Associo-me ao jornalista Reinaldo Azevedo no artigo Casa Branca não exclui nem ação militar contra o país; canalha daqui apoia, publicado pelo UOL. Sigamos no texto:
A aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes, a ordem executiva assinada por Donald Trump e a nota emitida pela Casa Branca justificando a tarifa de 50% imposta ao Brasil constituem o mais grave atentado da história à soberania do país, ainda que, no caso das taxações, a montanha tenha dado à luz um rato.
Excluam-se da consideração as motivações e interações belicosas durante a Guerra do Paraguai porque nunca se tratou, naquele caso, de tentar tirar dos Poderes Constituídos no Brasil a regência do Estado nacional. Agora sim. É claro que a motivação essencial de Trump tem natureza econômica e visa à subordinação de uma das grandes economias do mundo aos interesses dos EUA –– ao menos da forma como ele os entende. Mas é inegável que age com o apoio explícito de forças políticas do país agredido. Se Jair Bolsonaro, Eduardo e seus aliados querem os louros e as palmas pela eficácia de sua ação contra o país, que o tenham, pois. Há, com efeito, em solo pátrio — ou nativos daqui, mas atuando na “metrópole” — os que se oferecem para ser executores de “diktats” emitidos por um país estrangeiro. E, no caso, nenhum detalhe pode escapar: com o apoio do ex-presidente brasileiro e de seus sequazes, Trump não descarta nada, inclusive um ataque propriamente militar, ainda que não seja explícito.
Será que exagero? Prestem atenção a este trecho da nota emitida pelo governo norte-americano:
“COLOCANDO A AMÉRICA EM PRIMEIRO LUGAR: Ao impor essas tarifas para lidar com as ações imprudentes do Governo do Brasil, o Presidente Trump está protegendo a segurança nacional, a política externa e a economia dos Estados Unidos de uma ameaça estrangeira. Em consonância com seu mandato eleitoral, o Presidente Trump também tomou outras medidas para alcançar a paz por meio da força e garantir que a política externa reflita os valores, a soberania e a segurança dos EUA.”
Assim, tem-se por inequívoco que Trump vê os EUA como um país agredido pelo Brasil. Estaria, assim, operando uma manobra defensiva, de autoproteção. E aí vem a ameaça: “alcançar a paz por meio da força”. Ora, trata-se de um fundamento de sentido aberto: como Trump se coloca no papel de regular e definir o que é a agressão — e a independência do Poder Judiciário e a punição aos golpistas são lidas por lá, de forma malandra, como práticas contrárias aos interesses americanos —, o simples exercício da soberania por aqui pode ser lido, então, como agressão continuada, o que implicaria a elevação do “uso da força para atingir a paz”. Qual é o ponto extremo de tal primado?
O comunicado da Casa Branca, fica evidente, não tem a menor noção de como funcionam as instituições no Brasil –– a rigor, Trump ignora os limites do Poder Executivo em seu próprio país. Lê-se, por exemplo:
“Recentemente, membros do Governo Brasileiro tomaram medidas sem precedentes para coagir, de forma tirânica e arbitrária, empresas americanas a censurar discursos políticos, remover usuários da plataforma, entregar dados sensíveis de usuários americanos ou alterar suas políticas de moderação de conteúdo, sob pena de multas extraordinárias, processos criminais, congelamento de ativos ou exclusão completa do mercado brasileiro. Isso prejudica não apenas a viabilidade das operações comerciais de empresas americanas no Brasil, mas também a política dos Estados Unidos de promover eleições livres e justas e de salvaguardar os direitos humanos fundamentais no país e no exterior.”
Não há uma única verdade no que vai acima, até porque o governo não tomou nenhuma medida contra as “big techs”. As restrições pontuais estão no âmbito de decisões judiciais, tomadas segundo as leis democráticas vigentes no Brasil. Na ordem executiva, Trump faz mira em Moraes, carregando nas tintas de seu suposto ataque a tais empresas, o que evidencia que elas constituem um dos pilares desse ataque.
A Ordem Executiva lista os produtos brasileiros que estariam livres da tarifa de 50%. As principais exportações do agro e aviões, por exemplo, estão fora da lista. Do que se previa, é provável que cerca de 60% dos itens que o Brasil exporta sejam preservados, de sorte que a punição econômica pode ser menos danosa do que se previa. Ainda assim, é claro que haverá estragos e que o país precisa se estruturar para enfrentar esse ataque à sua economia.
Isso não diminui o peso da ameaça feita, que não descarta, é preciso atentar para o sentido das palavras, nem mesmo uma intervenção bélica. É o modo Trump de fazer as coisas, contando com o apoio de uma canalha local.
Se alguém tinha dúvida de que se tratava de um ataque à nossa soberania, eis aí.