais difíceis e delicados de informação, controlada por mecanismos democráticos, nos quais as pessoas podem confiar sem ter que se perguntar a todo momento: é verdade ou mentira?

O maior desafio é como lidar com os novos meios de comunicação que, ao contrário dos tradicionais, circulam livremente, sem controle e sem verificação do seu conteúdo. E, a cada dia, com a nova invenção de meios impulsionados pela inteligência artificial, fica mais sério e difícil distinguir o trigo do joio.

Há alguns dias, um amigo se divertiu pedindo meu currículo a uma rede de inteligência artificial. Fiquei frio: a rede acertou a maioria das informações, embora em relação aos meus livros publicados, às vezes trocasse os títulos. E o que mais me surpreendeu foi que a rede ainda fez uma reflexão pessoal ao enfatizar que “era admirável que um jornalista com tantos anos de profissão esteja morando em uma pequena cidade do interior do Estado do Rio de Janeiro”.

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