A interminável crise na Sogal segue rendendo novos capítulos: hoje, demitidos, pensionistas e funcionários da ativa estão na expectativa; impasse pode evoluir para nova paralisação
Mãe de gêmeas e moradora do bairro Fátima, ex-companheira de um funcionário que está prestes a completar 20 anos na Sogal, a mulher com quem conversei esta semana tem vivido um 2021 desafiador – em muitos sentidos. O blog decidiu preservar sua identidade, o que sequer foi uma exigência da ex-atentende que contou como tem sido a rotina de incertezas a cada final de mês em que não sabe se e quando vai receber a pensão que o pai de suas filhas desconta do salário. "Já cheguei a ficar dois meses sem receber", revela.
"Teve problemas antes da pandemia, mas agora virou rotina", resume. "E os piores meses foram entre setembro e novembro do ano passado".
Ontem, 30, sem aviso, um valor foi creditado em sua conta bancária. Com atrasos e parcelamentos, depósitos menores do que o de costume, às vezes – ela não sabe se tudo o que deveria ter recebido para ajudar na criação das filhas foi quitado de fato. "Sei que não é culpa do meu ex-marido. Ele tem ajudado como pode. Mas a empresa desconta dele e não está repassando para as famílias".
Antes que as coisas piorassem – ela também perdeu o emprego de atendente em um consultório médico em Porto Alegre ano passado, com o agravamento da pandemia -, a mãe resolveu ser motorista de aplicativo. "A gente precisa se virar", lembra. "É daí que tenho tirado meu sustento e o das gurias".
Panelaço à vista
O drama vivido pela mãe e relatado aqui no blog não é único. O número oficial não é divulgado, mas estima-se que pelo menos 300 famílias com os pais divorciados dependam de alguma maneira da pensão que é descontada nos contra-cheques de funcionários da Sogal. "A gente ajuda como pode, o sindicato pede explicação, mas está bem complicado. Algumas pensionistas já falam em fazer um panelaço em frente à empresa", conta o presidente do Sindicato dos Rodoviários, Marcelo Nunes. "A gente espera que ainda hoje saia algum coelho dessa cartola".
Além do atraso no pagamento de pensões, o sindicato relata o não cumprimento do prazo dos acordos com os demitidos, que deveria ser quitado no último dia do mês de fevereiro e já está com a segunda parcela por vencer, hoje. "Os da ativa estão com parte do mês e da quinzena em atraso também", avisa Marcelo. Ele diz que o plano de saúde e o rancho também estão pendentes.
"A categoria é um barril de pólvora que está prestes a explodir. A única explicação que a gente recebe é que a empresa não tem dinheiro", afirma o presidente do sindicato. "Hoje chegamos a mais um final de mês, a Páscoa é domingo e o trabalhador não tem a dignidade de receber o seu salário".
No dia 30, o departamento jurídico e a direção do Sindicato dos Rodoviários voltaram à Justiça Federal e conseguiram o desbloqueio de um recurso obtido com a venda de um terreno da Sogal no Centro de Canoas. Os valores, no entanto, estão vinculados ao acordo com os funcionários que participaram do acordo de demissão ao longo de 2020. Não há previsão de quando essa dúvida será quitada, mas pode acontecer entre hoje e segunda-feira, dia 5 de abril.
A Sogal segue sem se manifestar sobre a crise que atravessa. Informalmente, o blog apurou que quase a totalidade dos recursos que entram na roleta dos ônibus que ainda circulam pela cidade vem sendo destinada ao pagamento das faturas de diesel e insumos do transporte
O mais recente acordo com a Prefeitura, que prevê o acompanhamento da gestão por uma Junta Governativa, também previu a compra antecipada de passagens. Os valores, no entanto, tem destino certo: a quitação de obrigações vencidas com os funcionários. Desde o início do ano, a Prefeitura já fez duas compras de passagens em valores de aproximadamente R$ 2 milhões.